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COTIDIANO

Nomes dão vida à bandinha de jazz

Publicado em 25/04/2017 às 6:33 | Atualizado em 31/08/2021 às 7:45

Para Márcio Roberto

Meu irmão tinha uma bandinha de jazz em cima da estante. Cinco figuras esculpidas provavelmente na China, algo impensável nos tempos do velho Mao. Um quarteto a acompanhar uma cantora. Piano, contrabaixo, bateria e sax. O jeito de caricatura dos músicos era nítido. O caráter kitsch, indisfarçável. Mas havia algo charmoso. Sempre os quis para colocar junto dos meus discos.


				
					Nomes dão vida à bandinha de jazz

Quando vi a bandinha pela primeira vez, imaginei que a cantora era Ella Fitzgerald. Olhei para aquela figura com uns quinze centímetros de altura, vestido cor de goiaba, anel luminoso no dedo, e pensei em Ella numa arrebatadora performance ao vivo. Como no disco gravado em Berlim. A voz que tinha um traço infantil, a extraordinária capacidade de improvisar sobre a melodia das canções, um domínio raro do canto. Gosto dela incondicionalmente. Seja nos clássicos songbooks, nos discos de estúdio com as mais diversas formações ou nos registros ao vivo. Tudo na sua trajetória a coloca no topo, junto das melhores cantoras do mundo.

Para mim, o pianista da bandinha não poderia ser outro. Era Oscar Peterson. Os dedos mágicos correndo sobre as teclas do piano em velozes e inacreditáveis improvisações. Piano, contrabaixo e bateria. Um trio, nada mais. Do jeito que ouvi na adolescência, nas sessões dominicais na Praça da Pedra, quando fui apresentado ao jazz. Ou na casa de Fernando Aranha, que se inspirava em Peterson para tocar na noite pessoense, na primeira metade da década de 1970. Estrela de primeiríssima grandeza, o canadense Oscar Peterson também atuava como acompanhante. E é assim que vamos encontrá-lo em inúmeros discos, antológicos e indispensáveis, que Norman Granz produziu na Verve.

Se, na minha imaginação, era Oscar Peterson que acompanhava Ella Fitzgerald na bandinha, pensei que o contrabaixista e o baterista poderiam ser os músicos com os quais formou o trio que ouvimos em discos como “Night Train” ou “We Get Requests”. Ou, ainda, “West Side Story”, com a recriação das melodias fantásticas escritas por Leonard Bernstein. Ray Brown no contrabaixo e Ed Thigpen na bateria. Soberbos, precisos, parceiros perfeitos para o pianista. Também é incondicional meu amor por Peterson. Na Verve, mais tarde na Pablo, em carreira solo ou como acompanhante (mas não mero) de grandes estrelas do jazz. Até a despedida, numa noite inesquecível em Viena.

Faltou o saxofonista. Me vieram à cabeça dois nomes: Coleman Hawkins e Ben Webster. Achei que caberiam bem na bandinha. E que estariam à vontade ao lado de Peterson, Brown e Thigpen na tarefa de acompanhar Ella. Engraçado. Não quis escolher músicos revolucionários. Nem Charlie Parker, muito menos John Coltrane. Hawkins ou Webster – não cheguei a definir. Os dois produziriam sons que não nos privariam de ouvir os ruídos do próprio sopro.

Jairo morreu em setembro de 2007. Em junho, no dia do meu aniversário, fui visitá-lo no hospital. Ele me disse que tinha um presente: a bandinha de jazz. Fiquei embaraçado, tentei convencê-lo de que não era o caso, mas cedi à sua insistência. Aceitei o presente certo de que meu irmão já tinha a consciência da morte.

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Silvio Osias

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