Viva o choro! Viva São Pixinguinha!

O quintal de uma casa simples. A cadeira de balanço. Pixinguinha e seu sax. É uma das mais belas imagens da música popular do Brasil. A foto é de 1967. O autor é Walter Firmo, grande fotógrafo brasileiro. Pixinguinha morreu em 1973. Firmo está vivo. Tem 86 anos.

Alfredo da Rocha Vianna Filho. Pixinguinha. São Pixinguinha. O homem e seu instrumento, a cadeira de balanço e a placidez daquele quintal – foi a imagem que me ocorreu quando li que o choro – ou chorinho – foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil.

Quem declarou, nesta quinta-feira, 29 de fevereiro do ano bissexto de 2024, foi o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan. Lembrei de Pixinguinha porque ele é um dos maiores representantes desse gênero musical urbano nascido no Rio de Janeiro ainda no século XIX.

Sabem Louis Armstrong, sua corneta e os Hot Five na juventude do jazz? É como Pixinguinha, sua flauta e os Oito Batutas na juventude do choro. São manifestações extraordinárias da música popular do mundo. Uma na América. Outra no Brasil.

Pixinguinha, a flauta e os Oito Batutas. Mais tarde, o sax de Pixinguinha e a flauta de Banedito Lacerda. Pixinguinha, o compositor, o instrumentista, o arranjador. Pixinguinha, um gigante. Ou um santo de carne e osso. Um pioneiro, um criador, o homem que compôs Carinhoso e Rosa.

Carinhoso não é um choro, até foi acusada de ser jazzística demais, e Rosa é uma valsa. Mas são muitos os choros de Pixinguinha, assim como Pixinguinha pode ser tomado como símbolo do choro nascido nos subúrbios do Rio de Janeiro, criado pelo povo modesto do Rio de Janeiro.

O remoto Ernesto Nazareth. Nazareth, um pianeiro. Patápio Silva e sua flauta. Chiquinha Gonzaga, Tia Amélia e seus pianos. Mais para cá, bem mais para cá: Severino Araújo e seus choros para big band, o clarinete de Abel Ferreira, o cavaquinho de Waldir Azevedo, a flauta de Altamiro Carrilho.

E, claro, o bandolim de Jacob. Jacob do Bandolim e seu Época de Ouro, com a inacreditável “baixaria” do violão de 7 cordas de Dino. Quer ouvir o choro tal como ele é? Ouça Vibrações, álbum que Jacob gravou no fim da sua vida curta. Feche os olhos e se imagine num quintal de um Rio de Janeiro que não há mais.

Na década de 1970, Raphael Rabello, outro “monstro” do violão de 7 cordas, mostrou, à frente do grupo Os Carioquinhas, que o choro estava vivo e que havia gente jovem no choro. Enquanto o grupo A Cor do Som, com guitarras e teclados eletrônicos, modernizou o gênero ao gravar Espírito Infantil.

Choro é sempre moderno, é permanente, é livre, é irresistível. É música que, tal como o jazz dos pretos americanos, permite o improviso. E não morre nunca. Já era tempo de reconhecê-lo Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. É justo. É justíssimo.