Desenvolvimento econômico da PB: quando as feiuras arquitetônica e econômica se encontram

Paraibano Erik Figueiredo, presidente do IPEA, que assina este artigo reproduzido pelo Conversa Política, destaca que, ao contrário do defendido pelas ideias desenvolvimentistas, o meio ambiente constitui um dos principais vetores para o desenvolvimento do nosso estado.

Economista Erik Figueiredo. Foto: Helio Montferre/Ipea

A Exposição Internacional de Artes Decorativas de 1925 foi considerada como um evento marcante para a retomada da vida cotidiana na Europa arrasada pela I guerra mundial.

Os franceses estavam decididos a não olhar para seu passado recente, mas sim para um futuro otimista. Nesse contexto, o arquiteto Charles-Edouard Jeanneret-Gris, mais conhecido pelo pseudónimo de Le Corbusier apresentou o Plano Voisin.

O plano consistia na reconstrução de uma parte do centro histórico de Paris, transformando-a em uma cidade de ruas largas e prédios funcionais sem nenhuma conexão com o seu passado (para visualizar a Paris idealizada por Le Corbusier, clique aqui).

A execução do plano contava com o deslocamento em massa dos moradores. Eles seriam retirados de seus bairros e transferidos para subúrbios nos arredores da cidade luz.

Os alojamentos destinados para essas pessoas, em sua maioria esmagadora, de baixa renda, serviram de inspiração para os projetos habitacionais para norte-americanos pobres.

Lugares sem nenhuma conexão com a história pregressa dos habitantes e, certa medida, muito semelhantes a grandes depósitos construídos para “estocar” gente indesejada pela arquitetura moderna (vejam o exemplo do projeto Pruitt-Igoe, Saint Louis, EUA)

Pois bem, mas qual é a relação entre essa fase da arquitetura e o desenvolvimento regional? Muitas dessas ideias foram importadas para as ciências humanas e em especial para o desenvolvimento regional.

A retirada em massa das pessoas de seu ambiente natural e seu deslocamento para um lugar sem nenhuma conexão com sua história pregressa esteve presente na obra do paraibano Celso Furtado.

De acordo com Vidal, em A problemática do semiárido nordestino à luz de Celso Furtado: permanência da pobreza estrutural, a “racionalização da economia (do semiárido) obriga, pois, ao deslocamento desse excedente demográfico relativo (…) O plano de ação apontava para o deslocamento da fronteira agrícola nordestina, em especial em direção às terras úmidas do Maranhão, não-sujeitas, portanto, ao fenômeno das secas”1:

Em Uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste, Celso Furtado afirmou: “Com efeito: o ‘excedente’ de população só se manifesta em toda sua crueza nos anos secos. Mas, como a política seguida pelo governo federal tem, na prática, eximido o sistema econômico da responsabilidade de manter grande parte de sua mão-de-obra nesses anos irregulares, a questão do excedente estrutural de população não é compreendida nos exatos termos. A solução dessa questão está inseparavelmente ligada à reorganização da unidade produtiva”2.

Nesse ponto, as feiuras arquitetônica e econômica se encontram. No caso da feiura da estratégia de desenvolvimento, a motivação seria a desconexão entre o homem e o meio ambiente no semiárido, embora se possa identificar elementos meramente políticos, i.e., focados na retirada dos eleitores interior do Nordeste, quebrando o elo de “dependência” política dos chamados “coronéis”.

Não importa que essas pessoas estejam sendo levadas para uma região desconhecida. Não importa que eles deixem seus entes queridos, suas histórias de vida, suas casas e seus laços afetivos para trás. Tampouco importa qual será a sua condição de vida no lugar de destino. Se eles também farão parte de um novo elo de dependência política no seu novo lócus e moradia.

Essa estratégia é apenas um exemplo do desenho desenvolvimentista equivocado. As demais ações derivadas desse pensamento têm contribuído para a perpetuação do atraso relativo do Nordeste.

A Paraíba, como o berço dessas ideias, tem ficado cada dia mais pobre. Para comprovar isso, basta dizer que a renda per capita (por pessoa) do Estado vem derretendo em relação à renda nacional e, até mesmo, a renda do Nordeste.

Em 1989, a renda per capita paraibana representava 56% da renda nacional. Em 2019 essa participação despencou para 43%. Logo, não só estamos estagnados, estamos cada dia mais pobres.

Por fim, o objetivo dessa matéria e dos estudos subsequentes, será demonstrar que, ao contrário do defendido pelas ideias desenvolvimentistas, o meio ambiente constitui um dos principais vetores para o desenvolvimento do nosso estado.

Não há uma desconexão entre o homem e o meio ambiente no semiárido, como disse Furtado. O que há é uma desconexão completa entre as estratégias atuais de desenvolvimento e a boa e eficiente teoria econômica.

1 Vidal, F. A problemática do semiárido nordestino à luz de Celso Furtado: permanência da pobreza estrutural. Pobreza e desigualdades sociais. Salvador: SEI, (Série Estudos e Pesquisas, 63). 2003.
2 Furtado, C. Uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste. 2. ed. Recife: Sudene, 1967.