Nelson com filtro Instagram

No vaivém da rua, um homem é atropelado. Seu corpo estatelado é visto por dezenas de transeuntes. Um deles surge da multidão e corre em seu socorro. Ele beija o desconhecido na boca, enquanto a cena é flagrada por celulares com câmeras embutidas. A imagem vai parar nas redes sociais e o resto é a história que os fãs de Nelson Rodrigues (1912-1980) já sabem de cor.

O Beijo no Asfalto, expoente do realismo rodrigueano, ganhou revisão do diretor Claudio Lira no centenário do dramaturgo, ano passado. A peça, que foi adaptada para o atual contexto midiático da sociedade, estreia em João Pessoa e terá apresentações hoje e amanhã, às 20h, no Centro Cultural Piollin.

"O texto de Nelson aborda a questão da manipulação da informação pela imprensa e de como a notícia falsa pode virar uma verdade assustadora", afirma Lira, que participa de um debate com o diretor Márcio Marciano, o escritor Astier Basílio, a atriz Andrêzza Alves e o público na noite desta terça-feira, após a primeira sessão do espetáculo.

"A diferença da época do texto para a de hoje é que os meios de comunicação eram basicamente os jornais e o rádio, o que não impedia que uma notícia se espalhasse e fosse distorcida", complementa o diretor, que teve sua proposta premiada pela Fundação Nacional de Artes (Funarte) no projeto 'Nelson Brasil Rodrigues: 100 Anos do Anjo Pornográfico'.

É a quarta proposta classificada no projeto que encenou as 12 obras do dramaturgo a subir aos palcos pessoenses desde: antes dela vieram Perdoa-me por me Traíres, da Cia.

Engenharia Cênica; Viúva, Porém Honesta, do Grupo Magiluth; e Doroteia, do Grupo Panaceia Delirante.

Escrita em 1961, O Beijo no Asfalto teve no elenco de sua primeira versão atores como Ney Latorraca e Tarcísio Meira.