CULTURA
Aluísio Azevedo vai muito além do vestibular
No centenário de morte de Aluísio Azevedo, obra do escritor maranhense sofre com o didatismo preconceituoso dos educadores.
Publicado em 20/01/2013 às 8:00
Leitura obrigatória entre os vestibulandos (Casa de Pensão estava entre as obras indicadas pela Coperve para o PSS de 2012), Aluísio Azevedo (1857-1913) é um desses autores seminais da literatura nacional que, como Raul Pompeia ou Camilo Castelo Branco, frequentam as mesas de estudo dos jovens por algum tempo para jamais tornarem a ser lidos fora das escolas ou mesmo dentro das faculdades de Letras.
Amanhã, o centenário de morte do introdutor do romance naturalista no Brasil não será lembrado por reedições de seus livros (todos em domínio público há pelo menos 50 anos) ou pelo lançamento de biografias e revisões críticas de sua obra.
Será um centenário, literalmente, morto, algo bem distante da reputação conquistada pelo maranhense que, ao publicar O Mulato (1831), seu segundo romance, foi aplaudido pela Corte e era um dos poucos escritores que ganhavam o pão exclusivamente de sua pena (ainda que somente o pão, já que, desde sempre, como diria o crítico Valentim Magalhães, as letras no Brasil nunca deram para a manteiga).
"Os vestibulares escolhem Aluísio Azevedo pela sua representatividade literária e enfatizam a necessidade de lê-lo, o que gera um certo olhar de esguelha em algumas pessoas depois", opina o professor Chico Viana.
Segundo o colunista do JORNAL DA PARAÍBA, esta sensação de 'tarefa cumprida' que acomete alguns leitores depois de passar os olhos pelas páginas de romances como O Cortiço (1890), por exemplo, impede a maioria de apreciar uma das maiores obras-primas de nossa literatura.
"Aluísio Azevedo é um escritor de expressão que tinha uma plasticidade no estilo, uma escrita sensorial que ia além da influência positivista", reflete o professor, que relaciona sua literatura à do contemporâneo Machado da Assis: "Enquanto Machado embarca mais na vertente psicológica dos seus personagens, Azevedo criava personagens modelados de acordo com o ambiente, como João Romão em O Cortiço".
Adaptado para o cinema em 1970, por Francisco Ramalho Jr.
(Canta Maria), O Cortiço é um retrato orgânico dos subúrbios cariocas nos fins do século 19 e tem forte matiz sexual, explorada por Aluísio Azevedo a partir de sua vertente biológica: nas páginas, homens e mulheres são descritos como animais que se reproduzem freneticamente e vivem apinhados uns sobre os outros.
"Costuma-se dizer que o personagem mais importante d'O Cortiço é o próprio cortiço", lembra Chico Viana, que atesta a visão crítica que a prosa de Aluísio Azevedo tinha quanto ao brasileiro, um "indivíduo preguiçoso, que não se dedica ao trabalho e dedica-se aos modismos e à vagabundagem".
Este panorama pouco lisonjeiro dos compatriotas fez dele uma das vítimas prediletas de achincalhamento de educadores armados de um certo didatismo preconceituoso e nocivo.
"As críticas que fazem quanto a Monteiro Lobato e Aluísio Azevedo, quanto a estes aspectos, geralmente são injustas e sem fundamento", acusa Chico Viana, que tem suas ressalvas quanto à fase final da obra do maranhense, quando ele passou a dedicar-se à diplomacia e escreveu romances como O Livro de uma Sogra (1895), um "romance menor", nas palavras do professor.
"Relata-se que, quando Aluísio Azevedo ingressou na diplomacia (em 1895), passou a frequentar mais os banquetes e as mulheres e pasterizou-se um pouco, passando a produzir uma literatura que não tinha mais a preocupação de refletir sobre a realidade", diz ele.
Deixando também uma obra teatral escrita em parceria com o irmão, o jornalista e dramaturgo Artur Azevedo, morreu em Buenos Aires (Argentina), após ter sido um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras (ABL) e um de seus primeiros imortais.
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