SILVIO OSIAS
A ditadura militar acabou há 40 anos
O Brasil voltou a ter um presidente civil com a posse de José Sarney, em 15 de março de 1985.
Publicado em 15/03/2025 às 11:31

Hoje é sábado, 15 de março de 2025. Há 40 anos, no dia 15 de março de 1985, com a posse de José Sarney, acabou a ditadura militar iniciada em abril de 1964.
Nas nossas últimas conversas telefônicas, ouvi do cineasta Vladimir Carvalho que a figura de Sarney seria reavaliada e que o ex-presidente teria um bom lugar na História.
Como resposta, disse a Vladimir que meu pai, seu amigo de infância, defendia essa tese há muito tempo. Desde quando José Sarney ainda era presidente.
O presidente Lula, que, na época, fazia dura oposição ao governo, já fez a necessária autocrítica, reconhecendo a importância do papel desempenhado por Sarney.
Na noite de 14 de março de 1985, a Bandeirantes reprisava um especial de Chico Buarque quando um plantão do jornalismo informou que Tancredo Neves estava no Hospital de Base de Brasília e seria operado em caráter de urgência.
Eleitos em 15 de janeiro daquele ano pelo Colégio Eleitoral, Tancredo Neves, presidente, e José Sarney, vice, tomariam posse na manhã seguinte, 15 de março de 1985.
A noite de 14 e a madrugada de 15 de março foram dramáticas para os principais atores políticos de Brasília. O que fazer, estando o presidente impedido de tomar posse?
Com o fim do mandato do presidente João Figueiredo e a ausência do presidente eleito Tancredo Neves, assumiria o presidente da Câmara, Ulysses Guimarães.
Essa foi uma das teses defendidas, mas setores das Forças Armadas não admitiam que Ulysses Guimarães fosse presidente, ainda que interinamente.
O general Walter Pires, ministro do Exército de Figueiredo, sugeriu que os militares permanecessem no poder até que Tancredo Neves pudesse assumir.
Leitão de Abreu, chefe da Casa Civil de Figueiredo, foi contra e argumentou que, àquela altura, o general Walter Pires já não era mais ministro do Exército.
Na área militar, o general Leônidas Pires, escolhido para ser ministro do Exército de Tancredo, teve papel fundamental nas articulações, e foi ele que, na madrugada do dia 15 de março, comunicou a Sarney que estivesse pronto para tomar posse.
Na área civil, o deputado Ulysses Guimarães, grande artífice da redemocratização, liderou as articulações para garantir a posse de José Sarney no dia seguinte.
Tancredo Neves morreu na noite do dia 21 de abril de 1985, e José Sarney disse à Nação que daria o melhor dos seus dias para não viver aquele momento.
O Brasil, que queria Tancredo Neves presidente, teve José Sarney num período de inflação nas alturas, que o governo tentou conter com o Plano Cruzado.
O mandato de quatro anos de Sarney ganhou mais um ano, numa articulação política muito questionável, e as eleições diretas para presidente ficaram para 1989.
José Sarney, político habilidoso que vinha do tempo da Bossa Nova da UDN, fez a transição da ditadura para a democracia, enquanto o Congresso eleito em 1986, através de uma Assembleia Nacional Constituinte, legou ao país uma nova Constituição.
Na eleição de 1989, o Brasil não quis eleger nenhum dos políticos que lutaram pela redemocratização. Botou no poder um autêntico "filhote da ditadura" - como Fernando Collor muitas vezes assim foi chamado por Leonel Brizola.
Em 1989, ouvi de Celso Furtado que as elites brasileiras eram tão atrasadas que não admitiam nem Ulysses Guimarães como presidente da República.
Como tivemos na Presidência um sociólogo de esquerda (Fernando Henrique Cardoso), um ex-líder sindical (Luiz Inácio Lula da Silva) e uma ex-guerrilheira urbana (Dilma Rousseff), acreditei que o professor Celso Furtado estava equivocado.
Mas a eleição de Jair Bolsonaro e tudo o que a ela se seguiu me deram a plena convicção de que Celso Furtado, esse grande brasileiro, sabia, sim, o que estava dizendo.
Nos 40 anos do fim da ditadura e do renascimento da nossa democracia, ainda estamos aqui nesse Brasil profundamente desigual e às voltas com infindáveis impasses.
Dois presidentes - Fernando Collor e Dilma Rousseff - foram defenestrados do poder através de processos de impeachment. E um ex-presidente - Jair Bolsonaro - está às voltas com um processo que pode levá-lo à cadeia por tentativa de golpe.
Nesta sexta-feira, 14 de março, vi na TV uma longa entrevista com o ex-presidente José Sarney, que fará 95 anos em abril. Contou histórias e fez análises com admirável lucidez. Tem lugar na História como um dos reconstrutores da democracia brasileira.
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