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CULTURA

Luto para mais de cem anos

Gabriel García Márquez está morto, mas nunca esteve tão vivo.

Publicado em 19/04/2014 às 8:00 | Atualizado em 23/01/2024 às 11:55

Nos últimos anos de vida, a batalha pessoal do escritor Gabriel García Márquez contra a demência senil traçou um paralelo trágico com uma batalha histórica e coletiva na qual a obra do colombiano engrossou as fileiras de frente: a de uma América Latina contra o esfacelamento da memória.

Da primeira batalha, Gabo infelizmente não resistiu. Morreu na tarde da quinta-feira, aos 87 anos, vítima de um câncer linfático que afetou seus pulmões, gânglios e fígado. Em sua casa, na Cidade do México, deixou inconcluso o projeto de sua autobiografia, Viver Para Contar (2002), cuja epígrafe do primeiro volume salta agora do papel como uma cruel ironia: "A vida não é a que a gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la."

Da segunda batalha, o autor de Cem Anos de Solidão (1967) resistiu como poucos. O criador de Macondo fez da aldeia fictícia um microcosmos assustadoramente real não apenas de seu país, mas de todo um continente. Imprimiu no brasão dos Buendía o símbolo de uma estirpe de Josés que precariamente tentou deixar sua herança em tempos de cólera, para lembrar um título feliz de outro de seus romances.

Foi um dos mais influentes prosadores de sua época. Filiado ao realismo mágico (conceito com o qual ele implicava: "A realidade é que é mágica. Não invento nada"), fez desta tradição literária a doença endêmica da qual ainda padece, com raros surtos de remissão, a literatura deste lado de baixo do Equador. Agraciado com o Nobel, em 1982, tornou-se ainda mais lido e ainda mais aguerrido politicamente, estreitando relações com Cuba, onde fundou a Escola Internacional de Cinema e Televisão.

Jornalista que considerava o ofício "a melhor profissão do mundo", quando estava internado na semana passada, apelou aos repórteres que acorreram ao hospital: "Vão trabalhar e fazer algo de útil!". Dizia também que escrever para jornal era "ter o privilégio de mudar algo todos os dias".

E de bom grado nós colegas mudaríamos as manchetes dos jornais desde anteontem. Substituiríamos as páginas dos obituários por outras em que Gabo, diferente dos seus personagens, estaria condenado a mais cem anos em nossa companhia e uma segunda chance sobre a Terra.

Sendo aquele apenas um de seus chistes, resta mudar a metáfora que ele trabalhou no seu conto de estreia, 'A terceira resignação' (1947), e que nunca pareceu fazer tanto sentido: como o protagonista de sua história, Gabriel García Márquez está morto, mas nunca esteve tão vivo.

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Jornal da Paraíba

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