SILVIO OSIAS
BACURAU estreia nesta quinta. Kleber Mendonça Filho é o maior nome do novo cinema brasileiro
Publicado em 29/08/2019 às 6:00 | Atualizado em 30/08/2021 às 20:40
No dia 15 de março de 1990, ao tomar posse como primeiro presidente eleito depois do golpe de 64, Fernando Collor, numa canetada só, acabou com o cinema brasileiro.
O homem da cultura no novo governo era o paraibano Ipojuca Pontes.
Ipojuca Pontes envergonha a Paraíba.
Ipojuca Pontes envergonha o cinema brasileiro.
Bem, como sabemos, Collor foi derrubado, e aí vieram Itamar e FHC e Lula, etc.
O cinema brasileiro renasceu. Foi renascendo.
Primeiro, falava-se em retomada. Cinema da retomada. Depois, a expressão ficou para trás.
A recuperação foi notável!
Novos diretores. Muitas mulheres dirigindo. Produções voltadas para plateias - digamos - mais exigentes. Outras destinadas essencialmente ao - tão importante - êxito comercial. Documentários, cinebiografias. Diálogo com a televisão. Prêmios internacionais, presença no Oscar (a Fernanda Montenegro de Central do Brasil). O Nordeste (Pernambuco, Paraíba, Ceará) dentro desse cenário. Ancine, Petrobrás. Qualidade e quantidade.
Tudo isso em 25 anos.
Agora, em 2019, um governo de extrema direita expressa o desejo de impor grandes restrições à produção brasileira de audiovisual. Não é papo de esquerdista. É o que tem sido dito e feito pelo governo do presidente Bolsonaro.
Adota-se, então, uma outra expressão. Cinema de resistência.
Bacurau, que estreia nesta quinta-feira (29) nas salas brasileiras, é um grande acontecimento político e estético e, por excelência, um exemplo disso que a gente está chamando de cinema de resistência.
Dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, Bacurau é cinema à altura do melhor cinema que se faz atualmente em qualquer lugar do mundo.
Acompanho Kleber Mendonça desde o tempo em que ele fazia crítica de cinema no velho Jornal do Commercio, onde, no passado, a gente lia Celso Marconi.
Depois, vieram os filmes de curta metragem (Vinil Verde, Recife Frio) e a fabulosa estreia no longa com O Som ao Redor.
Claro que havia a pergunta. Kleber conseguirá repetir o êxito de O Som ao Redor?
E, aí, veio Aquarius a mostrar que sim.
E, agora, Bacurau.
Ali no Recife, o Recife onde vi tantos filmes e tantos shows, o Recife das livrarias e das lojas de discos, ali no Recife, tão real porque tão perto de nós, surgiu esse cara a fazer justiça ao passado do cinema brasileiro e a dizer, com seus filmes, como é o presente e como pode ser o futuro.
Kleber honra a linhagem dos que migraram da crítica para a realização. Como François Truffaut - o primeiro nome que sempre me ocorre.
Kleber foi crítico, é cinéfilo e sabe tudo do seu ofício - ser cineasta, escrever e dirigir filmes.
Já escrevi aqui mesmo sobre Bacurau:
É filme realizado por quem pensa o cinema. A habilíssima manipulação dos gêneros, a construção de climas, a tensão permanente, o uso de trilhas preexistentes, o diálogo com o passado (do cinema) e a rara capacidade de atualizá-lo - tudo junto e misturado para levar o espectador à catarse final.
Bacurau é um grande filme. Daqueles aos quais a gente dá cinco estrelas. Como Inácio Araújo deu, na Folha.
Kleber Mendonça Filho é o maior nome do novo cinema brasileiro.
Ele e seus filmes estão aí a nos orgulhar.
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