VIDA URBANA
Crianças ‘pagam’ pelos crimes das mães em presídios
Por conta da sentença atribuída a sua mãe, está sendo privado de levar uma vida comum a outras crianças de sua idade.
Publicado em 04/10/2009 às 9:18
Jacqueline Santos
Do Jornal da Paraíba
Ao ouvir a voz do agente o chamando com carinho, o pequeno João (nome fictício) corre apenas quando vê que o rapaz tem um celular nas mãos. Com um andar meio trôpego, a criança de um ano e três meses olha o aparelho e se esforça para pegá-lo. Coloca as pernas e as mãos entre as brechas da grade como uma tentativa não só de ficar mais perto do objeto, mas num gesto apelativo para sair daquele lugar. João, assim como outros bebês, vive enclausurado, ‘pagando’ pelos crimes que a mãe cometeu. Ele é o mais velho das 15 crianças que estão no Centro de Reeducação Feminina Maria Júlia Maranhão, antigo presídio Bom Pastor, em Mangabeira, na capital.
Desde que deixou a maternidade, ele se apoia na companhia de Cláudia (nome fictício), acusada de homicídio que ainda não foi julgada e passa os dias em uma cela da penitenciária. Sem saber falar e andando ainda com dificuldade, João não conhece o mundo lá fora. Por conta da sentença atribuída a sua mãe, está sendo privado de levar uma vida comum a outras crianças de sua idade. “As mães foram sentenciadas. As crianças também terão que ser? É justo? Tem que haver uma saída, mas nem sempre é fácil de encontrar o melhor caminho para esses pequenos”, diz a assistente social Priscila Capistrano, que acompanha o dilema de crianças nessa situação.
Sem qualquer atividade, o cotidiano do menino é igual ao das apenadas. Só fica parcialmente livre quatro horas por dia, tempo destinado ao banho de sol, e pode então correr no pátio do presídio rodeado por muros altos. Nada de diversão ou contato com outras crianças. O sorriso aberto no rosto quando vê os funcionários do presídio mostra a ingenuidade do garoto.
A dura realidade vivenciada na penitenciária segue os passos de João, apesar de ele não ter noção do que está se passando ao seu redor, nem muito menos se preocupar com o que vai acontecer nos próximos minutos. A inocência não permite que a criança compreenda o que representa aquele cenário. Mesmo assim, não o isenta de sofrer as consequências que deveriam ser sentidas somente pela mãe.
Os dois dividem o pouco espaço com mais algumas mulheres grávidas em uma ala destinada às gestantes. “Nascer já dentro do presídio é um início de vida inaceitável. Quais as referências que essa criança vai ter? Já amarga o sofrimento de estar ali, num lugar de penalidades, um ambiente inapropriado para qualquer pessoa. Imagina a uma criança?”, analisa a psicóloga Maria das Graças Batista. “Embora passe poucos meses na penitenciária, a marca que fica no bebê é muito forte e vai o acompanhar para o resto da vida. É preciso trabalhar bem para que os reflexos sejam mínimos”, acrescenta o conselheiro tutelar Sérgio Lucena.
João nunca teve a oportunidade de deixar os portões da penitenciária e não imagina que seu futuro esteja tão incerto. Com o pai e os avôs sem condições financeiras para abrigá-lo, ele está prestes a ser encaminhado para um orfanato. O período de amamentação, em que o filho está autorizado a ficar na companhia da mãe garantido por lei é estimado em um ano de vida, acabou e a qualquer momento a direção do presídio terá que afastá-lo da mãe.
Segundo a diretora do Centro de Reeducação Feminina, Susana Lima dos Santos, nos últimos seis meses nenhuma criança foi desligada dos braços da mãe. “Ao contrário, tivemos que chamar quatro crianças, já que eram bebês e precisavam de amamentação”, afirma. Das 15 apenadas que estão com filho, a permanência deve perdurar por pelo menos um ano. “Existem casos em que o pai também está preso e a gente conversa com as mães dizendo que vai chegar uma idade em que as crianças precisarão ir para um orfanato, até que elas tenham condições de reaver a guarda. Há um trabalho psicológico específico nessas situações”, explica.
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