Qual a Boa?
4 de outubro de 2021
10:04

Astrofotografia: conheça segredos e dicas de como tirar fotos do céu noturno

Cidade de Matureia vai sediar o Encontro Paraibano do Astrofotografia em outubro.

Matéria por Krys Carneiro

Fotografar o céu noturno é uma atividade que muitos amam fazer, mas nem todos conseguem executar bem. Nesta Semana Mundial do Espaço, para ajudar aos que querem ingressar de cabeça no mundo da astrofotografia, o astrônomo amador Marcelo Zurita revelou segredos e dicas de como aproveitar a escuridão da noite para tirar fotos de corpos celestes.

Zurita também é um dos idealizadores do Encontro Paraibano de Astrofotografia (EPA!), que vai ser retomado este ano com programação de 8 a 10 de outubro na cidade de Matureia, no Sertão do estado. Veja mais informações sobre o encontro no fim da reportagem.

A Semana Mundial do Espaço é um período instituído pelas Nações Unidas, anualmente, no período de 4 a 10 de outubro, para celebrar as contribuições da ciência e tecnologia espacial no avanço das condições humanas.

Localização: fuja dos centros urbanos

Um estudo publicado em 2016 na revista Science chegou à estimativa de que um terço da população mundial não consegue ver a Via Láctea a olho nu por causa da poluição luminosa das áreas urbanas. Por isso, uma das principais dicas para conseguir observar e fotografar o céu noturno com detalhes é fugir dos centros urbanos.

 Via Láctea fotografada em Matureia; segredo para visualizar a galáxia é fugir dos centros urbanos. Foto: Diego Alencar 

“A chamada ‘poluição luminosa’ ofusca as luzes das estrelas. Quanto mais afastado das grandes cidades, mais escuro é o céu, e quanto mais escuro é o céu, mais as estrelas e os objetos astronômicos mais tênues se destacam”, explica Zurita.

O Encontro Paraibano de Astrofotografia, por exemplo, é realizado na zona rural de Matureia, onde a distância para as grandes cidades e o Parque Estadual do Pico do Jabre garantem um dos céus mais escuros da Paraíba. Porém, outras cidades também são mencionadas por Zurita como ótimos locais para capturar as belezas do céu noturno: Taperoá, Cabaceiras, Olho D’Água, Desterro, Mãe D’Água, Picuí, Pedra Lavrada, Araruna (Parque Estadual da Pedra da Boca) e Ingá.

 Foto da Via Láctea feita no Encontro Paraibano de Astrofotografia. Foto: Marcelo Zurita 

Nuvens e Lua podem atrapalhar as fotos

Além de escolher bem o local onde se vai praticar a astrofotografia, também é necessário ficar atento ao tempo na região. A cobertura de nuvens atrapalha a observação e pode impossibilitar a captação das fotos. Zurita recomenta escolher épocas do ano quando a umidade é menor e a cobertura de nuvens é baixa. No caso do Sertão da Paraíba, esse período seria entre setembro e novembro.

 Foto do céu noturno feita em Matureia; noites de Lua nova são melhores para captar estrelas e galáxias. Foto: Elton Dantas 

Outro fator que deve sempre ser observado é a fase da Lua. Se o satélite natural da Terra não for o corpo celeste que você quer fotografar, escolha noites próximas à Lua nova, quando o céu é ainda mais escuro.

Celular ou câmera profissional?

As câmeras fotográficas profissionais – aquelas que têm lentes intercambiáveis – são, sem dúvidas, as melhores opções para quem quer fotografar o céu noturno. Porém, dá pra começar na astrofotografia usando um celular sem grandes prejuízos.

 Foto do céu noturno feita de um celular Redmi Note 8 em Teixeira, PB. Foto: Ary Nóbrega 

Segundo Zurita, atualmente existem alguns celulares que oferecem um modo de fotografia noturna bastante avançado, permitindo o registro de paisagens estreladas e da Via Láctea. “Devido às limitações físicas, os resultados não são tão bons quanto às astrofotografias feitas com câmeras profissionais, mas ainda assim são muito bons, e é uma excelente forma de se iniciar na astrofotografia”, explica.

Para quem tem acesso a câmeras profissionais, a astrofotografia pode ser praticada com vários tipos de lente, das grandes angulares às teleobjetivas e, até mesmo acoplando a câmera a um telescópio. Tudo depende do tipo de objeto que se pretende fotografar.

 Foto da Lua feita com uma câmera profissional e uma lente teleobjetiva de 800mm; as cores foram destacadas para mostrar as diferentes composições do solo lunar. Foto: Marcelo Zurita 

“Uma grande angular é mais adequada para se fotografar paisagens noturnas com céu estrelado. Para nebulosas e aglomerados estelares, as teleobjetivas são mais recomendadas”, explica.

Outro ponto a ser considerado é que, como os principais alvos da astrofotografia são normalmente muito escuros, recomenda-se a utilização de lentes claras, que permitem uma maior captação da luz em situações de baixa luminosidade.

Equipamentos: do tripé ao telescópio

O mais básico e essencial equipamento que o astrofotógrafo precisa é o tripé. É ele que vai dar firmeza ao celular ou câmera fotográfica na hora de tirar fotos com longa exposição e evitar que a imagem saia tremida.

 Tripé é um equipamento essencial para fazer fotos do céu noturno. Foto: Marcelo Zurita 

Os binóculos podem ser úteis para encontrar os objetos astronômicos que se deseja fotografar. Essa procura também pode ser auxiliada por aplicativos de celular, como Stellarium, Google Sky e SkyEye, que mostram a localização dos planetas e estrelas no céu.

Pequenas lunetas podem ser utilizadas para quem quer começar na astrofotografia de corpos celestes maiores, como a Lua. Com o auxílio de adaptadores, é possível registrar a imagem utilizando um celular. A mesma adaptação pode ser usada para fotografar com telescópios.

O telescópio também pode ser usado para ajudar na fotografia de objetos muito distantes, como galáxias, que ocupam uma pequena área do céu. Esse tipo de astrofotografia que retrata nebulosas e galáxias distantes são chamadas “astrofotografias de céu profundo”.

Mas nesse caso, como são pequenos e muito tênues, também seria necessário um equipamento adicional, chamado de “montagem equatorial motorizada”, que permite acompanhar o movimento aparente dos astros e realizar fotos de longa exposição sem que o objeto se mova no campo de visão.

 Foto da Nebulosa de Órion, uma das mais luminosas nebulosas visíveis da Terra; em locais escuros, é possível vê-la a olho nu. Foto: Evandro Torquarto 

“O ‘movimento aparente dos astros’ é o efeito provocado pela rotação da Terra. Por conta dela, percebemos os astros sempre nascendo a leste e se pondo a oeste. Com uma montagem equatorial motorizada, conseguimos acompanhar os astros por vários minutos”, ensina Zurita.

Para quem não tem o sistema de acompanhamento, existe uma fórmula para calcular o tempo máximo de exposição para que as estrelas permaneçam pontuais e não apareçam como um risco. “A fórmula é básica é 400/F, onde F é a distância focal da lente. Ou seja, para uma lente de 50mm, a exposição máxima para não gerar arrasto é de 8 segundos”, diz.

No entanto, para fotografar galáxias, por exemplo, esse cálculo se torna inviável. Como as distâncias focais para se fotografar uma galáxia é muito grande, o tempo máximo de exposição ficaria muito curto, tanto que a câmera não conseguiria fazer.

Lua, estrelas ou planetas: as diferenças entre os corpos celestes

Para se fotografar a Lua e planetas do sistema solar, segundo Zurita, o aumento é o fator mais importante. Por isso existem muitas fotos interessantes da Lua feitas com câmeras superzoom, ou de Júpiter e de Saturno, feitas com webcams acopladas em telescópios.

 Imagem produzida a partir de um pequeno vídeo da conjunção entre Saturno e Júpiter em 2020. Foto: Marcelo Zurita 

Para astrofotografias de estrelas, nebulosas e galáxias, as câmeras profissionais são mais adequadas. A captação e processamento das imagens também é diferente. Enquanto esse tipo de astrofotografia geralmente é feita processando uma sequência de fotos do mesmo objeto, a astrofotografia de Lua e planetas é feita processando vídeos curtos desses objetos.

Processamento: o segredo para imagens de alta qualidade

O processamento é uma técnica fundamental em astrofotografia, conforme defende Zurita. O fotógrafo precisa fazer várias fotos e depois colocá-las em um software que junte todas em uma única imagem. O resultado é a alta qualidade da imagem, com contrastes destacados e cores evidenciadas.

 Foto da galáxia de Andrômeda com exposição de 30 segundos. Foto: Marcelo Zurita 
 Imagem resultado do empilhamento de mais de 300 fotos feitas com exposição de 30 segundos da galáxia Andrômeda; no final, ela foi rotacionada e recortada também. Foto: Marcelo Zurita 

“Geralmente para se fotografar uma nebulosa ou uma galáxia, fazemos uma sequência de centenas de fotos do mesmo objeto. Depois com a ajuda de softwares especializados, ‘empilhamos’ essas fotos e conseguimos uma imagem de alta qualidade. Empilhar 100 fotos de 30 segundos é praticamente como fazer uma única foto de 3.000 segundos de exposição”, esclarece.

Para fazer centenas de cliques do mesmo objeto sem mudar a posição da câmera, é essencial o uso de um tripé. Para não tremer na hora de apertar o botão, Zurita explica que muitos astrofotógrafos apelam para a tecnologia:

“Algumas câmeras têm a função [de programar vários disparos] de fábrica, outras podemos instalar funções adicionais. Mas também temos como conectar disparadores externos e controlar as câmeras por computador”, conta.

 Resultado do processamento de 250 fotos com exposição de 30 segundos; cada ponto luminoso da imagem é uma estrela. Foto: Marcelo Zurita 

Para quem não tem nenhum desses recursos, Zurita recomenda utilizar o temporizador de 2 segundos do celular ou câmera. “O clique provoca um leve tremor na câmera que em longas exposições pode borrar a imagem”.

Técnicas para compor a foto

Algumas técnicas usadas por astrofotógrafos para que as imagens registrem objetos além do céu. Uma delas é uma técnica de fotografia noturna, em que o fotógrafo compõe a foto com uma paisagem.

 Compor a foto do céu com uma paisagem é uma das formas de astrofotografia. Foto: Allysson Macário 

“A gente vai tentar procurar um local escuro o suficiente pra conseguir fazer uma fotografia noturna com exposição e sensibilidade suficiente pra mostrar também o céu estrelado. A principal dica é um local afastado das luzes dos grandes centros, onde a gente possa fotografar o céu em composição com a paisagem”, diz Zurita.

Ele explica que o local precisa estar tão escuro que seja possível fazer uma exposição de 30 segundos e ainda assim o céu ficar escuro sem estourar a luz. É possível mostrar apenas a silhueta do objeto em primeiro plano, mas, para conseguir mostrar com mais detalhes algo da paisagem, pode-se usar do light painting, ou seja, usar uma luz artificial por algo em torno de meio segundo para iluminar a área que se deseja destacar. Essa luz pode ser uma lanterna, celular ou até o farol do carro.

 Iluminar o objeto que vai ficar em primeiro plano por meio segundo é suficiente para manter os detalhes dos astros no céu. Foto: Valdith Lopes 

Outra categoria específica de astrofotografia é a trilha das estrelas. Fotos assim são feitas com tempo de exposição muito alto ou com o empilhamento de fotos tiradas em um tripé convencional, sem acompanhamento motorizado, captando o arrasto da luz dos astros.

 Trilha das estrelas é feita com tempo de exposição muito alto ou com o empilhamento de fotos tiradas em um tripé convencional, sem acompanhamento motorizado. Foto: Marcelo Zurita 

Encontro Paraibano de Astrofotografia: novos protocolos

Zurita também recomenda aos astrofotógrafos iniciantes que busquem apoio em grupos de praticantes. “A participação em encontros como o EPA! [Encontro Paraibano de Astrofotografia] podem encurtar bastante a curva de aprendizado. Conhecer e praticar as técnicas de astrofotografia é, muitas vezes, mais importante que sair comprando equipamentos de cara”, explica.

 Participantes do Encontro Paraibano de Astrofotografia em edição anterior à pandemia. Foto: Marcelo Zurita 

O evento começou em 2013, com uma parceria entre a Associação Paraibana de Astronomia e o Casarão do Jabre, em Matureia. O encontro não foi realizado em 2020 por causa da pandemia da Covid-19, mas retorna em 2021 com uma série de protocolos para garantir a segurança dos participantes e dos moradores da cidade.

As pessoas que desejem participar precisam estar com a vacinação em dia, tendo tomado pelo menos a primeira dose de imunizante contra a Covid-19. Além disso, este ano não vai haver oferta de ônibus para fazer o transporte para Matureia e também não vão ser disponibilizadas vagas de alojamento, apenas quartos duplos, triplos, quádruplos e camping.

Todas as atividades de treinamento vão ser realizadas a céu aberto, e também este ano não vão ser realizadas atividades em praça pública, voltadas à população de Matureia.

Não é preciso se hospedar no Casarão do Jabre para participar do evento, mas todas as atividades do encontro ocorrem por lá. Quem quiser participar mas não tiver nenhum tipo de equipamento, ainda pode aproveitar para conhecer o céu da região, fazer as trilhas noturnas e se inteirar sobre a astronomia e a astrofotografia.

O Encontro Paraibano de Astrofotografia reunia, até 2019, em torno de 80 a 100 pessoas por ano, mais do que a média do encontro brasileiro, realizado na cidade de Alto Paraíso, em Goiás. Até a última edição, um terço dos participantes eram de outros estados.

Para fazer a inscrição, é só entrar em contato pelos telefones (83) 99669-6466 (Renato Bandeira) e (83) 99926-1152 (Marcelo Zurita).