SILVIO OSIAS
Pasolini era homossexual e comunista, mas o Vaticano aplaudiu o seu Evangelho Segundo São Mateus
Publicado em 04/03/2022 às 8:40
Neste sábado (05), 100 anos do nascimento de Pier Paolo Pasolini, é dia de reverenciar a memória e celebrar a obra desse grande cineasta italiano. Pasolini era um poeta fazendo cinema. Pasolini vive através dos filmes que realizou. Fui rever as imagens de O Evangelho Segundo São Mateus. Como impressionam!
Num quarto de hotel, na mesinha de cabeceira, Pasolini encontrou um volume do Novo Testamento. Resolveu ler e ficou encantado com o evangelista Mateus. Decidiu filmá-lo com absoluta fidelidade ao texto original.
O Evangelho Segundo São Mateus, de 1964, parece um filme neorrealista. Tem o despojamento de um filme neorrealista. Foi realizado em cenários naturais do Sul da Itália com um elenco composto por amadores. Quem faz Maria, na fase em que Jesus já é adulto, é a mãe do cineasta. Se me permitem o delírio, tem algo de uma Paixão de Cristo filmada por Glauber Rocha.
O filme de Pasolini é belo, mas é tosco. Não tem nada da grandiosidade que a gente costuma ver nos filmes sobre a vida de Jesus, como, por exemplo, O Rei dos Reis e A Maior História de Todos os Tempos, um realizado um pouco antes, o outro, um pouco depois do de Pasolini.
O Evangelho Segundo São Mateus é um filme político. O Sermão da Montanha aparece como um discurso político. Ali, tem o que vimos na Teologia da Libertação ou no clero progressista ou na igreja que fez opção pelos pobres. Em resumo, tem a igreja do papa João XXIII, a cuja memória o filme é dedicado.
A música completa o que há de lindo e poético nesse evangelho pasoliniano. Da Paixão Segundo Mateus de Bach ao Gloria de uma missa do Congo (MissaLuba), passando pelo spiritual dos pretos americanos Sometimes I Feel Like a Motherless Child.
Diante de O Evangelho Segundo São Mateus, a homossexualidade assumida e o marxismo de Pasolini não incomodaram a Igreja Católica. Sua visão da vida de Jesus foi aplaudida pelo Vaticano.
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