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SILVIO OSIAS

A História passando na nossa frente, mais uma vez

Começa o julgamento que pode condenar Jair Bolsonaro à prisão.

Publicado em 02/09/2025 às 7:52


				
					A História passando na nossa frente, mais uma vez
Foto/Reprodução.

Lembro vagamente do retrato de Jânio Quadros pendurado na parede da casa do meu avô materno, José Osias. Jânio e a vassoura com a qual prometia varrer a bandalheira.

Lembro, também vagamente, do primeiro de abril de 1964, em que os militares depuseram o presidente João Goulart. Comunista, meu pai queimou, numa fogueira no quintal, os livros que logo seriam considerados subversivos pelo novo regime.

Lembro dos ecos das manifestações de 1968. Eu era um menino de nove anos, e, no Instituto Dom Adauto, onde fiz meu curso primário, uma menina linda, chamada Teresa Cristina, escreveu UNE na minha mão e ficou feliz porque eu deixei.

Lembro daquele disco belo e triste que Caetano Veloso gravou em Londres, em 1971, cantando a Asa Branca. Ele e Gilberto Gil haviam sido presos pela ditadura em 1968, logo depois do AI-5, e estavam exilados na Inglaterra.

Lembro muito dos anos 1970. Comecei no ginásio, terminei na universidade. O Brasil começou com o "ame-o ou deixe-o" de Médici, terminou com a volta dos exilados. Brizola, Arraes, Betinho, Gabeira. Até hoje, me emociono com as imagens nos aeroportos.

Lembro da campanha das Diretas Já, em 1984. A Praça da Sé, em São Paulo. A Candelária, no Rio. Dr. Ulysses em João Pessoa. A noite do 25 de abril no Ponto de Cem Réis. A frustração com a derrota da emenda que traria as eleições para presidente.

Lembro da multidão no comício de Tancredo Neves na Lagoa, outubro de 1984. Fafá de Belém cantando Menestrel das Alagoas e trazendo a lembrança de Teotônio Vilela.

Lembro da alegria do 15 de janeiro de 1985, da eleição de Tancredo. E da tristeza do 21 de abril, da morte daquele que seria o primeiro presidente civil desde Jango.

Lembro da eleição de 1989. A volta das diretas para presidente. Votei em Brizola e, no segundo turno, em Lula. O povo quis Fernando Collor, que confiscou a poupança.

Lembro do impeachment de Collor, em 1992. E, aí, vieram Itamar Franco, o Plano Real, o controle da inflação e, finalmente, a eleição de Fernando Henrique Cardoso.

Em 1989, o grande Celso Furtado me disse que as elites brasileiras eram tão atrasadas que, àquela altura, não eram capazes de assimilar nem Ulysses Guimarães.

Mas, bem ou mal, assimilaram um sociólogo vindo da esquerda, com FHC em 1994, um ex-operário, com Lula em 2002, e uma ex-guerrilheira, com Dilma Rousseff em 2010.

Lembro de tudo o que testemunhei como cidadão e como jornalista profissional. Do tempo passando nessa "grande pátria desimportante" chamada Brasil.

Lembro do povo nas ruas, no junho de 2013, de que tanto desconfiei, e, mais tarde, do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. Aos 33 anos, testemunhei o impeachment de Collor. Nunca pensei que, aos 57 anos, testemunharia outro impeachment.

Lembro da prisão de Lula, naquele abril de 2018. E da eleição de Jair Bolsonaro, em outubro daquele ano. Era difícil crer que o povo brasileiro botaria no poder um homem que defendia a tortura e muitas outras ideias abomináveis. Mas botou.

Lembro da pandemia que matou 700 mil brasileiros a partir de 2020 e do ostensivo e inaceitável negacionismo do então presidente Jair Bolsonaro. Acho importante manter na memória os absurdos que Bolsonaro disse enquanto as pessoas morriam de covid.

Lembro do espírito golpista que sempre esteve presente no comportamento de Bolsonaro no poder e da luta pela manutenção da democracia, com a eleição de Lula em 2022.

Mas lembro também do trágico oito de janeiro de 2023. Da multidão bolsonarista enfurecida, invadindo a Praça dos Três Poderes e depredando as suas sedes.

Nesta terça-feira, dois de setembro de 2025, começa o julgamento de Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de estado. Bolsonaro e militares de alta patente respondendo por crimes contra a democracia - algo inédito na vida republicana brasileira.

É importante porque temos uma democracia que permite que assim seja. E é melancólico porque confirma que vivemos sob permanentes impasses políticos. Sem os sonhos da juventude, olho com os olhos de quem está vendo a História passar na nossa frente.

Foto/Reprodução

Silvio Osias

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