SILVIO OSIAS
O jazz de Hermeto Pascoal é como o melhor jazz do mundo
O show no Festival de Montreux de 1979 está disponível no YouTube.
Publicado em 22/10/2025 às 6:08

Gilberto Gil e Miles Davis se conheceram no festival da Ilha de Wight, na Inglaterra, em 1970. Uma vez, estavam no mesmo voo e, sentados lado a lado, viajaram conversando.
No meio da conversa, Miles perguntou a Gil: "Como vai o albino?". O albino era Hermeto Pascoal. Miles e Hermeto se conheceram nos Estados Unidos no fim dos anos 1960.
Miles Davis foi um dos gênios consumados do jazz. Miles dizia que Hermeto Pascoal foi um dos músicos mais impressionantes que ele conheceu e com quem tocou.
Hermeto nasceu e cresceu literalmente no mato, no interior de Alagoas, e, quando era criança, fazia música num canudo de mamoeiro, e seus ouvintes eram os bichos.
Hermeto se profissionalizou no Recife, na Rádio Jornal do Commercio, passou um tempo tocando na Rádio Tabajara, em João Pessoa, e depois se mandou para o Sudeste.
Foi fundador e integrante do incrível Quarteto Novo e, por um tempo, trocou o Brasil pelos Estados Unidos. Quando conheceu Miles Davis, este estava inventando a fusion.
Hermeto Pascoal, que nunca deixou de ser brasileiríssimo, era um músico de jazz. Fazia um jazz nordestino, lá das Alagoas, e tinha um extraordinário senso de improvisação.
Em 1979, Hermeto fez sua estreia no Festival de Jazz de Montreux, no mesmo dia em que Elis Regina cantou no festival de Claude Nobs. Está tudo registrado em discos ao vivo.

O disco duplo de Hermeto Pascoal em Montreux é um dos meus álbuns favoritos. Ouvi tanto, nesses mais de 40 anos, que conheço cada som e cada ruído ali registrados.
Essa conversa toda sobre Hermeto e, agora, sobre seu show em Montreux, tem um motivo: é que há uma versão integral da performance em vídeo, disponível no YouTube.
Se o disco já era impactante, nem sei o que dizer do vídeo. Num show de duas horas, Hermeto e sua banda "quebraram tudo" e deixaram a plateia do festival estarrecida.
O baixista Itiberê Zwarg, o saxofonista Nivaldo Ornelas, a percussionista Rosemarie Pitdner e o baterista Nenê estão entre os músicos que dividem o palco com Hermeto.
À frente da banda, Hermeto Pascoal exibe impressionante virtuosismo tocando teclados, clavieta, sax e flauta em números que fundem os ritmos do Nordeste com o jazz.
Fátima, um samba-choro de bela melodia, traz um verdadeiro monstro da improvisação jazzística. Já Montreux, Hermeto compôs no hotel e executa lindamente à flauta.
Jazz é bom mesmo ao vivo. Tenho muitos discos de jazz gravados ao vivo com grandes músicos americanos. Inclusive daquele que identificava Hermeto como "o albino".
O álbum de Hermeto Pascoal em Montreux pode figurar em qualquer lista de grandes discos de jazz ao vivo. Não deixa absolutamente nada a dever a nenhum deles.
Hermeto não gostava do rótulo de jazzista. Mas ele era jazzista, sim. E era muitas outras coisas, para além do jazz, fazendo o que Caetano chamou de "Hermetismos Pascoais".
Visto nesse vídeo que está disponível no YouTube, o show de Hermeto Pascoal no Festival de Montreux de 1979 é como o melhor jazz do mundo. Miles Davis sabia disso.
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