SILVIO OSIAS
O que é preciso ver para entender que ditadura militar não presta
Colunista indica filmes realizados a partir do início da década de 1980.
Publicado em 21/11/2024 às 6:43 | Atualizado em 21/11/2024 às 9:08
A foto que ilustra a coluna não é dos filmes citados nesse post. Usei porque é emblemática como evocação da violência da ditadura militar. Foi feita no Rio em 1968 por Evandro Teixeira, mestre do fotojornalismo brasileiro que morreu há pouco.
Fiz esse post motivado pelo sucesso do filme Ainda Estou Aqui, de Walter Salles. Também porque tem muita gente que não sabe nada ou sabe muito pouco sobre a ditadura militar e se surpreende quando assiste ao filme.
Um outro motivo é que há um número expressivo de jovens que defendem a volta da ditadura militar e não fazem ideia de que ditadura é um negócio que não presta.
Em 1984, ano da campanha das Diretas-Já, a ditadura militar completava duas décadas e vivia seus estertores quando dois documentários foram lançados: Jango, de Sílvio Tendler, e Cabra Marcado Para Morrer, de Eduardo Coutinho.
Jango conta a história do presidente João Goulart e sua deposição sob a perspectiva da elite política. Cabra Marcado Para Morrer se debruça sobre a tragédia da família do líder camponês João Pedro Teixeira sob a perspectiva do povo.
Também é de 1984 o documentário O Evangelho Segundo Teotônio, do cineasta paraibano Vladimir Carvalho. É um retrato de Teotônio Vilela, senador alagoano que se fez peça fundamental nas lutas pela redemocratização.
O drama Nunca Fomos Tão Felizes, de Murilo Salles, é outro filme de 1984. Num apartamento no Rio, um jovem sem mãe pouco sabe do seu pai, com quem passa a viver. O pai é um militante político perseguido pelo regime militar.
Roberto Farias, veterano do cinema brasileiro, realizou Pra Frente Brasil em 1982 durante o governo de João Figueiredo, o último do ciclo militar. O filme, que sofreu ação da censura, denuncia a tortura, mas livra um pouco a cara dos militares.
Dirigido por Sérgio Rezende, Lamarca, de 1994, é sobre Carlos Lamarca, que trocou a vida na caserna pela luta armada. Muitos anos depois, em 2019, Wagner Moura contou, em Marighella, a história do líder guerrilheiro Carlos Marighella.
Paulo Betti fez Carlos Lamarca, executado na Bahia em 1971. Seu Jorge fez Carlos Marighella, executado em São Paulo em 1969. Como Lamarca, Marighella também foi um militar que trocou o Exército pela luta armada contra a ditadura.
Dirigido por Bruno Barreto, O Que é Isso, Companheiro? (1997) é baseado no livro homônimo de Fernando Gabeira, que narra a história do sequestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick. Gabeira foi um dos sequestradores.
Lamarca não é o único filme de Sérgio Rezende sobre a ditadura militar. Em 2006, ele realizou Zuzu Angel. Stuart Angel, filho da estilista Zuzu, foi morto pela ditadura. Na luta para localizar o filho, a própria Zuzu também foi morta pelo regime militar.
Além de Zuzu Angel, há pelo menos mais três filmes sobre a ditadura realizados em 2006: Batismo de Sangue, de Helvécio Ratton, O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, de Caos Hamburger, e Sonhos e Desejos, de Marcelo Santiago.
O mais interessante deles, Batismo de Sangue, baseado no livro de Frei Betto, é sobre o frade dominicano brasileiro Tito Alencar. Frei Tito se envolveu com o grupo de Carlos Marighella, foi preso e, mais tarde, se matou quando estava exilado na França.
Realizado em 2005 por Toni Ventura, Cabra Cega tem a ação concentrada num "aparelho" onde está escondido um militante da luta armada. Num clima claustrofóbico, é cheio de referências musicais que remetem ao início da década de 1970.
Chegando, por fim, a 2024, temos Ainda Estou Aqui levando multidões aos cinemas. Em 11 dias, o filme de Walter Salles foi visto por mais de um milhão de espectadores. É uma vitória do cinema brasileiro em um admirável libelo contra a ditadura militar
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