VIDA URBANA
Direitos Humanos constata superlotação no Lar do Garoto
Unidade tem capacidade para 50 vagas, mas abrigaria 153 jovens.
Publicado em 17/06/2016 às 15:25
O local é cercado de mato e lixo. Está em área rural, distante da cidade, e o acesso é apenas por estradas de barro sem qualquer placa indicando o caminho. Não há transporte coletivo para chegar até lá. É lugar de segregação. Dentro de seus muros, 153 jovens se espremem em celas. Todas as celas estão abarrotadas de jovens. O local se chama Lar do Garoto e recebeu em maio deste ano a visita do Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba (CEDH-PB). O relatório da visita foi divulgado nesta sexta-feira (17), pelo CEDH-PB, do qual o Ministério Público Federal é órgão integrante. Na última quinta (16), o Lar do Garoto foi alvo de uma denúncia de um interno, que afirmou ter sido estuprado dentro da unidade.
O Lar do Garoto Padre Otávio dos Santos é uma unidade de internação de adolescentes em conflito com a lei, localizada no Município de Lagoa Seca (PB), a 140 km da capital. O local tem apenas 50 vagas, mas os integrantes do CEDH constataram que há 43 adolescentes em internação provisória e 110 na internação final. Também constataram que a internação provisória e a final funcionam no mesmo espaço.
Conforme o relatório do Conselho, a superlotação é tal que em uma das celas – “não dá para falar de quartos”, havia 13 adolescentes e das quatro salas de aula existentes na unidade, duas são usadas para abrigar os internos. As aulas não duram mais que uma hora e meia e não são oferecidas todos os dias.
O CEDH também constatou que nas celas da internação provisória não há banheiro. De acordo com o relatório, "os adolescentes urinam em garrafas pet e tomam banho em um pátio, usando água recolhida em tambores". Os conselheiros encontraram adolescentes que estariam nessas celas há mais de 45 dias. Ouviram de alguns que já estariam há meses na internação provisória.
O acesso dos jovens internos à água corrente é, em média, de apenas 30 minutos por dia e nesse curto tempo eles têm que tomar banho, lavar a roupa e limpar a cela. A unidade tem refeitório e cozinha, mas não são utilizados por falta de recursos humanos. Até os agentes da unidade de internação padecem com as condições precárias e desumanas. Não possuem espaços próprios, deixam seus pertences numa mesa do auditório e almoçam ali mesmo. A única geladeira da unidade estava completamente tomada pela ferrugem.
Conforme o CEDH, os agentes disseram que não têm direito ao horário de almoço, mas “preferem ficar em silêncio, por medo de perder o emprego”. São funcionários terceirizados e ganham um salário mínimo, acrescido de gratificações, chegando a um total de R$ 1.200,00. Todos trabalham em plantões de 12h por 36h e alguns mais antigos relataram que passaram por sete empresas, sendo, em média, uma por ano.
Revista vexatória
Os adolescentes relataram aos conselheiros que todos os visitantes são submetidos à revista vexatória. As mulheres tiram a roupa e fazem flexões. Não existe na unidade nenhum equipamento de revista, exceto alguns detectores manuais.
Espaços de pesadelo
Os conselheiros também constataram a existência de "celas de reflexão", onde são recolhidos, por cinco dias, para uma triagem, todos os adolescentes que entram na internação. As celas também são usadas para penalizar adolescentes que cometem infrações na unidade e nelas ficam recolhidos os jovens que têm dificuldades de convívio com os demais. Conforme o relatório da visita, as "celas de reflexão" são "espaços de pesadelo, pois não têm ventilação nem luminosidade adequadas".
Cópias do relatório da visita serão enviadas para a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Governo do Estado da Paraíba e Fundação Estadual da Criança e do Adolescente (Fundac).
A reportagem do JORNAL DA PARAÍBA entrou em contato com a diretora do Lar do Garoto, para repercutir o relatório do Conselho, contudo o telefone dela estava desligado ou fora da área de cobertura.
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