CULTURA
'Os 8 Odiados' entra definitivamente em cartaz nos cinemas da Paraíba
Novo longa de Tarantino tem três horas de duração. Western coloca em confronto personagens em completa sintonia.
Publicado em 06/01/2016 às 8:48
Algumas décadas atrás, fazendo um exercício de imaginação, podemos ver o 'rato' de locadora Quentin Tarantino se debruçando entre as fitas de clássicos dos tempos das diligências – como os estrelados pelo durão John Wayne sob a direção de nomes como Howard Hawks e John Ford, ou o western spaghetti com chumbo e super close-ups regidos por Sergio Leone, ou ainda a violência gráfica e em câmera lenta do Sam Peckinpah.
Quando se tornou diretor, ele já “tirou o chapéu” para tais clássicos hollywoodianos, a exemplos da cena emulando o final de Rastros de Ódio (1956) no começo de Bastardos Inglórios (2009) ou o clima de duelo do Velho Oeste presente em Kill Bill (2003-2004).
Tarantino poderia muito bem afirmar que já fez um filme de 'bang-bang!' quando lançou Django Livre (2012), mas agora ele revisita mais contido (veja resenha abaixo) o gênero com seu oitavo longa-metragem, Os 8 Odiados (The Hateful Eight, EUA, 2015) que, depois de uma semana de pré-estreia diária, entra definitivamente em cartaz a partir de amanhã nos cinemas de João Pessoa e Campina Grande.
Depois de uma febre de Hollywood no começo dos anos 1990 por produções do faroeste (onde o auge, na época, foi o oscarizado Os Imperdoáveis, de Clint Eastwood), alguns filmes acima da média do gênero estreavam nas telonas ao longo dos anos, como a refilmagem de Bravura Indômita (2010) pelos irmãos Coen.
Em Os 8 Odiados (até o título remete a o outro clássico, Sete Homens e Um Destino, de 1960), a Guerra de Secessão norte-americana (1861-1865) já se findou. No interior da montanhosa Wyoming, uma diligência levando um caçador de recompensas (Kurt Russell, que já trabalhou com Tarantino em À Prova de Morte e foi o lendário Wyatt Earp em Tombstone) e uma criminosa (Jennifer Jason Leigh, de Mulher Solteira Procura) segue para a cidade de Red Rock, onde será entregue à justiça.
No caminho, eles encontram um ex-soldado nortista que se tornou mercenário (Samuel L. Jackson, de Pulp Fiction) e um sulista (Walton Goggins, de Django Livre) que afirma ser o novo xerife da região. Para evitar uma forte nevasca, os quatro buscam refúgio numa estalagem no meio do 'inferno branco'. Lá, no lugar da proprietária, eles encontram mais quatro forasteiros: um mexicano (Demian Bichir, de Selvagens), o enforcador de Red Rock (Tim Roth, de Pulp Fiction), um vaqueiro (Michael Madsen, de Cães de Aluguel) e um velho general confederado (Bruce Dern, de Nebraska).
E lá, um novo personagem se acomoda no meio do bando: a desconfiança.
Crítica
TARANTINO SE CONTÉM E ACERTA O ALVO
Ícone da cultura pop por ser um alquimista de referências na sua filmografia, Quentin Tarantino surtou com suas autorreferências em Django Livre (2012), misturando James Brown com Ennio Morricone e colocando cavalos dançarinos como coadjuvantes na sua história de vingança nos tempos do Velho Oeste.
Depois de quase desistir devido a um vazamento do roteiro, o diretor voltou atrás e seu projeto, depois de um western, foi justamente outro filme do gênero, mas completamente diferente em vários pontos.
Os 8 Odiados mostra um Tarantino ainda verborrágico, com os diálogos sempre afiados, preparando terreno para o que vem depois do encontro cheio de desconfiança dos bem definidos protagonistas numa estalagem no meio de uma intensa nevasca. Ganância para embolsar o montante da recompensa? Tentativa de resgate da prisioneira? Ou foi o mero acaso que atiça e alimenta a chama do rastilho de pólvora ligado à TNT das indiferenças cultivadas entre os misteriosos viajantes.
Falando em personagens, todos estão em sintonia, com destaque para a espevitada Daisy Domergue da 'desaparecida' Jennifer Jason Leigh, que coloca o tom cômico certo na verve do roteiro. O realizador respeita não só os amplos planos do gênero (o longa foi rodado em 70mm, o dobro do formato convencional), mas também a trilha assinada por Morricone. Aqui, a melodia serve como suporte narrativo, ao contrário do tom histriônico de Django Livre.
Mas, depois de uma bem colocada sequência sherloquiana, o cineasta desvia seu percurso para imprimir sua cartilha mais gore, porém menos 'chiliquenta'. Dividida em capítulos, Tarantino congela e volta o tempo para explicar um dos seus títulos, além de fazer o habitual flashback depois de uma sequência chave.
Na 'primeira olhada', Os 8 Odiados parece ser uma grande homenagem aos clássicos do western. Quando passamos pelas montanhosas e abertas paisagens alvas junto com o nada claustrofóbico (mas tenso) jogo de desconfiança da estalagem – uma viagem de mais de três horas –, percebemos que Tarantino continua sendo Tarantino, para o bem ou para o mal de quem gosta (ou não) da sua violência cartunesca, a metralhadora giratória de seus diálogos e o pastiche de algumas situações com seus peculiares personagens.
Mesmo com exageros, é um filme bem contado que prende a atenção, como a lábia de uma carta assinada pelo presidente norte-americano Abraham Lincoln? Talvez, mas com espírito de Quentin Tarantino.
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