SILVIO OSIAS
A homenagem permanente a Luiz Gonzaga é nunca deixar de ouvi-lo
Publicado em 20/06/2023 às 7:18
Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, vem de regiões profundas do ser do Nordeste. A frase faz justiça ao homem que, no final dos anos 1940, junto com Humberto Teixeira, transformou o tema regional Asa Branca num dos clássicos da música popular brasileira.
Fui apresentado às suas músicas quando era garoto. O Nordeste na Voz de Luiz Gonzaga era o título do LP que eu ouvia na casa do meu avô paterno. Foi o primeiro de muitos discos.
Mas há uma outra lembrança associada à infância. Na minha rua, a Conceição, no bairro de Jaguaribe, havia festa de Santo Antônio, São João e São Pedro. Grandes festas populares organizadas por moradores e compartilhadas com a vizinhança. Numa delas, e isto nunca saiu da minha memória, o que mais se ouvia era Gonzaga cantando: “A fogueira está queimando em homenagem a São João”. Mesmo que, à época, ele amargasse o ostracismo.
Tenho muito orgulho de ter ouvido Luiz Gonzaga em seu tempo. Mais ainda: de tê-lo visto de perto, ao vivo, inúmeras vezes. E com a consciência absoluta de que, sem nenhum exagero e sem qualquer favor, estava diante de um dos fundadores da canção popular brasileira.
Um gigante. Um artista autêntico, verdadeiro em sua simplicidade e sua força intuitiva. Gonzaga, seus trajes de Rei do Baião, sua sanfona, suas músicas belas e impregnadas de melancolia. O melhor pop nordestino produzido para atravessar o tempo e inserir-se na memória afetiva de milhares de pessoas, rurais ou urbanas, que cresceram ouvindo aquelas canções em casa e nas nossas festas juninas.
Uma vez, fui convocado a enumerar as músicas que prefiro no extenso repertório de Luiz Gonzaga. Légua Tirana é uma delas. Estrada de Canindé e A Morte do Vaqueiro também estão entre as prediletas. Adoro Noites Brasileiras e Olha pro Céu, uma marchinha junina comovente. O Xote das Meninas é uma delícia. Da parceria com Zé Dantas. Tema universal tratado com olhar regional. Vozes da Seca estava nas audições com meu avô, precursora da canção de protesto. Assum Preto é Asa Branca em tom menor. A lista não tem fim.
Na segunda metade dos anos 1970, fui à Assembleia Legislativa ver Luiz Gonzaga receber o título de cidadão paraibano. O discurso de tom excessivamente regionalista me pareceu ingênuo diante da universalidade das coisas, mas ele merecia todos os aplausos, a despeito das críticas que lhe eram feitas (a defesa da ditadura, a não autoria das canções). Ele era (e permanece sendo) muito maior do que o que se podia dizer de negativo a seu respeito.
O encontro com o filho Gonzaguinha, na turnê que passou por João Pessoa no início da década de 1980, não sairá da memória de quem o testemunhou. A homenagem permanente a Luiz Gonzaga é nunca deixar de ouvi-lo.
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