CULTURA
Em busca do Proust perdido
Marcel Proust e a mnomumental jornada Em Busca do Tempo Perdido
Publicado em 18/11/2012 às 8:00
São poucos os que se aventuram com Marcel Proust na sua monumental jornada Em Busca do Tempo Perdido: o próprio autor, que dedicou oito anos de sua vida para escrever os sete volumes da obra, só conseguiu revisar os quatro primeiros, deixando outros três que só vieram a lume depois de sua morte, há exatos 90 anos.
Embrenhar-se No Caminho de Swann é feito elevado não apenas entre os leitores, mas também entre os tradutores. Os que, no Brasil, manejaram a obra entre as décadas de 1940 e 1950 (ninguém menos que os poetas Mário Quintana, Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira), dão uma ideia do refinamento de uma prosa extensa e, acima de tudo, densa.
Densidade que não fica apenas nos romances: no acervo digital da Biblioteca Nacional da França (www.bnf.fr), é possível ter acesso virtual aos manuscritos de Proust onde notas e mais notas estendem-se por páginas caudalosas.
Para desvendar os 75 cadernos rascunhados para compor Em Busca do Tempo Perdido, pesquisadores do Japão, da França e do Brasil trabalharam em um projeto conjunto coordenado pela tataraneta do escritor, Nathalie Mauriac-Dyer.
Um dos primeiros a transcreverem integralmente um destes cadernos foi o professor Guilherme Ignácio da Silva, nas mãos de quem ficou a cargo a organização do projeto da Globo Livros de reeditar os sete volumes de Em Busca do Tempo Perdido (confira os seis já lançados no box).
"Com o objetivo de entender melhor como Proust escrevia, transcrevi inteiramente o caderno de número 28", explicou Ignácio da Silva ao JORNAL DA PARAÍBA. "Proust escrevia na página da direita e fazia acréscimos na da esquerda (com várias intromissões nas margens). Calcula-se que, para chegar às 3 mil páginas do romance, há pelo menos o triplo de páginas escritas nos cadernos. Durante meu Doutorado na Universidade de São Paulo (USP) transcrevi mais dois desses cadernos, que agora começam a ser publicados na Europa pela editora belga Brépols".
REEDIÇÃO DEFINITIVA
Iniciado em 2004, o calendário de relançamentos da obra-prima se completa neste fim de ano, quando a Globo lança o último volume (O Tempo Redescoberto) com um dicionário de leitura assinado pelo crítico Michel Erman, um dos biógrafos de Proust.
Segundo Ignácio da Silva, alguns acréscimos foram feitos ao quinto, sexto e sétimo volumes: "Às vezes, trata-se apenas do acréscimo de uma palavra numa frase, outras vezes, de todo um episódio que não constava da primeira tradução (como a visita aos quadros do pintor Carpaccio, em Veneza - visita que vinha se preparando desde o primeiro volume e que acontece enfim no sexto volume; pois bem, essa visita não constava da tradução de Drummond e foi acrescentada)", esclarece.
A reedição definitiva da Globo Livros, que pretende ser referência nacional em se tratando de Proust, conta também com prefácios, orelhas, contracapa, resumo final e um posfácio com algum grande leitor proustiano no Brasil ou no exterior.
Philippe Willemart, autor do posfácio em O Caminho de Guermantes, volume lançado em 2007, está à frente do Laboratório do Manuscrito Literário, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), e foi outro dos pesquisadores que se debruçou sobre os originais de Proust.
Em 2010, ele participou de um colóquio em Paris, onde conheceu as outras equipes e contou sua experiência no trato com as páginas pessoais do francês.
No site da USP, o professor relata o método de escrita que Proust adota nos cadernos: “Enquanto Gustave Flaubert, por exemplo, escreve página por página, e rasura a mesma página antes de passar à seguinte, Marcel Proust trabalha com diversos cadernos de rascunho e passa a limpo, e retorna a todos eles para pegar trechos a serem usados na versão que vai publicar".
Perfeccionista ao extremo, Proust construiu um dos painéis de maior espectro da literatura. Em constante movimento, sua obra ainda dá muito trabalho.
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