PERDIDOS NA NOITE

Por Antônio Barreto Neto

PERDIDOS NA NOITE

A história do caipira que se dispõe a enfrentar a grande cidade e termina esmagado por ela já foi contada muitas vezes pelo cinema. Nunca, porém, com o realismo brutal e trágico de Perdidos na Noite. A luta do grandalhão e saudável texano Joe Buck para sobreviver à frieza e à indiferença da asphalt jungle novaiorquina é uma das mais dolorosas e pungentes aventuras humanas já mostradas na tela. Ao mesmo tempo, um dos mais penetrantes e cruéis depoimentos sobre o desigual conflito entre o indivíduo e o sistema social.

Atraído pela miragem da América supercivilizada, Joe deixa seu sossegado Texas para conquistar Nova York. Esnobado pela grande metrópole, não tarda a passar da condição de conquistador para a de conquistado. Perambulando em companhia de um tuberculoso aleijado pelos bairros sórdidos da cidade, faminto e com frio, faz o doloroso aprendizado do marginalismo na desumana batalha pela sobrevivência que se trava, violenta, nos bastidores da grande cidade. Joe enfrenta a dura e triste realidade que se oculta atrás do brilho e do esplendor da selva de concreto e vidro.

Inglês, com poucos anos de América, surpreendeu aos próprios críticos americanos o realismo da visão que o cineasta John Schlesinger teve de um dos aspectos mais brutais da complexa realidade social do país. Um realismo a que a poesia das imagens do filme confere um irresistível sentido trágico. Dustin Hoffman e Jon Voight – dois perdidos na noite suja de Nova York – têm talvez o mais sensível desempenho dos últimos dez anos no cinema. (10/11/1972)

A publicação do texto faz parte de uma série em homenagem ao crítico paraibano Antônio Barreto Neto, que, se estivesse vivo, faria 80 anos no dia quatro de abril.