Lilian Knapp lutou, e não foi pouco, para sobreviver ao fim da Jovem Guarda

Para uns, a Jovem Guarda era um movimento. Para outros, a Jovem Guarda era apenas um programa de televisão que a TV Record botou no ar em agosto de 1965.

Movimento ou programa de televisão, a Jovem Guarda foi um fenômeno de popularidade e um acontecimento marcante na música popular daquela época.

Os ouvintes mais exigentes e também mais politizados achavam que a Jovem Guarda era sinônimo de alienação e que produzia música de má qualidade.

O programa era comandado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. Roberto ficou até o começo de 1968, e, meses depois, a Record tirou o produto do ar.

A rigor, Roberto Carlos foi o único artista que realmente sobreviveu bem ao fim da Jovem Guarda. Se manteve no topo, e, agora com 83 anos, lá ainda permanece.

O próprio Erasmo Carlos, seu parceiro, enfrentou dificuldades para se equilibrar entre a condição de ícone do rock e ser assimilado como autor pela turma da MPB.

Wanderléa também buscou outros caminhos, tentando livrar-se da imagem da Ternurinha. Para ela, foi mais difícil do que para Erasmo, o Tremendão.

Os demais - e não foram poucos - comeram o pão que o diabo amassou depois que a Jovem Guarda acabou, lembrados, aqui, acolá, num revival dos anos 1960.

É o caso de Lilian Knapp, que morreu no sábado, 22 de fevereiro de 2025. Tinha 76 anos, e um agressivo tumor pélvico acabou com sua vida em três meses.

Havia algumas duplas no elenco da Jovem Guarda. Os Vips (A Volta), Deny e Dino (Coruja) e Leno e Lilian, que, em curta carreira, gravaram vários sucessos.

Lilian Knapp era uma garota da Zona Sul. O guitarrista Renato Barros - líder, depois, do grupo Renato e Seus Blue Caps - era um rapaz da Zona Norte.

Lilian e Renato foram namorados. Juntos, fizeram a canção Devolva-me, um sucesso da dupla Leno e Lilian que atravessou o tempo e ainda não foi esquecido.

Com O Pica Pau, outra parceria com Renato, Lilian se transformou, no Brasil, na primeira mulher a compor um rock em português. Quem gravou foi Erasmo Carlos.

Leno e Lilian se conheceram na infância. Cantaram juntos desde cedo. Como dupla, passaram a atuar profissionalmente em meados dos anos 1960.

Pobre Menina, Eu Não Sabia que Você Existia, Devolva-me, A Pobreza e Coisinha Estúpida estão entre os maiores sucessos da dupla.

Coisinha Estúpida é uma versão de Something Stupid. Lembram? No original, Frank Sinatra cantava Something Stupid para dar um força à filha Nancy.

Longe de Leno, já no final dos anos 1970, Lilian Knapp, em solo, reencontrou o seu público com uma versão: Sou Rebelde vendeu centenas de milhares de discos.

No ano 2000, Adriana Calcanhotto - voz e violão - gravou Devolva-me no álbum ao vivo Público. Entrou na trilha da novela Laços de Família e fez muito sucesso.

Um ano antes, Chico César fizera o mesmo com Sou Rebelde em Mama Mundi, seu quarto álbum. Mas não funcionou a sua releitura do hit de Lilian.

Há outra releitura de Sou Rebelde, melhor do que a de Chico César. Em 2014, Alice Caymmi botou a música no repertório de Rainha dos Raios, seu segundo álbum.

Sozinho, Leno não reencontrou o sucesso do tempo da dupla com Lilian. Ele morreu de câncer em dezembro de 2022. Estava com 73 anos e morava em Natal.

"O futuro pertence à jovem guarda". A morte de Lilian faz lembrar que o nome do programa veio dessa frase de Lenin, líder da revolução bolchevique de 1917.

Jovem Guarda. A expressão cunhada por um comunista dando nome a um fenômeno musical politicamente alienado. O Brasil é mesmo muito complexo.