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CULTURA

Adeus à força da natureza

Jornal da Paraíba relembra a última conversa com o artista Hermano José, morto na última quinta-feira, aos 92 anos.

Publicado em 23/05/2015 às 6:00 | Atualizado em 09/02/2024 às 16:45

“Eu não penso em ser lembrado”, afirmou, aos sorrisos, o artista paraibano Hermano José, há 3 anos, quando recebeu o JORNAL DA PARAÍBA em sua casa, em João Pessoa.

Na última quinta-feira, ainda na ativa no alto dos seus 92 anos, explorando uma fase abstrata depois de passar por várias técnicas e expressões, um dos maiores nomes da arte morreu. Ontem, seu corpo foi cremado em Cabedelo.

Quando lhe foi perguntado sobre uma definição de quem era Hermano José, ele não soube responder, justificando que compreendia a vida como um enorme mistério. “E quem é que vai definir?”, disse prontamente, na sacada onde se ouvia a sinfonia das ondas marítimas do Bessa, fazendo coro com a revoada de bem-te-vis nas árvores de seu jardim.

Ele nasceu no dia 15 de julho de 1922, ano em que a Arte Moderna se consolidava no Brasil. Muitos pensam que foi em Caiçara, no Agreste paraibano, local onde o garoto cresceu sob a influencia de duas forças descomunais da natureza: a Pedra do Pão de Açúcar e o Rio Curimataú – uma imóvel e a outra em constante movimento. Mas Hermano viu a luz pela primeira vez no Engenho Baixa Verde, bem perto de Caiçara, em Serraria.

Militante ecológico, Hermano sempre foi preocupado com as questões ambientais, dando igualdade também na luta de evidências às artes visuais. Achava o ecologista polonês radicado no Brasil Frans Krajcberg um falso, alfinetava a construção da Estação Cabo Branco pelo arquiteto que “encheu Brasília de concreto armado”, Oscar Niemeyer, além de criticar as “florestas de pedras” dos edifícios ‘espigões’ e a poluição sonora dos “acadêmicos da mediocridade”.

Sua maior ‘modelo viva’ foi a Barreira do Cabo Branco. Não se lembrava de quantas vezes retratou a paisagem que vem se perdendo com o tempo e o descaso dos órgãos responsáveis pela sua preservação. “A natureza sempre foi meu assunto mais forte”, justificava.

O pesquisador e curador Dyógenes Chaves, que realizou a maior retrospectiva do artista, em 2013, com 70 obras, reforça a posição de Hermano como paisagista, mas relembra que sua maior importância para as artes foram as gravuras em metal nos anos 1960, onde ele rompeu com os conceitos de que a gravura era sempre ligada à ilustração de texto.

“A gravura era como a fotografia no jornal”, compara Chaves. “Quando estava no Rio de Janeiro, ele estava no meio de uma turma de renomes internacionais. A gravura conquistou a autonomia de ser uma obra de arte”.

Apesar do paraibano ter confidenciado três anos atrás que não se arrependia de nada nessas nove décadas de estrada, Dyógenes Chaves pondera que ele tenha morrido frustrado – não com a arte, mas pelo ser humano.

“Eu digo sempre: não peguei a barca de Noé, que veio pra salvar tudo. Peguei a barca do naufrágio, onde não se salva ninguém”, chegou a afirmar Hermano José.

SENTIR E VIVER
Além de ensinar e divulgar artistas paraibanos, Hermano José era muito preocupado com a obra na posição de ser apreciada pelo povo.

Tanto que recentemente, ele assinou post-mortem a doação de todo o seu acervo artístico e sua casa como um memorial à Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
“Isso se arrasta por muito tempo, desde que me lembro como gente”, comenta Dyógenes, frisando que ele tentou, nos anos 1970, montar o Museu de Arte da Paraíba. Como não conseguiu, criou a Pinacoteca da UFPB, quando foi assessor cultural do governador Ivan Bichara. “Muitas obras estavam espalhadas pelos gabinetes da universidade e ele as reuniu”.

Chaves ainda recorda que Hermano foi o primeiro paraibano a participar, como artista, de uma bienal, nos anos 1960, e que já era agitador cultural nos anos 1940, quando fundou o Centro de Artes Plásticas da Paraíba (CAP), junto com José Lira e companhia.

“A arte é o resultado das emoções que você viveu. A gente faz o que pode e espera fazer isso com sinceridade, sem ser genial”, chegou a desabafar Hermano José. “Esses trabalhos são o que senti e vivi”.

"FILHOS ARTÍSTICOS" DE HERMANO JOSÉ
“Hermano José abriu portas para muitos artistas. Flávio Tavares, João Câmara e Miguel dos Santos são filhos dele”, comenta Dyógenes Chaves.

A afirmação remete à época em que o artista plástico trabalhava no Rio de Janeiro. Em sua permanência em terras cariocas, Hermano José se empenhou para disseminar as obras paraibanas pelas grandes galerias da cidade. “Ele era uma espécie de embaixador da nossa arte”, diz Flávio Tavares, ao lembrar de sua passagem pela “embaixada paraibana”, nome que davam para a residência de Hermano.

Tavares recebeu orientação de Hermano José desde os seus primeiros traços. “Ele era muito amigo do meu pai. Eu lembro que quando ele voltava do Rio de Janeiro, passava lá em casa e eu mostrava os meus desenhos pra ele. Sempre foi um mentor”.

No alto de sua sapiência, não era apenas nas artes plásticas que ele atuava. “Hermano foi um defensor teimoso e aguerrido do patrimônio cultural e ecológico”, afirma um de seus pupilos, João Câmara Filho, que o descreve como “sensível e leal”.

O ceramista Miguel dos Santos define Hermano José como um “revolucionário na arte da gravura”: “Ele tinha a mesma importância que Burle Marx e Portinari”, afirma o pernambucano radicado no Estado.

Do mestre, ele recebeu orientação de desenho e de técnicas de pintura. Com uma biblioteca “espetacular” em casa, Santos conta que todos corriam para lá quando precisavam fazer consultas em livros.

Fred Svedsen teve o seu primeiro contato com o artista nas aulas de gravura e metal do curso de Educação Artística da UFPB, ministradas por Hermano José.

Sobre a influência do mestre em seu trabalho, Svedsen afirma que “ele foi um norte para os artistas da minha geração”. (Mariana Fernandes)

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Jornal da Paraíba

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