COTIDIANO
Quem foi Manoel Luiz da Silva, trabalhador rural cuja morte motivou condenação do Brasil
Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Estado brasileiro pela morte do trabalhador, em 1997.
Publicado em 20/02/2025 às 6:07
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O Estado brasileiro foi condenado nessa terça-feira (18) pelo assassinato do trabalhador rural Manoel Luiz da Silva e por violar o direito à integridade pessoal dos seus familiares em virtude do sofrimento causado com a falta de processamento célere da ação penal.
A decisão é da Corte Interamericana de Direitos Humanos e é inapelável. Inclusive, o Governo brasileiro reconheceu a sua culpa e a sua "responsabilidade internacional" pelo caso.
Mas, afinal, quem é Manoel Luiz da Silva? E por que o caso repercute quase 28 anos depois de sua morte, ocorrida em 19 de maio de 1997?
O Jornal da Paraíba explica um pouco essa história.
Vida dura e repressão no campo
Manoel Luiz da Silva nasceu em 9 de junho de 1957, era paraibano e sempre teve uma vida muito pobre. Perto de completar 40 anos de idade, era casado com Edileuza José de Lima, de 25 anos, e tinha um filho de 4 anos.
Em 24 de março de 1997, ele e sua família viviam no município de São Miguel de Taipu e, ao lado de outras 84 famílias, ajudou a ocupar a Fazenda Taipu, que era considerada improdutiva.
Dois dias depois da ocupação, entretanto, acabaram despejados, de forma que todas essas famílias se deslocaram para a Fazenda Amarela 2, que ficava próxima e já era uma área desapropriada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
A tensão no campo, entretanto, seguia alta, e os agricultores sem-terra eram constantemente vítimas de ameaças.
Quase dois meses depois daquelas primeiras ocorrências, em 19 de maio de 1997, Manoel Luiz da Silva e mais três agricultores deixaram o assentamento com o objetivo de comprar querosene num mercado próximo, já que o local não tinha energia elétrica e os candeeiros precisavam ser alimentados.
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Por volta de cinco da tarde, entretanto, tal como descrito no relatório de mérito apresentado e acatado na Corte Interamericana de Direitos Humanos, o grupo foi vítima de uma emboscada na área próxima da Fazenda Taipu.
Ainda de acordo com a denúncia que serviu de base para a condenação, os assassinos seriam José Caetano da Silva, Severino Lima da Silva e Marcelo da Silva Wanderley, a mando do fazendeiro Alcides Vieira de Azevedo, proprietário da fazenda.
O trio de seguranças armados teria dito que os trabalhadores não poderiam passar por aquela área, houve uma discussão e Manoel acabou assassinado a tiros, tendo morte instantânea. Depoimentos da época falam também que eram normais capangas serem vistos fortemente armados naquela região.
Depois do crime, o corpo de Manoel ficou pelo menos 18 horas no local dos disparos antes de ser retirado pelas forças policiais e só depois de dois dias ele foi enterrado, no próprio município de São Miguel de Taipu, com a presença de trabalhadores sem-terra e de representantes da Comissão Pastoral da Terra, que já na época protestaram contra o crime.
Após o crime, mais sofrimento
O fazendeiro Alcides Vieira de Azevedo nunca foi julgado e, na época das investigações, não foi nem mesmo citado como mandante do crime, no que a Corte trata como um dos casos de omissão do Estado brasileiro em investigar o crime.
Já a família de Manoel Luiz da Silva nunca se recuperou. De acordo com o julgamento, Edileuza José Adelino ficou totalmente desamparada após a morte do marido.
Primeiro que, pouco tempo depois da morte do agricultor, a viúva descobriu que estava grávida de dois meses quando o marido foi morto. O bebê chegou a nascer, mas não sobreviveu à primeira infância.
Para piorar, ela desenvolveu alcoolismo, o que a impossibilitou de continuar a cuidar do filho, que passou, então, a morar com vários parentes, mudando-se de uma casa para outra ao longo dos anos. Edileuza morreu em 2005 em virtude da doença.
Josefa Maria da Conceição, mãe de Manoel, viveu por muitos anos na zona rural do município de Caaporã.
O filho mais velho da vítima, Manoel Adelino da Silva, hoje tem 32 anos.
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