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COTIDIANO

Elis Regina cantou num cinema porque não havia teatro para ela

Publicado em 08/09/2016 às 7:07 | Atualizado em 31/08/2021 às 7:46

Posto esse texto para lembrar que, nesta quinta-feira (08), Bertrand Lira lança o livro "Cinema Noir", no Cine Banguê, do Espaço Cultural. Depois, na tela grande, uma chance de ver (ou rever) "Rebecca", de Alfred Hitchcock.

Vamos ao texto:

Em dezembro de 1979, o hoje cineasta e professor Bertrand Lira tinha uma máquina fotográfica nova. Numa noite quente e chuvosa, ele a levou ao Cine Municipal, que suspendera suas quatro sessões diárias para receber, num palco improvisado, o show de Elis Regina.


				
					Elis Regina cantou num cinema porque não havia teatro para ela

Bertrand mexe na nossa memória afetiva com essa foto de Elis tal como a vimos no palco montado em frente à tela do Municipal. O cabelo longo, o traje branco, o microfone na mão, um sorriso no rosto, a bateria ao fundo, a enorme tela branca que exibia todas as quintas-feiras os filmes do Cinema de Arte.

O Teatro Santa Roza estava fechado para reforma. O Paulo Pontes ainda não existia. Para a última passagem de Elis por João Pessoa, o Municipal, com suas 800 poltronas azuis e brancas, foi transformado em teatro. O palco de madeira começava junto da tela e avançava até a primeira fila. Espaço pequeno, precário mesmo, quase insuficiente para acomodar o recital com o qual Elis & banda percorriam algumas cidades depois do show “Essa Mulher”.

Em 1979, Elis Regina trocara a PolyGram pela WEA. A estreia foi com o LP “Essa Mulher”. Também mudara o visual. O cabelo longo substituira o curtíssimo que adotou por vários anos. A voz estava impecável. O repertório tinha Baden Powell & Paulo César Pinheiro, João Bosco & Aldir Blanc, Joyce, Cartola. No “Bolero de Satã”, o dueto histórico com Cauby Peixoto. Em “O Bêbado e a Equilibrista”, o Brasil da anistia que trouxera de volta os exilados pela ditadura militar.

O show de Elis no Municipal trazia músicas de “Essa Mulher”. E algumas que apareceriam em “Saudade do Brasil”, disco/show do ano seguinte. “Onze Fitas” era devastadora. “A verdade não rima, a verdade não rima” – o samba de Fátima Guedes falava da nossa violência numa feição muito menos assustadora do que o que temos hoje.

Poucos foram ao Municipal naquela noite. Umas 200 pessoas numa sala para 800. O preço do ingresso assustara o público. Quando desci a rampa do lado esquerdo, com o cinema ainda vazio, Elis penteava o cabelo num canto da tela, por trás do palco. A foto de Bertrand me remete à emoção de tê-la visto de perto.

Imagem

Silvio Osias

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