Análise: avanços, ainda que tímidos, no estímulo à participação feminina na política

Victor Barreto, advogado eleitoral, Mestre em Direito pela UNB, fala sobre as alterações da PEC 117, promulgada pela Congresso semana passada.

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Análise: avanços, ainda que tímidos, no estímulo à participação feminina na política
Ilustração: Agência Brasil

O Congresso Nacional promulgou, no último dia  cinco de abril, a Emenda Constitucional nº 117, que insere, na Constituição Federal, dispositivos que buscam ampliar a participação das mulheres na política.

Com a Emenda, o art. 17 da Constituição ganhou dois novos parágrafos, o 7º e o 8º. O primeiro obriga os partidos políticos a aplicarem no mínimo 5% dos recursos do Fundo Partidário na criação e na manutenção de programas de promoção da participação política das mulheres.

O Fundo Partidário é constituído por recursos públicos disponibilizados aos partidos para que realizem suas atividades em anos eleitorais ou não, como o pagamento de pessoal, a manutenção das sedes, a propaganda política etc.

Já o § 8º determina que o montante do Fundo Eleitoral (destinado exclusivamente às campanhas eleitorais) e da parcela do Fundo Partidário direcionada às campanhas, assim como o tempo de propaganda gratuita no rádio e na TV a ser distribuído pelos partidos às candidatas, deverão ser de no mínimo 30%, proporcional ao número de candidatas.

Ou seja, se uma agremiação tiver, por exemplo, metade de suas candidaturas composta por mulheres, a distribuição dos recursos e do tempo de propaganda gratuita também deverá ser de 50% para as candidatas.

Vale lembrar que o conteúdo do novo § 7º do art. 17 da Constituição já possuía previsão semelhante no art. 44, inciso V, da Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/1995); e o texto do § 8º, em parte, corresponde à decisão de mérito do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5617/DF.

Os avanços 

Tais medidas são avanços necessários no incentivo à participação das mulheres na política partidária, principalmente quando se observa a dimensão da desigualdade de gênero nesse âmbito: as mulheres correspondem a 53% do eleitorado brasileiro, mas apenas 15% das cadeiras do Congresso Nacional são ocupadas por elas. Além disso, mais de 900 municípios não tiveram nenhuma vereadora eleita em 2020.

Situação na Paraíba 

Na Paraíba, em 2018, somente 5 mulheres foram eleitas para as 36 vagas da Assembleia Legislativa e apenas uma Deputada Federal foi eleita entre as 12 cadeiras do estado na Câmara dos Deputados – ano no qual a Paraíba teve sua primeira senadora eleita.

Em razão de dados como esses, o Brasil ocupa a 142ª posição, entre 180 países, no ranking da União Interparlamentar sobre representatividade feminina na política.

Exemplos em tudo 

A desigualdade entre homens e mulheres na política reflete o desequilíbrio entre os gêneros na sociedade brasileira: de acordo com o IBGE, em 2019, 55,2% dos assalariados no país eram homens e 44,8%, mulheres; o salário médio mensal dos homens era 17,5% superior ao das mulheres; as mulheres dedicaram aos cuidados de pessoas ou afazeres domésticos quase o dobro de tempo que os homens (21,4 horas semanais contra 11 horas), entre outros números que colocam o Brasil no 93º lugar, entre 156 nações, no ranking global de igualdade de gênero do Fórum Econômico Mundial.

Análise: avanços, ainda que tímidos, no estímulo à participação feminina na política
Victor Barreto, advogado eleitoral, Mestre em Direito pela UNB e colaborador do Conversa Política. Foto: Arquivo Pessoal

Os retrocessos

Conforme o art. 2º da Emenda, os partidos que não utilizaram os recursos destinados à promoção da participação política das mulheres não poderão ser condenados pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas ainda não encerrados. O texto assegura, ao menos, a utilização desses valores pelos partidos nas eleições seguintes.

Sem punições 

Além disso, o art. 3º impede punições às agremiações partidárias que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições anteriores. Em 2020, o TSE decidiu que a distribuição do Fundo Eleitoral e do tempo de propaganda eleitoral deve ser proporcional ao total de candidatos negros que o partido apresentar para a disputa eleitoral.

A sensação

Esse tipo de anistia transmite à população a sensação de que os políticos podem sempre encontrar um jeito de burlar as regras eleitorais sem sofrer as consequências punitivas previstas na legislação, contribuindo para o descrédito da classe política.

Cabe destacar que nos últimos anos as mulheres conquistaram outros avanços legislativos quanto à atividade política, como a inclusão, na Lei das Eleições, da proibição a propaganda que deprecie a condição de mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino, ou em relação à sua cor, raça ou etnia; e da contagem em dobro dos votos dados a mulheres ou a candidatos negros para efeito da distribuição dos recursos dos fundos partidário e eleitoral nas eleições de 2022 a 2030.

Está, ainda, em tramitação, o Projeto de Lei nº 1951/2021, da Câmara dos Deputados, que propõe a reserva de pelo menos 30% das cadeiras das casas parlamentares do país para mulheres.

Espera-se que esse conjunto de iniciativas seja capaz de ampliar a participação feminina na política e de colaborar para que as mulheres ocupem cada vez mais cargos eletivos, equilibrando a representatividade nos parlamentos, pois, atualmente, eles estão distantes de retratar a diversidade do nosso país.

Por Victor Barreto

O assunto foi destaque no podcast Papo Político da CBN  e está disponível nas principais plataformas de áudio.