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CULTURA

O Paradiso é em Remígio

Proprietário do 'único cinema de rua da Paraíba', ganha novo kit de projeção e vislumbra futuro promissor para o Cine RT. 

Publicado em 19/03/2014 às 6:00 | Atualizado em 18/07/2023 às 14:33

Em Remígio, no Brejo paraibano, Regílson Cavalcanti Silva ganha a vida consertando motos numa oficina que abriu há 8 anos. O ganha-pão da família – ele é casado e tem uma filha pequena – também financia o sonho de criança do mecânico: ter um cinema.

“Temos o único cinema de rua da Paraíba com programação de shopping”, diz o orgulhoso proprietário do antigo Cinema São José, hoje rebatizado de Cine RT – das iniciais de Regílson e de sua esposa, Thamires.

Tal qual um personagem de Cinema Paradiso (1988) ou Cine Holliúdy (2013), o mecânico se vira em gerente, programador e projecionista em seu quixotesco objetivo de fazer as pessoas voltarem a frequentar o cinema da cidade e embarcar na mágica viagem da projeção de 24 quadros por segundo.

Atividade em extinção fora dos grandes centros, o Cine RT opera com cópias em 35 milímetros, aposentadas por Hollywood no final de 2013, quando passou a adotar somente cópias digitais, e não atrai o número suficiente de pagantes para fazer do cinema, um negócio autossustentável. “Quando dá umas 50 pessoas na semana, é porque a bilheteria tá boa”, conta o mecânico, ressentido.

Nem isso, nem o prejuízo financeiro, desanimam Regílson.

Muito pelo contrário. Com seu cinema gerando matérias de alcance nacional - foi capa do Segundo Caderno do jornal O Globo, no Rio de Janeiro, no começo deste mês - e um novo kit de projeção, doação da rede Cinépolis, que opera em João Pessoa, o mecânico vislumbra um futuro promissor.

“Tenho fé que vai melhorar ainda mais. Minha expectativa é bem alta com esse novo sistema de som e a imagem, que é bem superior ao que a gente tinha aqui. Só falta conseguir as poltronas”, diz, por telefone, referindo-se a sua prioridade número um a partir de agora: trocar as cem cadeiras de plástico do cinema por poltronas apropriadas.

Regílson fretou um caminhão baú na segunda-feira passada para buscar o equipamento em João Pessoa. Ontem mesmo já começou a instalá-lo e espera estrear o novo maquinário já no próximo final de semana.

Inaugurado em 13 de fevereiro de 2012, o cinema funcionava com um projetor que ele comprou de um antigo cinema em Guarabira. “Comprei dois por R$ 3.500,00 e reformei um, com peças boas do outro”, explica. Também funcionava com um antigo sistema de som doado pela rede Cinesercla, que atua em Campina Grande.

Com os novos equipamentos, ele vai passar a utilizar um projetor Galax importado de 35 mm, muito mais sofisticado que seu equipamento atual. “Ele está funcionando perfeitamente”, garante.

O antigo kit de projeção – que também vinha funcionando satisfatoriamente – vai ficar encostado, por enquanto. “Adoraria doar para alguém que queira, também, abrir um cinema na Paraíba. Quem sabe aparece aí uma cidade com a disposição de um projeto assim, como o nosso”.

PAIXÃO DE INFÂNCIA

A paixão de Regílson pelo cinema vem dos tempos de criança, quando pegava as fraldas de pano dos irmãos mais novos para projetar as tiras de película que catava no lixo do Cine São José, a partir de uma caixa de sapatos adaptada com lâmpada e lentes.

Único cinema de Remígio, o Cine São José teve seus dias de glória entre os anos 1960 e 70, quando era mantido pelo falecido empresário José Leal. Na virada dos anos 80 para os 90, reabriu sob nova direção, mas por um curto período.

Já adulto, e sem cinema na cidade, Regílson passou a frequentar o único multiplex de Campina Grande, distante 30 km de Remígio. Lá, conheceu o gerente e os técnicos e foi aprendendo como funcionava a máquina que projetava sonhos nas telas.

Depois de convencer os herdeiros de José Leal a alugar o mesmo galpão onde um dia foi o São José, ele partiu para a reforma do lugar, que levou seis meses. Conseguiu, também, revitalizar a tela do antigo cinema, deixando-a com 7 metros de largura e 3,8 de altura.

Para manter o cinema Regílson conta com a esposa, que trabalha na bilheteria, e um único funcionário, que fica na bombonieri. Muitas vezes, ele liga o projetor, ajusta o tempo no relógio, e sai para dar uma volta, ou até mesmo ir à missa aos domingos, e retorna antes dos créditos finais.

"QUERO TRAZER ROBOCOP"

A partir de uma rede de informações que montou, tendo numa ponta gerentes de cinema de Patos, Campina Grande, João Pessoa e Recife (PE), e na outra as próprias distribuidoras, com as quais o mecânico negocia diretamente, Regílson Sousa mantém uma programação atualizada no cinema de Remígio.

Com sessões diárias às 18h e 20h, e uma matinê extra às 16h aos sábados e domingos, a sala funciona com cem cadeiras de plástico e cobra ingressos a R$ 8 (inteira) e R$ 4 (meia), exibindo filmes como Hércules, de Renny Harlin, que até o comecinho do mês estava em cartaz na capital.

As cópias, conta ele, saem de Recife para Remígio. “Não dá mais para pegar as cópias em João Pessoa e Campina Grande porque agora eles exibem tudo digital. Então tenho que ir buscar em Recife, onde ainda consegui os filmes em 35 mm e dublados”.

Pelo Facebook, ele mantém uma página do cinema, onde informa os lançamentos - que agora ocorrem às quintas-feiras, seguindo a tendência nacional - e sorteia ingressos.

Lá, fica-se sabendo que filmes como 300 A Ascensão do Império e Sem Escalas, blockbusters que ainda estão em cartaz nas salas multiplex da Paraíba.

"Hoje estou lutando para trazer uma cópia de Robocop (do diretor José Padilha) aqui pra Remígio", avisa.

Imagem

Jornal da Paraíba

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