SILVIO OSIAS
Bye bye, Cacá Diegues!
Um dos fundadores do Cinema Novo, o cineasta morreu no Rio aos 84 anos.
Publicado em 14/02/2025 às 10:07
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Começamos esta sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025, com uma notícia muito triste. Morreu no Rio de Janeiro o cineasta Cacá Diegues.
Um dos fundadores do Cinema Novo, Cacá Diegues tinha 84 anos. Carlos José Fontes Diegues era de Maceió, mas viveu no Rio desde a infância.
Não é possível dizer qualquer coisa sobre o Cinema Novo sem pensar em Cacá Diegues. Ele é um dos grandes do Cinema Novo, ao lado de Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade.
Cada um criou um jeito de filmar (o realismo social de Nelson, o barroco de Glauber), disse Cacá Diegues numa entrevista de quando fez 80 anos, em 2020.
O jeito de filmar de Cacá Diegues acabou dialogando bem com o público. Creio que venceu obstáculos que os cinemanovistas enfrentaram nos anos 1960.
"O Cinema Novo não foi o ápice do cinema brasileiro, foi o início" - foi outra fala que guardei da entrevista que li nos 80 anos de Cacá Diegues.
Ganga Zumba (1964), A Grande Cidade (1966), Os Herdeiros (1969). O Cacá Diegues dos anos 1960, só vi mais tarde, quando tive idade para vê-los.
O Cacá Diegues de quem sou contemporâneo começa em 1972 com Quando o Carnaval Chegar, um musical adorável que brinca com a tradição da chanchada. A chanchada que antecedeu o Cinema Novo e que era o oposto do que queriam os cinemanovistas.
Quando o Carnaval Chegar tem Chico Buarque, Maria Bethânia, Nara Leão, Hugo Carvana e Antônio Pitanga no elenco. Cacá Diegues e Nara Leão foram casados.
Joanna Francesa é de 1973. Tem no elenco Jeanne Moreau, uma das musas do cinema europeu da década de 1960. E tem o lindo tema musical de Chico Buarque.
Xica da Silva é de 1976. Certamente, é o filme mais popular de Cacá Diegues. Encheu as salas de cinema onde foi exibido à época do seu lançamento.
"Xica da...Xica da...Xica da...Xica da Silva, a negra". Zezé Motta em cena, deslumbrante, linda. A voz e o violão de Jorge Ben. A sala do Cine Plaza lotada numa sessão de sábado à tarde, e o público impactado com aquilo.
Em 1976, no Brasil da ditadura militar, Xica da Silva estava entre os "subversivos" que o crítico José Carlos Avellar comentou no Jornal do Brasil. Os outros dois eram Um Estranho no Ninho, de Milos Forman, e Violência e Paixão, de Luchino Visconti.
Xica da Silva, com sua força extraordinária e seu grande apelo popular, parecia nos dizer: "Olha, o Cinema Novo, com seus caminhos tão difíceis, também conduziu a isto".
A crônica do subúrbio e da velhice em Chuvas de Verão (1978), com o inesquecível desempenho de Jofre Soares, tem beleza e humanismo singulares.
"Eu tenho saudades da nossa canção/Saudades de roça e sertão/Bom mesmo é ter um caminhão/Meu amor/Baby, bye bye...".
Aí é Chico Buarque. Aí é 1979. Aí é Bye Bye, Brasil. A letra da canção é uma conversa telefônica num orelhão, no tempo dos orelhões e das fichas.
Bye Bye, Brasil deve ter sido o filme mais popular de Cacá Diegues depois de Xica da Silva. Betty Faria e Fábio Jr. num road movie mambembe em cima de um caminhão e não das possantes motos de Easy Rider, fonte e matriz de todos os rodie movies.
Cacá Diegues seguiu fazendo cinema. Foi o que fez por toda a vida. Quilombo (1984), Um Trem Para as Estrelas (1987), Tieta do Agreste (1996), Orfeu (1999), Deus é Brasileiro (2003). A despedida, com O Grande Circo Místico, foi em 2018.
Além de grande cineasta, Cacá Diegues foi o cara que, ali por volta de 1977, cunhou a expressão "patrulhas ideológicas". De esquerda, ele sempre foi, mas estava cansado das cobranças que a esquerda fazia aos artistas e intelectuais que buscavam modos próprios e menos canônicos de engajamento na luta contra a ditadura militar.
Xica da Silva foi feito num período horrível do Brasil. A alegria que emanava de Xica da Silva era uma resposta muito eficaz que o cinema dava àquela tristeza.
Em 1989, Cacá Diegues fez um filme chamado Dias Melhores Virão. A partir desta sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025, Cacá Diegues não está mais aqui. Mas nós estamos e precisamos manter a a crença de que esses dias virão.
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