CULTURA
OPINIÃO: De que lado estarão os artistas paraibanos dia 28?
Jamarri Nogueira levanta debate sobre o papel político da arte.
Publicado em 21/10/2018 às 7:00 | Atualizado em 22/10/2018 às 7:31
“Arte tem que ter ambição. (...) A arte invenção é o inconsciente do artista, a arte é delirante. Arte tem que ter ambição. (...) Ela me comeu e foi embora, pois nada mais safado que o amor. Arte tem que ter ambição. Utopia incendiária das esperanças”. Gosto de lembrar da então dupla de alunos de Comunicação Social Sandy e César declamando esse texto do grande professor Jomard Muniz de Britto, durante calouradas na UFPB, em João Pessoa.
Gosto porque esse texto me apresenta uma pluralidade de leituras possíveis a respeito dos tons políticos e econômicos da arte. “Arte tem que ter ambição” é uma frase de extrema dubiedade e de ampla reverberação de possibilidades significativas. Na verdade, uma ampla carta de possibilidades de ressignificação. Arte pobre. Arte rica. Arte de pobre. Arte de rico. Arte de esquerda. Arte de direita. Arte conservadora. Arte de vanguarda!
A ambição da arte remete a um cardápio tão variado e a escolha do prato passa por questões históricas, panoramas políticos, tendenciosidades midiáticas e sentimentos culturais de todos os tipos. Importante destacar que não é crime ser de direita e não é contra a lei ser de esquerda.
>>> Veja outros artigos de Jamarrí Nogueira no Jornal da Paraíba
Arte de direita, arte de esquerda
Vou repetir (quase desenhando): ser de direita é ter posicionamentos liberais com relação ao mercado e conservadores com relação ao comportamento social. Ser de esquerda é estar certo de que o Estado tem responsabilidades sociais principalmente com as camadas mais carentes da população e saber que as tradições precisam de mutações dialéticas.
Um artista de direita tende a ter uma postura mais conservadora com relação à produção, no formato e no conteúdo. Coisas lindas foram feitas por artistas conservadores. Arte que sobrevive aos tempos... Coisas lindas e conservadoras. Coisas lindas foram feitas por artistas de esquerda. Coisas lindas e de vanguarda. Arte em devir... Formato e conteúdo determinados por uma percepção de mundo.
A Paraíba – assim como outras partes do mundo – tem artistas de direita e artistas de esquerda. É assim na música e no cinema, na dança e na literatura, no HQ e nas artes plásticas e visuais. É assim no teatro. É assim em todas as artes. Manifestações públicas – presenciais em atos populares ou através das redes sociais – têm revelado, todavia, uma terceira via de artistas paraibanos.
Uma terceira via?
Enquanto artistas paraibanos de esquerda batalham pela democracia, denunciam atrocidades cometidas contra os direitos mais básicos dos cidadãos e se posicionam em prol do respeito às conquistas e avanços da sociedade, essa terceira via nos põe em estado de alerta...
Enquanto artistas paraibanos de direita refletem sobre panoramas políticos possíveis para o fortalecimento de um Estado liberal e se posicionam pelo fortalecimento do mercado sem interferência dos gestores públicos, sem esquecer da importância da democracia, essa terceira via nos põe em estado de temor!
Uma parcela significativa dos artistas paraibanos (e isso não tem valor de pesquisa e sim de percepção com base em posturas explicitadas através de diversos mecanismos de proliferação de ideias) já se assume a favor de propostas nada inclusivas e completamente voltadas para a opressão contra minorias e pelo fim da democracia (desde que isso represente, conforme eles, um combate efetivo à corrupção).
‘O grito’
Gente conhecida e respeitada como artista tem se manifestado a favor de candidaturas devotadas a inimigos da democracia e até mesmo àqueles que idolatram torturadores como o coronel Brilhante Ustra. Essa parcela – que não é de direita nem de esquerda – quer no poder representatividades da ditadura militar. Quer opressão como controle social. Quer vingança contra a esquerda. Sabe o quadro ‘O grito’, de Edvard Munch? Fico daquele jeito... Com um sentimento de angústia.
Onde estarão esses artistas no próximo dia 28? Com quem estarão esses artistas no próximo dia 28? Eu sei que estarei bem longe deles. E se o plano sócio-político deles for colocado em prática, espero estar ainda mais longe. Porque a gente pode até discutir esquerda e direita. E também pode discutir arte conservadora e arte de vanguarda! Mas, a gente não pode permitir que a necessidade de democracia e os direitos civis sejam colocados em xeque! Em tempo: democracia – assim como a arte – tem que ter ambição...
* Jamarrí Nogueira é repórter da CBN João Pessoa e escreve sobre arte e cultura aos domingos no Jornal da Paraíba.
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