SILVIO OSIAS
Assassinos da Lua das Flores é um filme que já nasceu clássico
Publicado em 07/11/2023 às 7:48 | Atualizado em 07/11/2023 às 20:55
Em 1973, Robert De Niro tinha 30 anos quando foi dirigido pela primeira vez por Martin Scorsese em Caminhos Perigosos. De lá até Assassinos da Lua das Flores, fizeram 10 filmes juntos.
Em 2002, Leonardo DiCaprio tinha 28 anos quando foi dirigido pela primeira vez por Martin Scorsese em Gangues de Nova York. De lá até Assassinos da Lua das Flores, fizeram seis filmes juntos.
Scorsese nunca tinha trabalhado com De Niro e DiCaprio num mesmo filme. Está fazendo pela primeira vez em Assassinos da Lua das Flores, em terceira semana de exibição nos cinemas brasileiros.
De Niro mais contido do que DiCaprio, os dois em soberbas atuações. Entre eles, há a indígena Lily Gladstone, uma atriz de 37 anos que, no papel da indígena Mollie, fala com olhares e expressivos silêncios.
Martin Scorsese, 80 anos, é pensador do cinema e realizador de cinema.
Assassinos da Lua das Flores não é um filme sobre cinema, mas é uma aula sobre como se faz cinema. Dizem que um filme precisa de 30, 40 anos para que conquiste o status de clássico. Assassinosda Lua das Flores dá a sensação de que já nasceu clássico.
Scorsese é alucinado por cinema, mas também é louco por música. Já juntou os dois algumas vezes em documentários como The LastWaltz, No Direction Home, Living n the Material World e Rolling Thunder Revue.
Quando era muito jovem e ainda desconhecido, esteve envolvido na realização de Woodstock e Elvis on Tour. E admite que a música de The Band em The Last Waltz o ajudou na montagem das cenas de luta de Touro Indomável, uma das suas obras-primas.
Cinema e música. Ficção e documentário. O cinema dos Estados Unidos, onde nasceu e trabalha. O cinema do mundo, que observa e ama. Scorsese não é uno. Scorsese é plural. Assassinos da Lua das Flores fala disso.
O novo filme de Martin Scorsese mistura vários gêneros. É um drama e uma história de amor. É um filme de suspense, mas não de mistério, seguindo o método hitchcockiano, que não esconde os segredos do espectador e sim dos personagens.
Assassinos da Lua das Flores tem algo dos filmes de gangster e também dos filmes de tribunal, além daqueles de investigação policial. Há quem veja nele o primeiro western de Scorsese, mas não é. Ambientado nos anos 1920, quase nada tem dos chamados westerns crepusculares.
São imensamente belas as imagens da descoberta do petróleo, do fogo na fazenda e da cena final.
É extremamente eficiente a inserção das imagens em preto e branco no estilo do período silencioso do cinema, que remete à época em que o filme se passa e aprofunda o diálogo com os primórdios do cinema, que Francis Ford Coppola já trazia, três décadas atrás, no seu admirável Drácula de Bram Stoker.
A radionovela do desfecho põe Scorsese em cena e também remete às intertextualidades possíveis em Assassinos da Lua das Flores.
Esse filme de 3 horas e 26 minutos é longo, mas não cansa o espectador. É que Scorsese tem, desde sempre, absoluto domínio da narrativa cinematográfica.
Comentei a forma e não o conteúdo. Com violência e poesia, Assassinos da Lua das Flores se debruça sobre a tragédia da nação indígena Osage e seu extermínio. Joga luzes sobre uma história que o mundo precisa conhecer e fala do presente falando do passado.
Nos créditos finais, há uma dedicatória a Robbie Robertson, o guitarrista de The Band, que morreu agora em 2023. Robbie, que, na década de 1970, Scorsese filmou tão jovem em The Last Waltz. A trilha de Assassinos da Lua das Flores foi seu último trabalho.
Assassinos da Lua das Flores é o cinema tal como Martin Scorsese compreende e materializa essa expressão artística do século XX. Os filmes que dirige explicam suas críticas contundentes aos filmes da Marvel e similares. Esses jamais representarão o ofício ao qual Scorsese dedicou seu amor e sua vida.
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