CULTURA
DVD ao vivo registra dobradinha mineira entre Samuel Rosa e Lô Borges
Trabalho reúne músicas dos dois, hits do Skank, clássicos do Clube da Esquina e participações de Milton Nascimento e Fernanda Takai.
Publicado em 10/04/2016 às 7:25
Samuel Rosa, líder do Skank, usava fraldas quando Milton Nascimento encontrou o adolescente Lô Borges na esquina de Santa Tereza, bairro boêmio de Belo Horizonte (MG), e entregou-lhe a carteira de sócio do clube mais famoso da música brasileira. Entre mamadeiras e papinhas, o pequeno Samuel foi alimentado com o clube daquela esquina, que acabou por influenciar a sonoridade de suas canções.
Ambos mineiros, ambos cantores e compositores, Lô Borges e Samuel Rosa escreveram alguns dos maiores hits já feitos na música brasileira. Esse nobre repertório é a parte que reluz em Samuel Rosa & Lô Borges Ao Vivo no Cine Theatro Brasil (Sony Music, R$ 30), DVD que acaba de ser lançado, também disponível em CD.
O encontro celebra uma amizade fraterna e uma parceria frutífera que teve início em 1999, quando Lô e Samuel se conheceram em uma festa em Belo Horizonte, onde moram. Samuel agradeceu ao ídolo por ter gravado, três anos antes, uma versão te ‘Te ver’ (sucesso do segundo disco do Skank, Calango, de 1994), no disco Meu Cinema (1996).
O encontro foi para o palco e, dele, para o estúdio. “Fizemos shows esporádicos com uma banda que nem era a minha, nem era o Skank, com músicas do Clube da Esquina, canções minhas e dele”, comenta um atencioso Lô Borges, por telefone, ao narrar o início da dobradinha mineira.
“Esses shows tiveram desdobramentos. Nós começamos a fazer músicas juntos, nos tornamos parceiros e isso foi fundamental para que nós consolidássemos nossa relação”, avalia o coautor de ‘Trem azul’, uma das canções mais famosas do Clube da Esquina, presente no DVD.
DISCO DE INÉDITAS
As três parcerias de Lô e Samuel constam no repertório de 20 números do show (14 no CD): o mega-hit ‘Dois rios’ (lançado pelo Skank em Cosmotron, de 2003), ‘Horizonte vertical’ (lançada por Lô Borges no álbum de mesmo nome em 2011) e ‘Nenhum segredo’, inédita em estúdio - as duas primeiras têm letra de Nando Reis, enquanto ‘Nenhum segredo' tem a coautoria da escritora Patrícia Maês.
“A gente tem mais cinco ou seis músicas prontas, precisando somente das letras”, revela Lô Borges, sem esconder a vontade de estender a parceria também ao estúdio. “Não está previsto pra gente gravar um álbum de inéditas, mas também não está descartado, já que a gente tem material pra isso. Essas músicas só faltam as letras, porquê o Samuel não é letrista, assim como eu também não sou letrista. Nós somos dois musicistas”.
O filé do repertório do DVD são os grandes sucessos do Clube da Esquina e do Skank, cantados em dueto pelos dois, escudados por uma banda que tem dois músicos que acompanham Lô (o irmão Telo Borges, nos teclados, e o baterista Robson Matos), um músico de apoio do Skank (o guitarrista Doca Rolim) e um amigo de infância de Samuel (o baixista Alexandre Mourão).
Estão lá canções como ‘Te ver’, ‘Resposta’, ‘Sutilmente’ e ‘Amores imperfeitos’ (da cota do Skank), assim como ‘Clube da esquina nº 2’, ‘Quem sabe isso quer dizer amor’, ‘Trem de doido’ e ‘Um girassol da cor do seu cabelo’, do universo de Lô Borges. A combinação arranca aplausos entusiasmados do público.
A mistura é boa como o velho feijão com torresmo e a dupla mostra afinidade no palco. “É um encontro genuíno, de afinidade mesmo”, concorda Lô. “É uma celebração, um encontro de dois artistas de gerações distintas, de estéticas musicais distintas, mas que conseguiram uma unidade num trabalho que mistura a minha música com a música do Samuel. Ele canta com muito prazer as minhas canções, como se ele tivesse sido um dos autores, e eu canto com o mesmo prazer as canções dele, como se eu fosse um dos autores. Essa é coisa mais bacana do DVD”.
A divisão do repertório foi feita a partir das músicas de Lô Borges que Samuel gostava e vice-versa. “A gente chegou a um consenso muito facilmente”, pontua o sócio daquele clube famoso.
“São canções muito da época do Maquinarama (2000), Cosmotron (2003)", comenta Lô, referindo-se ao repertório do Skank. "Nesse momento, as composições do Samuel mudaram bastante em relação ao começo da carreira, repleta de baterias eletrônicas, ligadas ao Skank. Então a gente achou que as músicas do Maquinarama pra frente, dialogavam melhor com a minha música”.
'Milton é meu pai', diz Lô
A cola para os novos arranjos do show Samuel Rosa & Lô Borges Ao vivo no Cine Theatro Brasil foram os Beatles, referência tanto para Lô, quanto para Samuel. “Beatles é uma escola para artistas e bandas do mundo inteiro, e não seria diferente com a gente aqui de Belo Horizonte. Foi sempre algo que ajudou a construir os nossos arranjos, apesar da identidade própria que cada música tem”, admite Lô Borges.
Tão fã dos Beatles que guitarras carregam o sotaque de George Harrison (vide ‘Feira moderna’) e Lô Borges até compôs (com ajuda de Fernando Brant e do irmão Márcio Borges) uma canção chamada ‘Para Lennon e MacCartney’, lançada por Milton Nascimento no disco Milton (1970).
Quarenta anos depois, o próprio Milton subiu ao palco de Lô e Samuel para entoar os versos "Eu sou da América do Sul / Eu sei, vocês não vão saber / Mas agora sou cowboy / Sou do ouro, eu sou vocês / Sou do mundo, sou Minas Gerais", na releitura funkeada que ele vem apresentando.
“Milton é o meu pai!”, exclama Lô Borges. “Eu tava numa esquina de Santa Tereza, ainda adolescente, começando a compor, e ele me levou para gravar o álbum Clube da Esquina (1972). Ele é o cara da minha vida artística, e Milton era uma unanimidade entre a gente”, comenta a respeito da escolha de um dos dois únicos convidados da noite.
A outra convidada é a cantora Fernanda Takai, contemporânea de Samuel e do Skank junto ao Pato Fu. Além de ser próxima a ele, Fernanda se aproximou de Lô Borges no CD Horizonte Vertical, quando o mineiro a convidou para gravar uma faixa e ela acabou por colocar sua voz em quatro. No show, ela canta ‘Balada do amor inabalável’, sucesso do Skank.
O delicioso tutu mineiro musical - que Lô Borges espera colocar na estrada, mas admite a dificuldade em conciliar sua agenda com a de Samuel -, em DVD, ainda rendeu um ótimo bônus: o documentário ‘BH e a Música de Samuel e Lô’. O especial de meia hora foge do making of trivial ao levar os dois mineiros para um passeio pelas esquinas famosas da música mineira.
Recheada de boas histórias narradas por Lô Borges, que aborda filmes, Clube da Esquina e até o grupo de metal Sepultura, parte do lendário cinema onde foi gravado o show, em agosto de 2015. CD e DVD ainda comportam duas músicas inéditas, uma de Samuel e Nando Reis (‘Lampejo’) e outra de Lô e Chico Amaral (‘Dupla chama’).
Comentários