COTIDIANO
Anchieta Maia ligou para Dom Hélder Câmara, e ele nos recebeu
Publicado em 07/02/2019 às 6:43 | Atualizado em 30/08/2021 às 23:36
Dom Hélder Câmara nasceu no dia sete de fevereiro de 1909.
Por isso, lembrei dele hoje.
E quis contar uma pequena história.
O ano era 1978.
Cajá estava preso em Pernambuco.
Quem era Cajá?
Um estudante ligado a Dom Hélder, arcebispo de Olinda e Recife.
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Em João Pessoa, estudante do Colégio e Curso União, eu me preparava para o vestibular.
Perseguido pelo regime militar, o professor (depois deputado estadual) Antônio Augusto Arroxelas, um dos donos do colégio, nos deixava à vontade para fazer coisas que não eram permitidas em outros estabelecimentos.
Uma delas: trazer Dom Hélder para fazer uma palestra.
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Anchieta Maia, muito antes do Moçada que agita, era o responsável pelo Centro Cívico, cuidava dos eventos.
Uma manhã, ele nos surpreendeu: "Liguei para Dom Hélder, e ele nos recebe hoje à tarde".
E lá fomos nós para o Recife: o professor Ronaldo (um baiano que dizia ser primo de João Gilberto e, deste, tinha o sobrenome Oliveira), Anchieta e três alunos (eu, Dida Fialho e Euni Santos).
Levávamos o convite para que o arcebispo viesse a João Pessoa conversar com os nossos colegas.
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Quando chegamos a Manguinhos, a primeira coisa que chamou minha atenção foi a absoluta simplicidade do lugar onde Dom Hélder trabalhava.
Uma figura com a dimensão dele, de projeção internacional, vivia ali pobremente. Que bom! Vivia como um verdadeiro cristão!
Logo fomos recebidos.
Lá veio o arcebispo de braços abertos a nos acolher: "Meus filhos, o que vocês querem de mim?".
E fizemos o convite.
Dom Hélder foi claro em sua resposta:
"Eu não vou. Não posso ir. Cajá está preso por minha causa e não quero que isto aconteça com outros estudantes".
Na recusa de Dom Hélder ao nosso convite havia a confirmação do que muitos diziam: a prisão do estudante era uma represália do regime militar à sua atuação como clérigo progressista.
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Voltamos frustrados porque ouvimos um "não".
Mas o encontro foi inesquecível.
A voz, o abraço, a franqueza, a simplicidade, a firmeza.
Tudo apontava para a grandeza daquele homem.
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