Artigo: O combustível para economia

Advogado comenta decisão do presidente de zerar tributos sobre o diesel.

Foto: Reinaldo Canato/Agência Brasil

A notícia foi veiculada pelo próprio Presidente da República em sua live semanal. E as manchetes na manhã do dia 19/02/2021 se resumiam: “JB ZERA POR DOIS MESES TRIBUTOS FEDERAIS SOBRE O DIESEL”. Somado a isso, dois dias antes, o Planalto enviou ao Congresso projeto de lei complementar que propõe mudanças no cálculo do ICMS sobre os combustíveis com a intenção de estabelecer uma alíquota única e uniforme para os Estados.

O assunto foi o combustível que faltava para mais uma discussão entre “esquerdistas” e “direitistas” nas redes sociais e, especificamente, em uma pequena sala de bate-papo entre amigos no Whatsapp: “CREDENCIADOS BR”.

O grupo se destaca pela polarização nas discussões entre Iudi e Loreno, sempre com comentários sarcásticos dos outros participantes para inflamar ainda mais a discussão. O que mais parece uma briga entre ferozes partidários, trata-se de uma aula de política e sabedoria popular. 

Loreno, sempre aguerrido, e um bolsonarista declarado, posta print do Twitter do Deputado Eduardo Bolsonaro sobre a live do Presidente e, em seguida, publica um gif numa motoca com os dizeres “VAZEI”. 

A provocação é cirúrgica e, em minutos, Iudi entra: “Coisa feia. Dilma ri. Mercado ficando disfuncional… alguém irá pagar a conta.”

– Nada agrada a esquerda, disse Loreno.

– Agradar? Baixar o diesel de forma populista não é agradar. 

– Não perca o sono não Iudi, tudo dará certo. 

Caiu a madrugada e o grupo amanheceu com o seguinte comentário de um dos seus moderadores: 

“E só pra incitar a discussão: quando houve a redução lá no Governo de Lula, linha branca e construção civil, por exemplo, foi uma política fiscal/econômica para o Brasil não entrar na crise mundial. Qual foi o erro? Manter a política devido ao populismo. O PT acertou quando fez, mas errou ao continuar. Receita e despesa aqui no Brasil andam no limite. É ilusão achar que uma reforma tributária, por exemplo, vai reduzir a carga.”

No mesmo minuto, ao morder a isca, Loreno, com os seus dedinhos nervosos, disse: 

– Rapaz, concordo em partes, essa foi uma medida emergencial para segurar o preço do diesel que iria subir novamente e com uma pancada maior. Medida emergencial pode ser tomada sim, desde que se cumpra com o pretendido. O Governo tem dois meses para conseguir uma solução definitiva.

Iudi, com uma pitada de sarcasmo, alfineta: “O único plano do JB é não ter plano algum.”

Loreno segura a emoção e justifica: 

– O Presidente vai baixar o auxílio, vai tentar intervir com redução de impostos, diferente do PT que interviu segurando preço e abrindo um buraco na Petrobras. Lembrando que não concordo e nem acredito que para o Governo seja bom apenas cortar. Vai ter que compensar de alguma forma, mas isso é algo que vamos conhecer daqui a dois meses.

Iudi, mais uma vez provoca: 

– Viva o Mito. O homem que manipula a economia em uma canetada. E em seguida, justifica: – A medida é populista e direcionada aos caminhoneiros, o preço do combustível tem margem apertada porque é conduzido pelo mercado internacional. O Brasil não tem espaço para uma redução de carga sem planejamento. Medidas emergenciais devem ser tomadas, mas precisam ser pensadas. Talvez quem pague a conta sejamos todos nós, consumidores, que já estamos gastando uma fortuna com alimentação. 

– Ele faz um discurso até bonito às vezes, disse Loreno. E continuou: – Cuidem em articular direito, senão irão passar mais 4 anos chorando.

– Até hoje não teve um único Presidente do Brasil que perdeu uma reeleição, fechou Iudi.

A discussão entre Iudi e Loreno retrata a polarização que existe hoje no país e que nenhuma solução será fácil. Entretanto, uma coisa é certa, a falta de planejamento e de uma política fiscal verdadeira trará consequências inimagináveis para o Brasil. 

A eleição da mesa da Câmara e do Senado deu um fôlego ao Governo que deve ser aproveitado para discutir a reforma tributária e apresentar projetos emergenciais que sejam sustentáveis. Como disse o moderador da conversa, de certa forma, o PT acertou no primeiro momento quando utilizou a tributação como indutora da economia, mas se perdeu quando o populismo saltou aos olhos. O que não pode é o atual Governo esquecer os erros do passado. Se o PT não é exemplo e as medidas populistas só frearam o crescimento do Brasil, o recado que fica é para que o atual Governo não cometa os mesmos erros, por mais que estejamos em um momento pandêmico. 

Espera-se que os dois meses sem tributos federais sobre o diesel sejam suficientes para uma solução. Mas uma solução definitiva seria, no mínimo, voltarmos a discussão sobre a reforma tributária no Congresso Nacional. 

*Felipe Crisanto é mestre em Direito Econômico, advogado tributarista e membro Diretor do Instituto de Pesquisas Fiscais – IPF.