CULTURA
Perto de completar 80 anos de idade, Maria Valéria Rezende vai lançar livro infantil sobre a morte
"Vovó Também Sabe Voar" está em pré-venda e pretende dialogar sobre morte e saudade com crianças e adultos. "Depois que passa o luto, saudade é bom", reflete a autora.
Publicado em 22/10/2022 às 7:09
"Eu quero viver até o último minuto". A frase é da escritora Maria Valéria Rezende, que, às vésperas de completar 80 anos de vida em 8 de dezembro, se prepara para lançar mais um livro na carreira. Trata-se da obra infantil "Vovó Também Sabe Voar" (Arribaçã Editora, R$ 35), que se propõe ao difícil desafio de falar de morte com as crianças. Um tema que não é inédito para a autora, mas que ela quis retomar agora depois de tudo o que se viveu na pandemia de Covid-19.
Maria Valéria esbanja vitalidade. Com mais de 30 livros já publicados na carreira, tem ao menos cinco outros em fase de produção. E mesmo gostando de viver, querendo viver cada momento, fala com leveza sobre a inevitabilidade da morte. Brinca e ri ao falar do pouco tempo de vida que deve lhe restar por causa de sua idade avançada. Mas sabe adotar um tom reflexivo ao conversar sobre a nova obra:
"A morte é um assunto muito difícil, mas que está permeando todo o nosso tempo. E as crianças estão se confrontando com esse tema independente das famílias quererem ou não. Então é um livro infantil, mas no fundo é para os adultos também. Porque a morte se tornou um assunto cotidiano", destaca a autora.
"Vovó Também Sabe Voar" está em pré-venda numa campanha de financiamento coletivo ao preço de R$ 35. O livro tem 40 páginas coloridas em papel couchê, com ilustrações de Thiago da Silveira, um artista grafiteiro que foi convencido pela própria Maria Valéria Rezende a se somar ao projeto. "Eu acho que ficou um livro bonito. As crianças vão amar", resume.
Destacando que a publicação tem também o papel de ajudar pais, professores e crianças a abordar o tema, ela fala do lado bom da saudade:
Depois que passa o luto, saudade é bom. Saudade é uma forma de recuperar a vida", filosofa a autora.
Maria Valéria explica ainda que a saudade está muito ligada à memória, ao que foi experienciado com pessoas que se ama, e que essa abordagem positiva precisa fazer parte do debate.
Precisamos ter uma compreensão da morte como algo que remete à vida e não à tristeza. Não ter saudade de nada deve ser uma coisa terrível", completa Maria Valéria Rezende.
A escritora enfatiza, inclusive, que foram muitos os casos durante a pandemia de rupturas de crianças com pessoas vivas, o que torna o debate sobre morte, saudade, distância, ainda mais necessário. Crianças que, por exemplo, passaram três anos sem poderem se encontrar com seus avós por causa das dificuldades de circulação e da impossibilidade de aglomeração. "Três anos na vida de uma criança é muito tempo".
Pensando o hoje
Vencedora do Prêmio Jabuti de Literatura de 2015 e finalista do principal prêmio de literatura do Brasil em diversas outras oportunidades, Maria Valéria Rezende nasceu em Santos, mas desde 1976 está radicada na Paraíba. Declara adorar a vida, mas quando fala mais abertamente sobre literatura, projetos, livros futuros, não deixa de abordar a questão da possibilidade de morte.
Faz isso com graça, é bem verdade. De forma honesta e bem-humorada, admite a finitude da vida, a suposta proximidade da própria morte. Com quase 80 anos, trata do tema com uma certa firmeza de quem sabe como as coisas funcionam.
Por exemplo, Maria Valéria diz que pretende realizar lançamentos do novo livro, previsto para chegar ao público em abril do ano que vem. Mas, ao falar sobre isso, admite que não sabe nem mesmo se estará viva até lá:
"Com a minha idade, fica difícil planejar algo que não seja para hoje. Não posso garantir que estarei viva daqui a um mês, mas nos meus planos e sonhos, tem muito lançamento previsto sim", explica ela, soltando uma risada, rindo da piada sobre a possibilidade da própria morte.
Outra questão são os livros que ainda pretende escrever e publicar. Tem um de haicais escrito em parceria com a escritora paranaense Marília Kubota, já finalizado. E mais quatro romances iniciados e ainda incompletos. "Quando eu tenho uma boa ideia, eu já começo a escrever", frisa ela. "Vou fazendo o que dá", completa.
Mas, ao mesmo tempo, admite já não saber quantos desses vai conseguir finalizar:
Eu hoje sou mais saudade do que projeto", finaliza.
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