SILVIO OSIAS
Estreia novo filme de Tarantino. O cara sabe tudo de cinema!
Publicado em 15/08/2019 às 7:33 | Atualizado em 30/08/2021 às 20:40
Era Uma Vez em Hollywood estreia nesta quinta-feira (15) nos cinemas brasileiros.
O novo filme de Quentin Tarantino foi lançado no último Festival de Cannes.
Nono filme do cineasta, Era Uma Vez em Hollywood se passa em 1969, no mesmo cenário do assassinato da atriz Sharon Tate, mulher do diretor Roman Polanski.
Tarantino é um craque no que faz. Nos oito filmes que realizou (de Cães de Aluguel a Os Oito Odiados), ainda não errou. São todos grandes filmes.
Seguem algumas anotações minhas sobre o cinema de Quentin Tarantino:
O Dicionário de Cinema/Os Diretores, na edição que tenho, é da época em que Quentin Tarantino havia realizado apenas seus dois primeiros filmes, mas já o apresenta como um dos grandes. Tanto que compara a sua estreia, pelo impacto que provocou, à consagração inicial de Stanley Kubrick e Steven Spielberg. O autor, Jean Tulard, diz que o seu estilo de filmar alterna cenas de violência com longos diálogos e que estes são tão bons que, se durassem uma hora, poucos reclamariam.
Como Kubrick, Tarantino filma pouco. A qualidade sobrepondo-se à quantidade. E, já que Tulard menciona Spielberg, lembro que este, há muitos anos, numa cerimônia do Oscar, defendeu o uso da boa palavra no cinema, como se ela estivesse escassa. Algo que chama atenção em Quentin Tarantino. O crítico Roger Ebert também se impressionava com os diálogos escritos pelo cineasta: “diálogo de tão alta qualidade que é digno de ser comparado com outros mestres da prosa enxuta e rude”, disse Ebert, referindo-se a Pulp Fiction.
Cães de Aluguel, o primeiro filme de Tarantino, começa com uma longa conversa numa mesa. Os homens, que depois veremos envolvidos num assalto frustrado, falam de Madonna, comentam a canção Like a Virgin. A câmera gira enquanto eles conversam.
Semelhante a uma conversa das quatro protagonistas de À Prova de Morte, que falam do carro utilizado em Corrida Contra o Destino, filme do início da década de 1970 que, a despeito de ser cult, nem todos os cinéfilos de hoje conhecem. Das quatro mulheres, somente duas viram e reverenciam Corrida Contra o Destino. Como Tarantino, que vai buscar nos filmes que viu a matéria-prima do seu cinema.
Os filmes de Tarantino recuperam o melhor diálogo do cinema. A prosa enxuta e rude que Ebert enxergava em Pulp Fiction é a mesma que temos nas intermináveis conversas sobre sexo e cinema de À Prova de Morte. Ou no jantar de Django Livre. Elas se alternam com grandes sequências. Ou nos conduzem a elas. E aí surge outro elemento imprescindível ao cinema de Tarantino: a música que ele retira de uma discoteca afetiva, que não precisa existir fisicamente, apenas nas suas lembranças.
No início, poucos bancariam um filme como Cães de Aluguel. Mais tarde, Tarantino passou a encher as salas do mundo inteiro, conseguindo agradar até aos que não compreendem o seu complexo jogo de intertextualidade. Mas a percepção mais prazerosa fica para os cinéfilos. Aqueles que se deliciarão com cada cena recriada, com cada referência, com o que é dignificado por sua maestria e pelo absoluto domínio que tem da arte de fazer cinema.
Tarantino dá o status que um velho filme de kung fu não possui.
Ou nos faz ouvir uma música que não ouviríamos em outra circunstância.
No final, a forma se sobrepõe ao fundo.
O que Quentin Tarantino faz são filmes sobre cinema.
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