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VIDA URBANA

'Perseguição política aniquilou minha vida', diz venezuelano refugiado na PB

Reportagem conversou com jovem ativo politicamente no país, que vive na Paraíba.

Publicado em 27/01/2020 às 8:00 | Atualizado em 07/05/2024 às 23:46


                                        
                                            'Perseguição política aniquilou minha vida', diz  venezuelano refugiado na PB
Foto: Arquivo Pessoal / Alexander Moreno

Em meio ao caos político, social e econômico instaurado na Venezuela, o refúgio no Brasil tem se tornado sinônimo de paz para quem não consegue conviver com a realidade do país de origem. No entanto, ao contrário do que manda a lógica de rota da fronteira entre os dois países, a Paraíba, localizada há cerca de 3 mil quilômetros do estado de Roraima, por onde entram a maioria dos venezuelanos, também tem abrigado essas pessoas há cerca de três anos.

Na última quinta-feira (23) o líder opositor da Venezuela, considerado o presidente interino do país, comemorou um ano de governo com um discurso realizado no palco principal do Fórum Econômico de Davos. Na ocasião, Juán Guaidó pediu pela reintegração de seu país ao mundo, um desejo comum entre os cerca de 4 milhões de venezuelanos refugiados, principalmente, no Brasil.

De acordo com a coordenadoria da Pastoral que administra a Casa do Migrante no município do Conde, no Litoral Sul da Paraíba, são cerca de 230 refugiados vivendo na região metropolitana de João Pessoa desde 2017. Já em Campina Grande, conforme informações da organização da Fazenda do Sol, que também recebe refugiados venezuelanos há três anos, são cerca de 20 pessoas em situação de refúgio na Rainha da Borborema e em municípios circunvizinhos.

Apesar do balanço quantitativo das instituições responsáveis pelo recebimento dos venezuelanos na Paraíba, os números oscilam à medida em que chegam novos refugiados. A cidade de Campina Grande, por exemplo, recebeu um mulher venezuelana em situação de refúgio, no último dia 14 de janeiro. Nesse caso específico, de acordo com a coordenadoria da Fazenda do Sol, a mulher veio ao encontro de um irmão que já mora na Paraíba há algum tempo. Mas ela não é a única que uniu a família em busca do sonho de viver melhor em território paraibano. O JORNAL DA PARAÍBA conversou com um deles.

Recomeço


				
					'Perseguição política aniquilou minha vida', diz  venezuelano refugiado na PB
Intervalo de aulas na faculdade em Caracas, na Venezuela. Foto: Arquivo Pessoal/Alexander Moreno. Foto: Arquivo Pessoal / Alexander Moreno

"Comecei a tentar tudo de novo na Paraíba, e me sinto um menino". Assim define Alexander Moreno é um jovem de 22 anos que, assim como vários outros, divide a rotina entre atividades domésticas, trabalho e estudos em sua nova morada. Venezuelano, desde 2017 - quando viu de perto o 'boom' da crise na Venezuela e chegou ao Brasil acompanhado de sua mãe em busca de melhorias de vida - mora em Lagoa Seca, município localizado há cerca de 9 km de Campina Grande, no Agreste da Paraíba.

Na Venezuela, o estudante de Direito de uma das melhores instituições de ensino superior do país, a Universidade Católica Andrés Bello, participava ativamente de manifestações políticas em prol da liberdade governamental, juntamente com sua família, formada majoritariamente por profissionais ligados à advocacia. Por conta disso, o jovem chegou a ser acusado pelo Suprema Corte do país pelos crimes de traição à pátria, desordem pública e terrorismo ao estado, com sentença pré-determinada em trinta anos de prisão.

Por esconder o filho em casa, Tati Moreno, mãe de Alexander, passou a ser considerada cúmplice de terrorista e também se tornou alvo de perseguição, além de passar a ser fugitiva perante a justiça ditatorial venezuelana. Foi nesse momento, quando a família precisou de ajuda judicial para evitar o pior, que o Brasil se tornou uma opção. Alexander afirma que lutou pela Venezuela até o último segundo em que esteve no país.

“Perdi um período de universidade lutando pela liberdade do país em manifestações. Depois de ser notificado pela Suprema Corte Venezuelana, fugi de casa por uma semana, dentro da área metropolitana. Voltei e continuei a ir às manifestações normalmente, mas quando me apresentei aos advogados e eles me orientaram à vir para o Brasil. Foi quando decidi vir”, explicou Alexander.


				
					'Perseguição política aniquilou minha vida', diz  venezuelano refugiado na PB
Jantar de despedida da família na Venezuela, em 2017. Foto: Arquivo Pessoal/Alexander Moreno. Foto: Arquivo Pessoal / Alexander Moreno

Para chegar ao Brasil, mãe e filho precisaram passar pelo Equador. No país vizinho, enfrentaram a consequência da xenofobia em empregos que pagam menos a venezuelanos apenas por serem venezuelanos, e após cinco meses, conseguiram refúgio no Brasil por meio da ajuda humanitária da Organização das Nações Unidas (ONU). Ainda sem compreender por quais rumos seus caminhos trilhariam dali em diante, Alexander e sua mãe voaram com destino à Paraíba, e ao chegar no estado, encontraram a possibilidade de recomeçar.

"Minha vida mudou muito. Eu era um jovem com inspirações, sonhos, com um sentido para a vida... Já tinha um trabalho, um futuro político, uma caminhada feita, e tudo acabou. A situação econômica piorou, a pressão social aumentou, e a perseguição política aniquilou minha vida. É quando chego ao Brasil. Começo a tentar tudo de novo e me sinto uma criança, um menino que acaba de nascer com conhecimento para não errar como cidadão", comenta Alexander.

Em Lagoa Seca o jovem encontrou fé para recomeçar no Convento Ipuarana, onde reside com sua mãe até hoje. Um dos recomeços, e talvez o mais importante segundo ele, era retomar a luta pelo sonho de ser advogado. Em Caracas, onde morava na Venezuela, Alexander havia cursado cinco períodos da graduação, mas quando chegou ao Brasil não pode dar continuidade à grade curricular do curso, e devido a problemas burocráticos, precisou voltar ao início. Mas isso não foi problema.

Após meses de ansiedade, o jovem conseguiu uma bolsa de estudos em uma faculdade particular de Campina Grande, onde cursa Direto, e agora, segundo ele, já é possível afirmar que o sonho continua. "Estou muito mais forte. No futuro quero ser um advogado por excelência, ter minha titulação válida em advocacia, fazer de tudo para ressurgir aqui, no Brasil. Sonho em ter minha estabilidade, quase, como ou melhor que a que tinha na Venezuela. E depois, quero voltar ao meu país.", afirma.

Mesmo com as dificuldades da rotina agitada aqui no Brasil, Alexander também sonha com a possibilidade de voltar à Venezuela. Para ele, o momento político, social e econômico que seu país vive tem refletido diretamente em sua vida, ainda que distante fisicamente, pois a aflição de saber que as demais pessoas de sua família permanecem inseridos numa "realidade de medo", continua.

"Agora, depois da tomada da Assembleia Nacional, a situação ficou ainda mais difícil. Me comunico com meus parentes por Skype, mas é complicado. É uma realidade muito complicada. Aqui no Brasil é difícil... Sinto dificuldade no idioma, na gastronomia, no convívio social. Mas lá, na Venezuela, a situação é muito mais delicada. Mas minha esperança nunca morre, porque um bom filho sempre volta a sua casa", conclui.

Sob supervisão de Jhonathan Oliveira*

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