CULTURA
110 anos do 'Eu': poetas paraibanos declamam Augusto dos Anjos
Neste mês de junho, a obra única do poeta completa 110 anos da primeira publicação; artistas paraibanos declamam seus versos em homenagem.
Publicado em 30/06/2022 às 6:46 | Atualizado em 30/06/2022 às 11:49
A obra única de Augusto dos Anjos, ‘Eu’, completa 110 anos neste mês de junho. Publicado pela primeira vez em 1912, o livro provocou estranheza “por romper com o código literário vigente no fim do século XIX”, uma vez que é “recheado de vocábulos ora vinculados ao domínio da ciência, ora pertencentes ao registro coloquial”, como afirma o professor e escritor Chico Viana, que possui estudo sobre a obra do poeta. A convite do JORNAL DA PARAÍBA, artistas paraibanos declamam Augusto dos Anjos em homenagem.
Há 110 anos, vinha a público um dos livros mais estranhos da literatura brasileira. Seu título? “Eu”. Seu autor? Um paraibano magro, nascido em engenho de cana-de-açúcar, que tinha no magistério o seu ofício e na poesia o meio de traduzir as obsessões que lhe tumultuavam o espírito”, Chico Viana.
Para Chico Viana, apesar do título que remete à individualidade, ‘Eu’, “já se apontou com muita pertinência que o eu lírico de Augusto dos Anjos é na verdade um Nós. Em seu lamento ecoam o nosso desespero e a nossa perplexidade em face de uma época na qual a ciência põe em xeque as certezas religiosas e obriga o homem a erigir por conta própria uma nova grade de valores morais”.
Poucos livros da nossa literatura afrontam o academicismo e valorizam a dicção popular como o “Eu”
Relação com a psicanálise
“Como 'Eu' abordava a melancolia do poeta paraibano, procurei textos de Freud, Lacan, Julia Kristeva e outros teóricos que trataram do tema”, diz Chico Viana, que utilizou subsídios da teoria psicanalítica em sua tese sobre Augusto dos Anjos, ‘O evangelho da podridão’.
“Chama a atenção no Eu a culpa manifestada pelo eu lírico – uma culpa atávica, ligada a uma primeira transgressão do homem e correspondente no cristianismo ao ‘pecado original’. A culpa, segundo o criador da psicanálise, é um dos componentes essenciais da melancolia, e estudá-la com base em subsídios psicanalíticos me ajudou a interpretar as imagens e avaliar os demais procedimentos retóricos presentes na obra do paraibano”, diz Chico Viana.
Paraibano do século
Em 2001, Augusto dos Anjos foi eleito, por votação popular, o paraibano do século XX. “A atribuição de “Paraibano do Século” após uma consulta popular, na qual constava o nome de renomados políticos e de outros escritores de peso, demonstra o reconhecimento que a Paraíba lhe tributa”, diz Chico Viana, para quem isso não teria acontecido “se o poeta não concorresse para divulgar a imagem do estado, chamando a atenção do Brasil para aspectos da nossa história e da nossa geografia. E, sobretudo, despertando o interesse pelo espaço onde brotou uma voz poética tão original”.
“A Paraíba o ama e admira, mas não acho que tenha um verdadeiro conhecimento da obra. O grosso dos leitores é mais sensível a aspectos de superfície, como o vocabulário esdrúxulo – advindo em boa parte da ciência e da filosofia que o poeta absorveu na Faculdade de Direito do Recife – e a musicalidade áspera, dissonante, que impressiona a uma primeira leitura ou audição (Augusto é sobretudo um poeta para ser ouvido). Sequer sei se há nas escolas do estado projetos que tratem especificamente da sua poesia”, diz Chico Vianna.
Artistas paraibanos recitam Augusto dos Anjos
O JORNAL DA PARAÍBA convidou artistas para homenagear o poeta paraibano através da récita de seus poemas (Confira abaixo). São nove poemas como 'Psicologia de um vencido', recitado Por Linaldo Gueges, 'Versos íntimos' por Aline Cardoso e 'Saudade' pela atriz Zezita Matos.
Aline Cardoso recita ‘Versos íntimos’
Aline Cardoso é escritora, autora de ‘A proporção áurea do caos’(2019; ‘Harpia’(2020); ‘Ritos encantatórios & outras ladainhas’(2021) e ‘Meu coração é uma cômoda de muitas gavetas’ (no prelo). Fundadora da Editora Triluna, criou o projeto nacional Lua Negra, focado na publicação de poesia escrita por pessoas pretas plurais. Produtora do Sarau Selváticas, desde 2017. Ateia molotov’s líricos em forma de lambes nas ruas por onde passa, assina o perfil: @linhanegra; é Mãe solo, Professora, Mestra em linguística, Arteterapeuta e Gestora Cultural.
Anna Apolinário recita ‘Meretriz’
Anna Apolinário é natural de João Pessoa. Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal da Paraíba, Mestranda em Letras ( Poéticas da Subjetividade - PPGL/UFPB) escritora, poeta, produtora cultural independente, organizadora do Sarau Selváticas, co-fundadora da Cia Quimera - Teatro & Poesia.
Autora dos livros Solfejo de Eros (CBJE, 2010), Mistrais (Prêmio Literário Augusto dos Anjos - Funesc, 2014), Zarabatana (Patuá, 2016), Magmáticas Medusas (Cintra/Arc Edições, 2018), Las Máscaras del Aire - Poema colectivo (Cintra/Arc Edições, 2020), A Chave Selvagem do Sonho ( Triluna, 2020), Furor de Máscaras – Poemas automáticos bilíngues em coautoria com Floriano Martins (Cintra/Arc Edições, 2021). É autora contemplada na categoria poesia do Prêmio Políbio Alves de Literatura (Funjope, 2021) com a obra Bruxas sussurram meu nome.
Cris Estevão recita ‘Solitário’
Nascida em João Pessoa, Cris Estevão é formada em Letras pela UFPB. Ao longo de doze anos, atua na área da educação e, no momento, divide-se entre cidades como Guarabira, Conde e a capital do estado. Professora, poeta e arte-educadora participou de editais da Funjope que forneciam oficinas culturais nos bairros, como contadora de histórias e coletora/editora de narrativas produzidas por crianças em situação de vulnerabilidade social.
Além disso, integrou diversas antologias poéticas brasileiras, como Prêmio Poematize, Senhoras Obscenas e Agenda da Tribos e a Latino-americana- Nós da Poesia. Lançou seu primeiro livro, Morrerá em cada esquina do seu corpo uma pessoa só, em 2016 e desde então é convidada regularmente para facilitar oficinas literárias e participar de saraus, debates, feiras e mesas que envolvem o universo da literatura. Atualmente, está no processo criativo do seu segundo livro, sem previsão ainda para lançamento.
Débora Gil Pantaleão recita ‘À mesa’
Débora Gil Pantaleão é escritora, psicanalista e professora substituta do Departamento de Letras Estrangeiras Modernas (DLEM) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Igor Gregório recita ‘Morcego’
Igor Gregório, 35 anos. Poeta paraibano que realiza toda sua produção a partir das raízes do Romanceiro Nordestino.
Jennifer Trajano recita ‘Vandalismo’
Natural de João Pessoa, Jennifer Trajano é autora dos livros "Latíbulos" (Escaleras, 2019) e "Diga aos brancos que não vou" (Urutau, 2021), mestra em Letras (literatura) pela Universidade Federal da Paraíba, professora de língua portuguesa e revisora textual.
Linaldo Guedes recita ‘Psicologia de um vencido’
Linaldo Guedes é jornalista, poeta e editor. Tem 11 livros publicados, sendo quatro de poesia. É mestre em Ciências da Religião, pela UFPB, e membro da Academia Cajazeirense de Artes e Letras ( Acal). Reside em Cajazeiras.
Natália Luna recita 'Sonetos ao pai I e II'
Natália Luna é natural de João Pessoa. Formada em Filosofia pela Unicamp, autora do livro Íntimo Exílio pela editora Urutau (2019), atualmente trabalha com um ateliê de costura de roupas autorais e de fibras naturais, e está na produção de seu segundo livro de poesia cujo título se chama Rumina.
Zezita Matos recita ‘Saudade’
Severina de Souza Pontes, mais conhecida como Zezita de Matos, é uma atriz e professora brasileira, que ganhou destaque por seus trabalhos no cinema, como Laura em Mãe e Filha, Das Dores em A História da Eternidade e Tereza em Deserto Particular.
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