VIDA URBANA
Escolas públicas de João Pessoa estão no domínio de facções criminosas
Segundo Promotorias da Infância Infracional e Educação, problema ocorre em 7 bairros da capital.
Publicado em 12/03/2015 às 8:06 | Atualizado em 19/02/2024 às 14:00
Escolas públicas municipais e estaduais de pelo menos sete bairros de João Pessoa estão sofrendo com a violência dentro das unidades de ensino praticadas por estudantes das facções criminosas 'Okaida' e 'Estados Unidos'. Brigas, uso de arma dentro das instituições e até tráfico de drogas são os principais atos ilícitos praticados pelos adolescentes.
A constatação é das Promotorias da Infância Infracional e Educação da capital e aponta ainda que nas escolas onde predomina a criminalidade os professores, alunos e funcionários têm medo de frequentar o local. Prova disto, é o monitoramento feito pela Secretaria de Educação da capital, que através da Guarda Municipal, atua com a ronda escolar em 20 unidades de ensino da rede, localizadas nas áreas mais vulneráveis.
A informação também é confirmada pelo Sindicato dos Professores das Escolas Estaduais. Segundo o presidente da entidade, Antônio Arruda, "os docentes dizem que veem os alunos usando drogas e denunciam que não podem falar nada, por medo", afirmou.
Segundo a promotora da Infância Infracional, Ivete Arruda, a disputa entre gangues e os atos infracionais cometidos por adolescentes matriculados nos colégios públicos acontecem em escolas localizadas em Mandacaru, Padre Zé, Valentina, Ilha do Bispo, Alto do Mateus, Colinas do Sul e Funcionários II.
No bairro do Padre Zé, a escola municipal Hugo Moura é uma das unidades de ensino identificadas pelo Ministério Público Estadual (MPPB). A presença de adolescentes envolvidos na criminalidade vai além das pichações nas paredes com a sigla 'OKD', que faz referência à facção 'Okaida', e está também no semblante de preocupação de quem mora ao lado do colégio e convive com a violência.
“Dentro dessa escola é briga direto, porque têm os meninos do grupo rival. São meninos e meninas com menos de 15 anos. Um dia desses, três meninas se juntaram para bater em outra”, disse a estudante Valesca Kerley da Silva.
Na Ilha do Bispo, na escola estadual Raul Machado, o domínio é dos 'Estados Unidos', segundo a vizinhança. Brigas entre alunos e suspeita de tráfico dentro e nos arredores da escola são os principais problemas apontados pelos moradores.
“No ano passado, uma menina quase foi assassinada quando saiu da escola por outras da mesma turma. Vi tudo daqui, ela foi esfaqueada, sem contar nos palavrões. Não sei como os professores conseguem trabalhar”, lembra a dona de casa Célia França.
PATRULHA ESCOLAR
Em 2014, a Promotoria solicitou às Secretarias de Educação do Estado e de João Pessoa a instalação de câmeras, detectores de metal e o retorno da Patrulha Escolar, que era realizada pela Polícia Militar (PM). “Sei que foram colocadas câmeras em algumas escolas, mas os detectores de metal e a volta da Patrulha Escolar não aconteceram”, lamentou a promotora.
E foi o pedido do retorno do projeto, desativado em 2013 pela PM, a solicitação mais reclamada pelo MPPB. Segundo a promotora de Educação da capital, Ana Raquel de Brito, em uma audiência realizada na semana passada com representantes da Secretaria Estadual de Educação (SEE), a pasta se manteve resistente em reativar o trabalho da patrulha, e ação civil pública movida contra o governo do Estado para retomar o serviço continua em tramitação. Ela reforçou ainda que os casos de violência nas escolas e envolvimento dos adolescentes com facções é constante.
“A segurança está precária e nosso pedido de reativação da Patrulha Escolar, que era um serviço especializado da Polícia Militar e trabalhava a prevenção, não foi atendido. Nós sabemos que há o trabalho da Guarda Municipal de João Pessoa com a ronda escolar. Mas a segurança pública é responsabilidade do Estado”, criticou Ana Raquel de Brito.
A promotora da Educação lembrou ainda que os casos de violência e tráfico acontecem dentro das escolas e também nos arredores dos colégios públicos. “Nós sabemos que há alunos que entram com armas nas escolas, com drogas. Mas a violência também é grande nos arredores. Então, o trabalho da Patrulha Escolar era justamente esse da prevenção, da conscientização dos alunos. As câmeras e detectores de metal são importantes, mas humanização na educação também”, destacou.
ALUNOS E PROFESSORES DE CG TÊM MEDO
Em Campina Grande, a violência nos bairros nas zonas de risco da cidade ultrapassa os muros das escolas e chega a amedrontar professores e alunos. Mesmo sem registro de casos relacionados ao tráfico de drogas e à atuação de gangues no interior das instituições, a Promotoria de Defesa dos Direitos da Educação do Ministério Público da Paraíba (MPPB) reconhece a problemática vivida pelas crianças e adolescentes dessas comunidades e promove campanhas de prevenção e combate às drogas no âmbito educacional.
Das 179 escolas públicas de Campina Grande, cerca de 80% estão localizadas em zonas de risco. Situadas no entorno de bairros como Pedregal, Jeremias, Glória, Três Irmãs, Médici, Bairros das Cidades, Continental, Malvinas, Bodocongó, Mutirão e José Pinheiro, onde há grande atuação de traficantes e de conflitos entre gangues rivais, toda precaução é válida, pois muitas vezes o problema é mascarado.
“O problema das drogas é mais sutil, que acontece de forma dissimulada”, disse o promotor Guilherme Câmara. Segundo ele, o mapeamento dessa realidade é difícil de se fazer, pois acontece de forma muito pontual. “Não foi documentado na promotoria nenhum caso de tráfico e consumo interno de drogas”, complementou. Ainda segundo o promotor, mesmo que a atuação do Ministério Público não tenha abrangência em relação à violência que acontece fora das instituições de ensino, é notório que a comunidade escolar vive temerosa. Ele relatou declarações de professores e até mesmo de gestores que têm receio de punir alunos e sofrer represálias.
Na Escola Monte Carmelo, no bairro do Pedregal, zona de grande tráfico e onde há uma rixa histórica entre as gangues Peixeiros e Ratos, os alunos não relatam uso de ilícitos no interior da instituição, no entanto sentem medo de que algo possa acontecer. “Eu tenho medo, o muro da escola é baixo, então dá pra alguém pular. Mas eu nunca vi nada de ruim aqui, só quando o menino morreu aí na frente”, contou a aluna Stephany Vitória de 11 anos.
O caso que a aluna cita ocorreu no ano passado, quando um adolescente de 14 anos foi assassinado em frente à escola Monte Carmelo. A vítima não estudava na unidade, mas o crime, motivado por briga entre gangues do bairro, amedrontou os estudantes e funcionários da escola. A professora de Educação Física Ticiane Moura admite que tem medo de trabalhar na área. “Casos de tráfico aqui dentro da escola não sabemos, mas existe a preocupação por causa da violência. Qualquer confusão ou briga entre alunos a gente já fica preocupado”, relatou.
A secretária de Educação do município de Campina Grande, Iolanda Barbosa, informou que os vigilantes passam anualmente por uma formação, que os capacitam para observar detalhadamente a entrada e recreio dos alunos de forma a prevenir a incursão de algum ilícito. (Andreia Xavier)
PROJETO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Segundo o promotor de defesa dos direitos da educação, Guilherme Câmara, o Ministério Público está desenvolvendo o projeto “Todos Contra as Drogas”, que vai acontecer em âmbito estadual e tem o objetivo de investir e formatar ações de prevenção contra as drogas na Paraíba, sob a coordenação dos Centros de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça (Caops) da Educação, Cidadania e Criança e Adolescente. Ele destacou ainda a importância do Programa de Erradicação e Resistência às Drogas (Proerd), da Polícia Militar.
Outro importante instrumento de prevenção e combate às drogas e à violência dentro das instituições de ensino destacado pelo promotor foi a Patrulha Escolar, da Polícia Militar. Segundo ele, como a especialização está desativada há mais de um ano, foi recomendado à PM que reativasse as guarnições da Patrulha Escolar, que é capacitada para mediar conflitos e atuar preventivamente.
O comandante do 2º Batalhão de Polícia Militar (2º BPM), major Gilberto Felipe, explicou que uma equipe já foi designada, sob comando da tenente Mônica Araújo, para estreitar laços com os diretores das instituições de ensino e coibir atos criminosos no ambiente escolar. “A Patrulha Escolar estava funcionando de forma precária e com poucas viaturas. Agora a tenente irá fiscalizar o patrulhamento e conversar com os representantes das escolas para entender suas necessidades com relação a segurança”, contou. Ainda segundo o major, algumas escolas já foram visitadas pela equipe.
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