CULTURA
Jornalista Ricardo Alexandre lança 3º livro
Cheguei Bem a Tempo de Ver o Palco Desabar: 50 Causos e Memórias do Rock Brasileiro (1993-2008) é uma espécie de sequência de Dias de Luta: O Rock e o Brasil dos Anos 80.
Publicado em 12/02/2014 às 8:00 | Atualizado em 23/06/2023 às 12:24
Os anos 90 trouxeram transformações que mudariam para sempre os rumos da música em todo o mundo. Downloads não oficiais atacaram mortalmente a indústria do disco, os artistas encontram o caminho da felicidade na estrada “indie” e a internet, ainda em fraldas, mudaria a maneira como nos informaríamos e consumiríamos música.
No Brasil, foi uma época de grandes apostas, discos antológicos e uma necessidade de modernizar o passado, afinal, como preconizava o mentor Chico Science (1966-1997), isso era uma evolução musical. Também foi o fim de uma época romântica em diversas vertentes, da procura pela batida perfeita ao jornalismo de música.
O jornalista Ricardo Alexandre chegou bem a tempo de ver esse palco desabar, como sugere o título da sua terceira publicação, que sai pela editora Arquipélago, a mesma que lançou a nova edição do primeiro livro de Ricardo, Dias de Luta: O Rock e o Brasil dos Anos 80.
Cheguei Bem a Tempo de Ver o Palco Desabar: 50 Causos e Memórias do Rock Brasileiro (1993-2008) é uma espécie de sequência de Dias de Luta; a diferença está na forma do novo projeto. Ao invés do rigor da pesquisa e da apuração, Ricardo Alexandre aposta em textos descontraídos, autobiográficos e leves, pautados quase sempre por alguma tese levantada por ele e os amigos (do naipe de André Forastieri, que assina o prefácio, e Carlos Eduardo Miranda), bem ao estilo Nick Hornby (autor de Alta Fidelidade).
"Não acho que seja um retrato desse período, da forma como o Dias de Luta teve a pretensão de ser a respeito dos anos 80”, rebate o autor, escolhendo cuidadosamente cada palavra. “É um recorte muito específico de uma pessoa muito jovem e muito esperançosa, sobre um período que foi abruptamente desviado de sua rota original”, acrescenta. Os textos cobrem o que aconteceu na música, na indústria musical e no comportamento jovem do Brasil entre 1993 e 2008.
Ricardo bate na tecla que o livro é parcial, e por vários motivos.
O principal deles é que se trata de uma história bem pessoal, de um jovem repórter que dava os primeiros passos numa carreira, conhecendo os bastidores da engrenagem que moviam os artistas da época, fosse cobrindo shows no Abril Pro Rock, ou conferindo as gravações do Acústico MTV dos Titãs para veículos como o jornal O Estado de SP ou a revista Bizz, que chegou a dirigir antes de se tornar um escritor laureado com o Prêmio Jabuti (pela biografia de Simonal, Nem Vem Que Não Tem).
“Eu acho que o axioma com o que eu entro na aventura já faz dele (o livro) parcial”, justifica no papo com a reportagem, por telefone. “O fato dele ser um relato da minha experiência como profissional já faz dele mais pessoal ainda e o formato que eu escolhi, de 50 capítulos, e que cada capítulo usasse de alguns dados factuais para estruturar uma tesezinha ali, ele torna o livro ainda mais subjetivo e pessoal. Por outro lado, existe um contingente suficientemente interessado no registro desse período e que se identificou com esse formato que o livro tem”.
Escrito inicialmente em um blog, feito com a finalidade de lapidar os 50 “causos” que compõem o livro de 256 páginas, Cheguei Bem a Tempo... traz certas lacunas. Por exemplo, não aborda, com a generosidade com que fala de Skank e Raimundos, grupos fundamentais do período como Planet Hemp. Sepultura, outro nome de destaque no período, é minimamente citado.
Os textos são os mesmos do blog (hoje a versão eletrônica dos textos foi reduzida a um “trailer” do que o leitor poderá encontrar no livro), com pequenas revisões para edição impressa e quase nenhuma interferência posterior, salvo raríssimas exceções.
Uma delas envolve a banda gospel Catedral. Epicentro de uma polêmica feita a partir de um título oportunista que Alexandre colocou em uma matéria sobre o grupo (“A igreja é uma merda”), o texto “mea culpa” em que ele comenta o caso no blog foi utilizado pela banda contra o próprio Ricardo, rendendo, inclusive, um vídeo de quase uma hora sobre o texto.
"Eu fiz aquele texto muito desarmado, confessando uma coisa que eu fiz e da qual eu me arrependi, especialmente pelo decorrer do que rolou a partir dali”, fala Ricardo. “E os caras utilizaram do meu texto para me detonar pessoalmente (...) Entendo o rancor deles, respeito o mal estar deles e as privações que eventualmente eles passaram por conta do texto, mas o fato é que eles foram muito levianos”.
O texto que se lê no livro, esclarece o autor, acabou se tornando uma resposta ao vídeo. “É uma combinação do que era o post original (do blog) com as ponderações que eu fiz depois (que o vídeo saiu)”, explica.
Curiosamente, Ricardo Alexandre é cristão (o que rende um lúcido texto sobre a conversão de Rodolfo Abrantes, ex-Raimundos) e defende, no livro, teses como “O cristianismo é a contracultura que o rock não conseguiu ser” ao que Forastieri, grande amigo do autor, não deixa de perder a piada: “(Ricardo) ouve em acordes distorcidos a voz dos anjos. Eu, o fogo do inferno (...) É um homem de fé. E de fé no rock e no jornalismo. Por isso, ninguém melhor para contar a história da música jovem brasileira dos anos 1990 ao começo do milênio do que ele”, argumenta o autor do prefácio.
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