VIDA URBANA
'Cinquentinhas': problema de mobilidade, saúde e segurança
Na PB há cerca de 58 mil veículos do tipo circulando, diz Detran. Frota pode ser maior, visto a falta de regulamentação.
Publicado em 03/07/2015 às 6:00 | Atualizado em 07/02/2024 às 13:25
Um problema de mobilidade urbana, de saúde e de segurança pública. Assim se pode definir a multiplicação das motos de 50 cilindradas (cc), as famosas 'cinquentinhas', na Paraíba. No Estado, há em torno de 58 mil veículos desse tipo em circulação, segundo informações da diretoria de operações do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PB). No entanto, estima-se que esse número seja ainda maior, tendo em vista a falta de controle da frota, que não possui regulamentação.
São elas, as cinquentinhas, as principais responsáveis por elevar o número de acidentes de trânsito. Conforme dados do Ministério da Saúde, a Paraíba ocupa a 12ª posição no ranking nacional de mortes em decorrência de acidentes de trânsito com motocicletas, com taxa de mortalidade de 9,1 para cada 100 mil habitantes. Em dez anos o Estado apresentou crescimento de 313,6%. Somente no ano passado foram realizadas 3.169 internações de vítimas de acidentes com motocicletas no Estado, sendo que a maior parte delas tem relação com as cinquentinhas.
Mesmo sem conduzir esse tipo de veículo, Julião Soares, morador da cidade de Queimadas, no Agreste, foi atropelado e teve uma perna e um braço fraturados em decorrência do acidente. “Eu estava parado embaixo de uma árvore, quando veio uma moça de uns 15 anos e me atropelou. Não tive reação porque nem esperava isso, mas vi que ela mal sabia dirigir”, disse.
Além dos acidentes, as motos de 50 cc também têm uma estreita relação com os crimes, conforme o Batalhão de Policiamento de Trânsito da Paraíba.
“Os ciclomotores transitam livremente sem placa, são usados para ações criminosas do tipo tráfico de drogas, homicídios, saidinha bancária, roubos diversos, pessoas que desrespeitam o uso de equipamentos de segurança e não há como penalizar esse condutor, em virtude da dificuldade de identificação”, comentou o comandante do BPTran, coronel Almeida Martins. Ainda segundo ele, 99% dos condutores desse tipo de veículo não possuem habilitação.
FAMUP
A reportagem tentou contato com o presidente da Federação das Associações de Municípios da Paraíba (Famup), mas, até o fechamento desta edição, não obteve sucesso.
OBRIGAÇÃO DOS MUNICÍPIOS
A inércia em relação ao emplacamento das cinquentinhas já entrou em contradição por determinadas vezes na Paraíba. No ano passado, o Conselho Estadual de Trânsito (Cetran) criou uma resolução estipulando um prazo para que os municípios que não tivessem o trânsito municipalizado regularizassem o emplacamento das motos até 50 cilindradas ou se conveniassem ao Detran para regulamentar os veículos. Todavia, essa resolução foi contestada pela 6ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça, já que por lei, o licenciamento e registro dos ciclomotores é uma responsabilidade dos municípios.
Entretanto, dos 223 municípios paraibanos, apenas 24 têm o trânsito municipalizado e nenhum deles cumpre a determinação do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Nem mesmo as duas maiores cidades do Estado, João Pessoa e Campina Grande, seguem a regra e emplacam os veículos como determina a legislação. No caso de João Pessoa, a Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (Semob) alega que está disposta a dialogar com a população e os órgãos envolvidos sobre a melhor forma de realizar o licenciamento, mas esbarra em questões técnicas, a exemplo da dificuldade de identificação dos veículos que, se cadastrados pelo município, teriam uma placa que não faz parte da base de dados do Detran.
“Assumir isso sozinho seria criar um mini Detran dentro de cada órgão de trânsito, o que teria custo alto para o poder público. Nós queremos construir juntos uma solução com a participação da sociedade, firmando parceria com o Detran, mas para isso a gente precisa aguardar algumas medidas que precisam ser solucionadas”, pontuou o superintendente da Semob, Roberto Pinto.
Segundo ele, o ideal seria que as prefeituras tivessem a possibilidade de firmar convênio com o Detran para que o órgão de trânsito possa fazer o licenciamento das cinquentinhas nos moldes dos demais veículos. “Esse assunto foi discutido na última reunião do Fórum Nacional dos Secretários de Mobilidade Urbana, quando aprovamos uma solicitação ao Denatran, para que ele intervenha na questão”, acrescentou.
Já em Campina Grande, conforme o gerente de trânsito da Superintendência de Trânsito e Transportes Públicos (STTP), Bernardo Pimentel, falta uma especificação em torno da competência para esse emplacamento, já que a lei diz que é dever do município, mas não detalha o procedimento do emplacamento.
“Campina Grande não regulamentou ainda porque quem tem que especificar o procedimento é a Câmara Municipal. Também houve a questão do Detran chamar a competência para si, todo esse embate. Mas precisamos saber formalmente como se vai fazer, como será cobrado e quem o fará para que essa regulamentação entre em vigor, e isso cabe à Câmara Municipal.
Por causa da falta da iniciativa das prefeituras em decidir assumir o emplacamento das cinquentinhas, os órgãos de fiscalização de trânsito estaduais começaram a abordar os condutores desses veículos e, ao flagrá-los sem habilitação, equipamentos de segurança ou em motos sem condições de dirigibilidade, passaram a apreender os veículos. Segundo o Detran, em todo o Estado há pelo menos 3 mil cinquentinhas apreendidas, mas depois que os proprietários pagam os custos do depósito do Detran, esses veículos voltam novamente às ruas.
Para o diretor de operações do Detran, Orlando Soares, há um entendimento errôneo a respeito do não emplacamento desses veículos. Muitos deles, inclusive foram comercializados com a propaganda de que não precisa emplacar.
CTB PODE SOFRER ALTERAÇÕES
Ainda conforme o diretor de operações do Detran, Orlando Soares, está tramitando no Congresso Nacional, uma medida provisória que possibilita uma mudança no CTB, transferindo a responsabilidade de regulamentação dos veículos até 50 cc, do município para o Estado. “Estamos com muita esperança de que essa alteração seja feita, pois o Detran terá plenos poderes e condições para colocar a exigência em vigor e isso valerá em todo o país".
Sobre os custos para os proprietários desse tipo de veículo, que são criticados por serem altos em relação ao valor do bem, o diretor informou que com relação a essa regularização, o governo verá com bons olhos, como uma melhoria benéfica para o Estado, e não como uma medida lucrativa.
O QUE DIZ O CÓDIGO DE TRANSITO BRASILEIRO (CTB) LEI 9.503/1997
Art. 24 Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição:
XVII – registrar e licenciar, na forma da legislação, ciclomotores (50 CC), veículos de tração e propulsão humana e de tração animal, fiscalizando, autuando, aplicando penalidades e arrecadando multas decorrentes de infrações;
Art. 25. Os órgãos e entidades executivos do Sistema Nacional de Trânsito poderão celebrar convênio delegando as atividades previstas neste Código, com vistas à maior eficiência e à segurança para os usuários da via.
FONTE: Código de Trânsito Brasileiro (CTB)
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