CULTURA
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Cantor Vitor Ramil lança seu novo disco 'Foi No Mês Que Vem'; CD duplo vem em luxuosa edição digipack de três abas.
Publicado em 20/06/2013 às 6:00 | Atualizado em 14/04/2023 às 13:48
Quando Vitor Ramil gravou seu primeiro disco, Estrela, Estrela (1981), ele tinha apenas 18 anos. De lá para cá, sua carreira como cantor, compositor, multi-instrumentista e escritor só fez crescer e hoje, aos 51, ele desfruta de um prestigiado lugar na MPB, gravado por nomes como Ney Matogrosso, Gal Costa, Zizi Possi e até mesmo Mercedes Sosa (1935-2009), a grande voz da Argentina.
Esses atributos estão sintetizados em Foi No Mês Que Vem (Satolep, R$ 35,00), CD duplo bancado por financiamento coletivo (o chamado crowdfunding) que celebra a carreira musical de Ramil até aqui.
O disco vem em luxuosa edição digipack de três abas, texto de apresentação e é ilustrado com o impressionante trabalho da artista visual Nara Amélia, uma das novas revelações da arte gaúcha, descoberta por Vitor Ramil em uma coletiva promovida pelo Rumos Itaú Cultural, em São Paulo, no ano passado.
O disco foi bancado, em parte, pelos fãs de Vitor Ramil, através de um crowdfunding arregimentado pela companhia gaúcha Traga Seu Show. Um total de 863 pessoas, de oito países, bancaram um montante de R$ 84.587,00 (de uma estimativa de R$ 60 mil) e custearam pouco mais da metade do orçamento do disco. “Foi o segundo crowdfunding mais bem sucedido do país (o primeiro é o documentário Belo Monte – Anúncio de uma Guerra)”, informa Ramil, em entrevista por telefone.
“Mais importante do que o financiamento, o crowdfunding é a mobilização que o público faz", diz. "Com o envolvimento das pessoas, ele ganha um outro caráter. O disco se torna publico antes mesmo dele acontecer. Publico no sentido em que as pessoas acompanham as gravações através da internet, sugerem músicas... gera uma relação com o disco muito poderosa”.
SONGBOOK
No disco, 32 canções de sua autoria são retrabalhadas nas cordas, em belo disco acústico repleto de participações especiais: Milton Nascimento, Ney Matogrosso, Marcos Suzano, os irmãos mais velhos Kleiton e Kledir, além dos argentinos Fito Paez e Pedro Aznar e do uruguaio Jorge Drexler, entre outros.
O disco sai ao mesmo tempo em que seu Songbook (Belas Letras, R$ 45,00), com a transcrição de 60 composições que traduzem, entre cifras, partituras e afinações, a riqueza de sua obra. Além do mais, boa parte do livro é dedicada a biografia do músico nascido em Pelotas (RS), repleta de fotos, da infância até os dias de hoje.
“A ideia (do CD duplo) nasceu da proposta de fazer um disco que ilustrasse o Songbook, que é uma coisa incomum no Brasil”, comenta. “A proposta original é que fosse um disco de canções de voz e violão, para ficar bem preso às harmonias, às melodias, ao trabalho no violão”, enfatiza.
Mas na época, trabalhando muito com o violonista Carlos Moscardini (que fez Délibáb, de 2010), Vitor Ramil não resistiu a ideia de ter o instrumentista argentino no estúdio, quebrando a proposta solo inicial. “Foi aí que eu pensei em chamar todos os meus colaboradores”, confessa.
SIMÉTRICO
O repertório celebra os quase 30 anos de carreira do músico. Deveria ter saído com 30 faixas, mas ao gravar parte do disco em Buenos Aires (Argentina), descobriu lá um autêntico piano Würilitzer e achou de gravar ‘Noturno’. “Eu compus ‘Nortuno’ num Würilitzer e nem ia gravá-la, para deixar um disco só de violão. Mas quando eu vi aquele Würilitzer, eu achei uma provocação, porque é raro encontrar um”.
De 30, o repertório chegou a 33 canções. Mas, como Vitor confessa, ele é “meio simétrico”, e fechou no par, em 32 canções. Ficou de fora a milonga ‘Semeadura’, parceria dele com o ex-prefeito de Porto Alegre, José Fogaça, regravada com sucesso por Mercedes Sosa. A música pode ser encontrada no site www.vitorramil.com.br.
Com a roupagem suave, o álbum ressalta a bela voz de Vitor, ao lado de suas letras, melancólicas e afinadas com o universo da literatura que o escritor domina bem (é autor de dois livros, Pequod e Satolep, e tem um terceiro a caminho). Entre milongas, tangos, baladas e a MPB sofisticada influenciada pelo Clube da Esquina e Caetano Veloso, Foi No Mês Que Vem sintetiza os múltiplos talentos do gaúcho.
"Este é um trabalho em que eu realizei todas as minhas facetas e tratei que todas elas funcionassem bem. Então eu me preocupei que eu pudesse cantar bem, que o meu violão soasse legal, enfim, tentei dar ao trabalho um acabamento sonoro de qualidade”, explica.
Desnudas, as canções de Vitor Ramil se tornam ainda mais belas. É o caso de alguns de seus sucessos, como ‘Estrela, estrela’ e ‘Loucos de cara’. “O ‘Loucos de cara’ (de Tango, 1987) é uma música que eu gravei com aquele instrumental todo, mas tu vê que não tem violão no arranjo. E o violão é uma coisa que, com o tempo, se colou muito na minha composição”, comenta.
Ramil prossegue: “Há anos eu toco 'Loucos de cara' no show de voz e violão e é um momento muito forte (do show), de muita intimidade com o público. E sempre que eu fazia com banda, tudo bem, é bonito, tem uns solos lindos e tal, mas se dilui a intenção (do arranjo), se dilui a minha expressão. Essa é uma música que há muito tempo eu queria gravar como eu toco nos shows de voz e violão”.
Além de descobrir a força do violão em suas canções, Vitor Ramil conta que também foi descobrindo o magnetismo de sua voz. “Tem discos, como Longes (2004), em que eu experimentei muito com a minha voz. Transformei minha voz, coloquei filtros, fiz coisas que foram legais no período, mas eu acho que as pessoas gostam de ouvir minha voz, meu timbre. Foi uma coisa que eu fui descobrindo com os anos. Tem um menino, no Ceará, que diz que minha voz é um ‘visgo’”.
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