SILVIO OSIAS
Garotos e garotas suportariam ver o documentário Woodstock?
Publicado em 09/08/2019 às 9:00 | Atualizado em 30/08/2021 às 20:40
Agora em agosto de 2019, faz 50 anos que ocorreu o festival de Woodstock, marco da geração hippie e da contracultura da segunda metade do século XX.
Lançado em 1970, o filme Woodstock conta a história do festival, sua gente, suas motivações, sua música.
Gostaria muito de reunir garotos e garotas para uma sessão do documentário.
Com uma única exigência: que desligássemos os aparelhos celulares.
Será que os jovens de hoje suportariam essa experiência?
Seguem algumas observações minhas sobre o filme:
Woodstock é cinema documental de excelente qualidade.
O diretor, Michael Wadleigh, não entrou para a história por construir uma filmografia exemplar, como tantos. Isto, todos sabemos que ele não fez. Para sermos rigorosos, é homem de um filme só. Mas este filme se chama Woodstock, o longo (a montagem hoje disponível tem quatro horas, uma a mais do que a exibida nos cinemas, três a menos do que desejava o realizador) registro do festival de três dias realizado nos arredores de Nova York em agosto de 1969.
Para muitos, vê-lo pela primeira vez pode não passar de uma extensa maratona. Para nós, revê-lo, agora restaurado e no conforto dos nossos cinemas caseiros, permanece uma extraordinária experiência de imagem e som. E a confirmação da sua permanência.
Woodstock não tem narrador em off, como tantos documentários. Alterna falas, locuções de palco e números musicais. Pode parecer cronológico, mas não é. Em sua narrativa, entendemos que, da tarde de uma sexta-feira à manhã de uma segunda, o festival começa, acontece e termina. A despeito desta certeza, os fatos gerados pela multidão, pelos artistas e pela natureza (o temporal que se abateu sobre o evento) estão misturados. Tudo é fragmentado.
A montagem é uma aula permanente de cinema, mesmo que quase 50 anos (o filme é de 1970) nos separem da estreia. Marco e influência no gênero, o documentário tem no uso da tela múltipla um grande trunfo. É o que lhe dá ritmo como espetáculo fílmico. É também o que permite uma tradução mágica da música que o festival ofereceu aos seus espectadores e legou ao futuro.
No início dos anos 1970, apesar da falta de distanciamento, já se tinha a percepção de que o filme de Michael Wadleigh era um documento para a posteridade. Ele não se restringia à euforia que o festival gerou e às suas repercussões comerciais a partir do próprio êxito do filme e do conjunto de cinco discos lançados pela indústria fonográfica. Não. Estava claro que havia ali, naquelas imagens captadas em 16 e ampliadas para o esplendor dos 70 milímetros, um enfoque sociológico que deveria, sim, atravessar os anos.
Com seus defeitos e suas virtudes, a geração representada pelas 500 mil pessoas que testemunharam Woodstock (o festival) tem em Woodstock (o filme) o seu melhor e mais fiel retrato. Também o que lhe é mais justo e o que mais lhe expõe. Seja no seu sonho de transformar o mundo, seja na impossibilidade de vê-lo realizado.
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