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COTIDIANO

Pacientes com câncer enfrentam Covid-19 e o medo de continuar os tratamentos

Um ano após início da pandemia, médicos pedem que pacientes não interrompam luta contra o câncer.

Publicado em 18/03/2021 às 9:20 | Atualizado em 18/03/2021 às 16:16


                                        
                                            Pacientes com câncer enfrentam Covid-19 e o medo de continuar os tratamentos
Foro: Arquivo Pessoal/Socorro Gomes

				
					Pacientes com câncer enfrentam Covid-19 e o medo de continuar os tratamentos
Foro: Arquivo Pessoal/Socorro Gomes. Foro: Arquivo Pessoal/Socorro Gomes

Senti meu corpo não reagir”, “Fiquei mais fragilizada”, “Chorei muito e tive muito medo”. Essas são algumas frases ditas pela paraibana Socorro Gomes, de 60 anos, paciente de câncer que enfrentou e venceu a Covid-19. Um ano após ver seu tratamento contra um câncer de ovário ser ameaçado pela pandemia, a aposentada permanece convivendo com várias incertezas.

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Socorro Gomes enfrenta o câncer há quatro anos. Já passou por cirurgias, radioterapias e quimioterapias. Chegou a pesar pouco mais de 30 quilos e ser desenganada por médicos, logo no início do tratamento, em 2017. Mas, após as primeiras intervenções, ganhou força para continuar.

“Quando descobri o câncer eu estava muito fraca, com anemia forte e a barriga bem inchada. Um médico falou que a situação era bem complicada e teve até medo de me encaminhar para a quimio, mas não desisti. Enquanto há vida, há esperança, né?”, comenta.

Durante parte do tratamento, Socorro precisava se deslocar de Água Branca, no Sertão da Paraíba, para o Hospital Napoleão Laureano, João Pessoa – uma viagem que dura, em média, sete horas. Mesmo assim, conseguiu retirar um nódulo no colo do útero e outro no ovário direito.

Quase quatro anos depois, após passar por parte do tratamento e até conseguir melhorias significativas em seu quadro de saúde, Socorro precisou enfrentar uma nova ameaça que o mundo conhecera, em 2020: o novo coronavírus.

Ela já havia chegado ao fim dos procedimentos para a cura do câncer, e passava apenas por exames de rotina para monitorar a reação do organismo. Foi em um desses procedimentos simples que Socorro descobriu ter contraído a Covid-19.

“Fiz uma ressonância e quando cheguei em casa o pessoal da clínica me ligou pedindo pra voltar, porque havia um problema no exame. Me pediram pra bater uma tomografia, que mostrou os pulmões comprometidos pelo novo coronavírus”, explica.

Até então, segundo Socorro, nenhum sintoma gripal, como febre e dor de garganta, havia se manifestado. Mas o médico indicou que as dores no corpo e na cabeça, reações comuns à quimioterapia, já poderiam ser sinais da Covid-19.


				
					Pacientes com câncer enfrentam Covid-19 e o medo de continuar os tratamentos
Foro: Arquivo Pessoal/Socorro Gomes. Foro: Arquivo Pessoal/Socorro Gomes

Apesar do risco à saúde, Socorro não precisou ser hospitalizada. Ela foi orientada de maneira remota pelo oncologista responsável e recebeu uma medicação devidamente prescrita. Depois do período de isolamento, o alívio por não ter desenvolvido quadro grave de Covid-19 deu lugar a outra preocupação: o câncer retornou ainda mais agressivo que antes.

“Não tive sintoma grave de Covid-19, mas quando voltei ao médico ele fez exames e as células cancerígenas voltaram com tudo. Fiquei desesperada. Meu oncologista falou que, infelizmente, o câncer havia voltado. Tive que começar do zero, voltar ao tratamento, fazer 20 sessões de quimioterapia mais uma vez”, disse.

Impactos da pandemia nos tratamentos de câncer

Mesmo sem estudos que comprovem prejuízos da Covid-19 para pacientes de câncer, é certo que a pandemia gerou muitos impactos negativos aos tratamentos oncológicos. Na Rede Feminina de Combate ao Câncer da Paraíba, que acolhe mulheres com câncer em João Pessoa, por exemplo, grande parte dos pacientes interrompeu

Segundo Karla Bezerra, gerente administrativa da Rede, desde 2020 a quantidade de pacientes em tratamento oncológico que buscam acolhimento caiu consideravelmente, saindo de 20 para 10 pessoas apenas de março a maio do ano passado. Agora, apenas 4 pacientes continuam indo ao local.

Karla explica que poucos pacientes a justificaram os motivos pelos quais estavam interrompendo os tratamentos, pois a maioria deles fez isso por conta própria, por medo de contrair o novo coronavírus.

“Tivemos uma queda grande na demanda por ajuda. Os próprios pacientes têm medo, mesmo que nós tomemos todos os cuidados com higienização do ambiente. Só duas pessoas ligaram avisando que não viriam, mas o resto simplesmente não apareceu”, comenta.

Alguns pacientes oncológicos acolhidos na instituição, como dona Socorro Gomes, testaram positivo para a Covid-19, mas nenhum deles chegou a desenvolver o quadro grave da doença. Apesar de vencer o vírus, essas pessoas poderão ter sérios problemas devido à interrupção do combate ao câncer.

Podemos afirmar com toda certeza que o paciente oncológico abandonou o tratamento com medo de ser acometido pela Covid-19. Os médicos nos relatam que muitas pessoas descobriram tumores, principalmente na mama, e não voltaram mais ao Laureano com medo do coronavírus. Um prejuízo sem tamanho”, afirma.

Cientificamente falando

Ainda não há evidências científicas que comprovem a relação do aumento ou remissão do câncer em pessoas que contraíram o novo coronavírus. O Instituto Nacional do Câncer (inca), inclusive, alerta apenas para os riscos de complicações graves da Covid-19 em pacientes oncológicos pela baixa imunidade, decorrente da alta dosagem de fortes medicações e procedimentos normalmente realizados.

O médico oncologista Marcos Nunes, que atua como oncologista clínico no Hospital da FAP, referência no combate ao câncer em Campina Grande e região, ressalta que a maior orientação neste momento é que os pacientes não interrompam o tratamento por contra própria, mas busquem a opinião dos oncologistas responsáveis de modo a adaptar o tratamento ao contexto de pandemia.

Marcos também explica que, naturalmente, pacientes com câncer estão mais vulneráveis à Covid-19 que outras pessoas quando passam por tratamentos que diminuem a imunidade, como a quimioterapia. Para diminuir os riscos de contágio pelo novo coronavírus, o tratamento pode ser adaptado.

“Avaliamos os potenciais benefícios de acordo com outros riscos, como efeito colateral de medicamentos ou exposição a infecções. Na pandemia, o risco é maior para uma infecção potencialmente fatal em pacientes oncológicos, então se eles se sentem inseguros em ir ao hospital, podemos modificar o tipo de intervenção. O importante é ter consenso”, explica.

O médico especialista também lembra que, enquanto não há vacinação em massa, prevenção é a palavra de ordem, também, para pessoas com câncer. Por isso, cuidados como não se aglomerar e utilizar máscaras devem ser incorporados ao dia a dia desses pacientes.

“Cada pessoa tem suas individualidades e necessidades, mas é importante tentar manter o mínimo de exposição. Usar máscara, álcool em gel e, caso tenha a Covid-19, buscar orientação junto ao oncologista para saber quais providências tomar. Se houver piora no quadro, buscar assistência hospitalar”, reforça.

Vacina

Ainda de acordo com o oncologista, não há contraindicação a respeito da imunização contra o novo coronavírus em pacientes com câncer. Dessa forma, caso tenham direito, essas pessoas podem receber as vacinas devidamente aprovadas pela Anvisa, independente de seu fabricante.

Ainda de acordo com o oncologista, não há contraindicação a respeito da imunização contra o novo coronavírus em pacientes com câncer. Dessa forma, caso tenham direito, essas pessoas podem receber as vacinas devidamente aprovadas pela Anvisa, independente de seu fabricante.

Acesso à vacina é primordial! Eles (pacientes oncológicos) têm orientação para receber o imunizante, independente do fabricante. Sabemos que há potencial para proteger”,

Já o secretário executivo de Saúde da Paraíba, Daniel Beltrammi, explica que a vacinação contra a Covid-19 em pacientes com câncer pode acontecer, mas deve ser analisada pelo oncologista responsável, pois cada caso é específico ao diagnóstico encontrado.

“Pacientes oncológicos que estão fazendo quimioterapia e radioterapia precisam ser avaliados. Isso porque, eventualmente, eles estão com o sistema imune debilitado. Já os pacientes com câncer com quadro de saúde estável, que estão respondendo ao tratamento, podem ser vacinados sim”, explica.

*Sob supervisão de Jhonathan Oliveira 

Imagem

Bruna Couto

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