VIDA URBANA
Parque do lixão não saiu do papel
Quase 9 anos após a desativação, o terreno que deveria ser área de preservação ambiental, permanece cercado de sujeira.
Publicado em 08/07/2012 às 16:00
Coberta por uma manta rosa, a pequena Raiana dormia enquanto era trazida, nos braços, pela mãe. Com apenas dois dias de vida, a menina chegava da maternidade e era levada, a passos lentos, para um casebre feito de papel e madeira. Nova moradora da área onde funcionava o antigo lixão do Róger, a criança é a prova viva de um projeto que não saiu totalmente do papel.
Desativado em 2003, o lixão do Róger deveria ter sido substituído por um parque, com a presença de árvores e outros tipos de vegetação. O terreno, que possui 17 hectares, teria que se transformar numa área de preservação ambiental, onde o verde cobrisse a cor escura deixada pelo lixo. No entanto, passados quase nove anos, a imagem do local ainda está longe de ser igual à de um parque.
Apesar de não receber mais lixo e ser cercado por um muro de quase três metros de altura, o terreno permanece cercado por sujeira. Mato, esgoto a céu aberto e insetos dividem o mesmo espaço com famílias carentes que voltaram a ocupar a área, após a desativação do lixão. Elas entraram na área por uma fenda, aberta no muro.
Já são mais de 50 casebres construídos, um ao lado do outro. Todos, sem nenhuma condição mínima de segurança.
Abastecidos por ligações clandestinas de água e de luz, os barracos foram feitos com lata, papelão, pedaços de tábua e outros materiais retirados do lixo. Precárias, as construções não impedem a entrada da água e as moradias são inundadas a cada período chuvoso.
Os moradores, desempregados, vivem exclusivamente de programas sociais, como o Bolsa Família, e da coleta de resíduo reciclável, que é feito nas ruas. “Ganho R$ 200 com a reciclagem.
A minha mulher recebe outros R$ 100 do Bolsa Família e assim a gente vai vivendo. Não dá para pagar aluguel, não”, lamenta Raimundo dos Santos, pai da pequena Raiana.
“Até para trazer a menina da maternidade, tive que arrumar dinheiro emprestado. Essa roupinha aí que ela 'tá' usando é a única que ela tem. É muito sofrimento”, desabafa.
Raiana é a sexta filha da dona de casa Maria das Graças da Silva e a quarta criança da família que nasceu após a mudança para o local do antigo lixão.
Com 29 anos, a jovem conta que veio morar no local há seis anos. Ao lado dela outras 100 pessoas, a maioria crianças, também habitam no ambiente e dividem o mesmo sofrimento. As crianças, descalças, são vítimas de doenças de pele. Muitas estão com feridas abertas nos pés e pernas. A única esperança de uma vida melhor vem da escola, para onde as crianças vão todos os dias, apesar das dificuldades.
“Para a gente, nada mudou. Ou melhor, acho que piorou. Quando existia o lixão aqui, pelo menos, a gente tinha o que catar e do que viver. Agora, nem isso existe mais. Temos que sair às ruas, coletando material reciclável para poder viver”, conta Lindinalva da Conceição, que tem 60 anos de idade e nunca trabalhou de carteira assinada. “Sempre vivi do que retirava do lixo”, afirma.
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