COTIDIANO
RETRO2016/Elis Regina no palco e na tela
Publicado em 19/12/2016 às 6:29 | Atualizado em 31/08/2021 às 7:48
No ano que está terminando, tivemos dois reencontros com Elis Regina.
João Pessoa viu, afinal, o musical que conta a história da maior cantora brasileira. E chegou aos cinemas a sua cinebiografia.
NO PALCO
Elis, a Musical dialoga com dois públicos. Um, formado pelos que não foram contemporâneos de Elis Regina. Outro, pelos que foram. Neste, cabe uma subdivisão: os que não só foram contemporâneos da maior cantora do Brasil, mas tiveram o privilégio de vê-la ao vivo.
Seja qual for o público, objetivamente, é um espetáculo muitíssimo bem realizado. Dirigido por Dennis Carvalho, Elis, a Musical, da concepção ao resultado final, tira nota 10 em qualquer um desses itens: texto, escolha de repertório, cenografia, figurino, direção musical, desempenho do elenco. Nada está fora do lugar nos 150 minutos de duração dos dois atos.
Subjetivamente, a minha percepção é a de quem foi contemporâneo de Elis e pôde vê-la ao vivo. Nessa perspectiva, o musical escrito por Nelson Motta e Patrícia Andrade corresponde a tudo o que de melhor foi dito dele. É uma viagem melancólica e nostálgica por um tempo que, a despeito de ser de trevas, ofereceu contrapontos da dimensão de uma Elis Regina.
A tragédia pessoal da artista se funde ao impasse brasileiro das décadas de 1960 e 1970. Do festival que a revelou com “Arrastão” (1965) à morte aos 36 anos (1982), Elis teve pouco mais de uma década e meia de carreira. Com muita fidelidade, o espetáculo conta a sua história e um pouco da história do país através de canções que são verdadeiros petardos para seus contemporâneos.
Viagem nostálgica porque remete à juventude dos que viram e ouviram Elis em sua época. Melancólica porque fala de sonhos desfeitos, de permanentes transversais do tempo. Elis, a Musical faz pensar no país convulsionado da ditadura, também no de hoje. A letra comovente de “Aos Nossos Filhos”, escrita num Brasil que não existe mais, soa mais forte ainda quando ouvida agora.
A permanência dos impasses brasileiros impede o que Elis, com a voz embargada, pede na letra da canção. Que se faça a festa por ela.
NA TELA
João Marcello, o filho de Elis Regina com Ronaldo Bôscoli, disse que Elis é um bom filme. Entendi assim a fala dele: é apenas bom, mas não deixe de ver!
Saí do cinema com essa sensação: é correto, bem realizado, não é excepcional, mas como é necessário!
No passado, as estrelas da música popular viravam estrelas de cinema. Ou, aqui, acolá, apareciam num documentário sobre um grande show ou uma turnê.
Agora, depois que o tempo passou, elas se transformaram em personagens de cinebiografias ou de documentários que olham as coisas de longe.
O cinema brasileiro está cheio desses filmes. Faz uns 15 anos. São importantes para a construção da memória.
Elis é o mais recente. Quem viu Elis, a Musical, pode achar que há muitas semelhanças entre os dois. E há. Eles, na verdade, se completam.
No teatro, vivemos um pouco a ilusão de que estamos diante de Elis. Isso impressiona contemporâneos e não contemporâneos dela.
No cinema, não. Mas há o impacto de uma atriz (Andreia Horta) que ficou muito parecida com a cinebiografada. Em muitos momentos, ela "recebe" Elis. Não tem nada de caricatural, como andaram dizendo!
E há o impacto da música. Andreia dubla. A voz é de Elis, cantora extraordinária que surgiu e cresceu no Brasil da ditadura e se consolidou pelo singular domínio da voz, entre a técnica e a emoção, e pelo marcante repertório que gravou em seus muitos discos.
O filme de Hugo Prata tem o contexto histórico em que Elis se firmou, seus (grandes) dramas pessoais, que acabaram levando ao desfecho trágico e prematuro, e tem muita música. Números muito bem filmados que impressionam os que admiram a artista.
A música de Elis e o desempenho de Andreia Horta são os destaques desse filme que emociona os que viram Elis em seu tempo e ensina algo aos que não viram!
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