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COTIDIANO

Empresas de saúde do Rio criam manual para evitar sequestro de ambulâncias

Traficantes sequestram equipes médicas para atender criminosos. Ambulâncias evitam sinalizador, sirene e rádios; luzes, só internas.

Publicado em 08/08/2009 às 14:56

Do G1

Empresas do setor de saúde do Rio decidiram criar um manual de treinamento para evitar o sequestro de equipes médicas por traficantes. As quadrilhas, que já montaram enfermarias e estocaram materiais para cirurgias e curativos, levam inclusive ambulâncias para atender criminosos baleados ou doentes dentro das favelas.

Como medida de precaução, as companhias orientam os funcionários a desligarem a sirene, os faróis altos e não utilizarem os rádios. A ajuda de familiares do paciente, que acompanham as equipes, também faz parte do manual.

Um técnico de enfermagem, que trabalha no Hospital Pedro II, em Santa Cruz, na Zona Oeste, e em uma empresa de remoção, foi uma das vítimas de ataques de criminosos. Depois de socorrer um traficante baleado na favela Cesarão, sob a mira de fuzis, foi obrigado a visitá-lo todos os dias para fazer curativos.

“Meu medo era alguém descobrir e denunciar à polícia. Fiquei quase dois meses sem conseguir dormir e sem tranquilidade para trabalhar direito. Quando eu deixava a casa, eles repetiam as ameaças, dizendo que sabiam onde eu morava e conheciam o colégio dos meus filhos. Era um terror”, conta.

Com mais de 15 anos de experiência, o capitão do Corpo de Bombeiros e diretor médico da empresa Toesa Service, André Luís Morais, reconhece a dificuldade das equipes em trabalhar nas áreas de riscos para fazer remoções ou atender os pacientes.

“Onde impera o tráfico, é difícil entrar. E, em outros casos, o profissional é ameaçado e obrigado a socorrer criminosos feridos”, revela o cardiologista, que também coordena a Unidade de Pronto Atendimento (UPA 24 horas) Campo Grande II, região cercada por redutos do tráfico.

Sequestro e ameaças

“Eles chegam a sequestrar profissionais da área médica para forçar a atender nas miniclínicas improvisadas dentro das favelas. Essas pessoas, principalmente as que moram nas comunidades, sofrem ameaças, constrangimentos e, em geral, não têm coragem de registrar queixa nas delegacias, claro. Já tive casos de muitos enfermeiros justificarem que se atrasavam porque eram obrigados a fazer curativos em criminosos feridos”, afirma o cardiologista.

Para o diretor médico do Grupo Bem, Orlando Barreto Neto, com a ampliação dos atendimentos das operadoras de saúde, que atingem diversas regiões do Rio, a exposição das equipes ao risco aumentou.

“Passou a ser uma coisa frequente, a gente enfrenta constantemente essa situação de risco. Em alguns casos, somos impedidos de entrar para atender um paciente dentro da comunidade. Já nos deparamos com homens armados que revistaram a ambulância e ainda mandaram motoqueiros armados escoltando o veículo até a casa”, relata.

A empresa passou a treinar as equipes a partir da elaboração de um protocolo interno de segurança. “A gente orienta para que não liguem o giroflex e nem a sirene; apaguem os faróis altos e acendam apenas as luzes internas; não usem rádios e não criem nenhum clima de resistência”, explica Orlando Barreto Neto.


“Em alguns casos, mandamos um líder de operação, que vai na frente, para fazer uma espécie de avaliação de um possível conflito na área. Se não houver segurança para entrar, pedimos que um familiar desça até um ponto seguro e acompanhe os profissionais até a casa ou tragam o doente até o local. A recomendação é não deixar de atender o paciente, mas expor a equipe ao mínimo de risco”, acrescenta.

Enfermarias do tráfico

Segundo o delegado Deoclécio Assis, titular da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas, a descoberta, em julho, de bases de atendimento médico do tráfico nas favelas, foi uma surpresa. “A operação que nossas equipes estavam realizando no Jacarezinho e em Manguinhos, que têm vínculo associativo do tráfico, era para localizar paiois de armas e drogas e nos deparamos com aquele aparato de enfermaria”, afirma.

Em barracos das comunidades, os policiais apreenderam colchão, lençol e travesseiro, que serviriam de "leito", além de antibióticos, antiinflamatórios, analgésicos, seringas, luvas cirúrgicas, gazes, esparadrapos e tubos para aplicação de soro.

O chefe de Polícia Civil, delegado Allan Turnowski, afirmou que médicos e enfermeiros suspeitos de prestarem serviço a supostos traficantes nas enfermarias clandestinas foram localizados e podem ser indiciados por associação ao tráfico de drogas e formação de quadrilha. O diretor das delegacias especializadas, Rodrigo Oliveira, está encarregado da investigação e mantém o caso sob sigilo.

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Jornal da Paraíba

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