VIDA URBANA
Agricultora supera dificuldades para sustentar os filhos
Sem chuva, agricultora de Souza dribla as dificuldades para sustentar os filhos com dinheiro do Bolsa Família e de trabalhos domésticos.
Publicado em 18/05/2013 às 6:00 | Atualizado em 13/04/2023 às 17:07
Quando ouviu o barulho da chuva no Dia de São José (19 de março), a agricultora Eliane Sobreira, 37, pulou da cama e foi até o terraço da casa simples onde mora com os quatro filhos, no sítio Quandu, no município de Sousa, Sertão. Ao ver a terra molhada, não se conteve e chorou, agradecendo a Deus. Os sertanejos religiosos acreditam que, se tem chuva no Dia de São José, o ano será de boa safra. Depois de alguns minutos observando a chuva, entrou e abraçou as crianças, que ficaram sem entender o gesto da mãe.
Esta é a primeira grande seca que Eliane enfrenta com tantas responsabilidades. Na pequena lavoura onde cultiva milho e feijão, nada se aproveitou. Desde o ano passado, ela dribla as dificuldades para sustentar os filhos com o que recebe do programa do Governo Federal, Bolsa Família (R$ 212). Para complementar a renda, faz faxinas em casas próximas, cobrando R$15 pelo dia de serviço. “Eu varro, passo pano, lavo tudo. Modéstia a parte, deixo a casa impecável”, diz Eliane, fazendo propaganda do serviço.
Ela consegue fazer pelo menos três faxinas por semana. Com o dinheiro que arrecada, compra o que chama de 'coisinhas diferentes', como achocolatado, extrato de tomate e biscoitos.
“As crianças adoram”, conta. O filho mais velho de Eliane tem 13 anos; o mais novo tem 4. Eliane é separada, mas diz que, mesmo sozinha, não deixa faltar o básico em casa. “Não é fácil dar conta de quatro filhos sozinha, mas não desisto. Não adianta se lamentar, a gente tem mesmo é que ter coragem”, declara a agricultora.
O coco seco que ainda resta no coqueiro plantado na pequena propriedade é usado como mercadoria de troca, na feira de São Gonçalo. “Consigo trocar por arroz, macarrão e leite”, conta.
Apesar do pouco dinheiro, Eliane diz que gosta de fazer uma reserva financeira, para dias difíceis como os de agora.
Orgulhosa, ela convida a equipe de reportagem para ir até à cozinha e mostra a geladeira que comprou com o dinheiro do feijão da safra de 2011. “Comprei na promoção e paguei à vista”, revela. “Agora a gente toma água geladinha, é muito bom”, comemora.
A seca deste ano vai impedir Eliane de comprar o tão sonhado sofá e de concluir a reforma da casa. “Queria muito um sofá novinho para a sala ficar mais bonita, mas sei que vou ter que esperar pela próxima chuva”, destaca. A reforma também não será possível. “Por enquanto vai ter que continuar assim (mostrando as paredes inacabadas), mas nem reclamo. Pior é quem não tem uma casa ou mora de aluguel”, afirma.
Apesar de tanta dificuldade, a casa de Eliane transmite uma energia positiva. As crianças brincam no terraço e ela não mostra tristeza, ainda que alguém ache que sua história de vida é digna de piedade. “Não gosto que tenham pena de mim. Eu só peço a Deus saúde para continuar cuidando dos meus filhos, e chuva, para voltar a plantar”, revela. A agricultora não se deixa abater pelas consequências da seca, apesar de não negar as dificuldades que enfrenta.
Quando a equipe chegou à casa de Eliane, quem abriu o portão foi Everton, 4 anos. Com a inocência própria de sua idade, tentou consolar a mãe, enquanto ela falava da luta diária pela sobrevivência. A mãe logo corresponde o carinho do filho com um abraço. “São eles que me sustentam e me fazem forte para enfrentar qualquer batalha”, declara.
Com o dinheiro que recebe do Bolsa Família, Eliane faz a feira do mês, compra remédios, troca o gás. Os pais dela, sempre que possível, ajudam com alguma coisa. Só depois de muita conversa, Eliane admite que teme que a seca se agrave. “Eu tenho que plantar, porque viver com de faxina e do Bolsa Família é muito pouco”, comenta. “Todas as noites rezo e peço a Deus que mande chuva para nosso Sertão tão sofrido”, revela.
Mas enquanto a seca perdurar, Eliane terá de se virar com o que tem – e do jeito que sabe. O filho mais velho a ajuda a carregar os baldes de água do açude São Gonçalo até a casa deles. “Eu trago o mais pesado e ele traz o outro, mais leve”, explica. Sem essa água, a família da agricultora não teria como tomar banho e se alimentar. Eliane se despede da equipe de reportagem com uma declaração que também é um recado aos gestores públicos: “A gente só pode contar com Deus e com a solidariedade dos vizinhos. Na seca os políticos esquecem da gente e só aparecem de novo perto das eleições”.
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