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SILVIO OSIAS

Preta, Preta, Pretinha

A cantora de 50 anos morreu neste domingo em Nova York.

Publicado em 21/07/2025 às 7:49


				
					Preta, Preta, Pretinha
Foto/Reprodução.

Reflita todos os dias sobre a inevitabilidade da morte. Gilberto Gil ouviu de Walter Smetak, músico e professor suíço que viveu na Bahia. E eu ouvi várias vezes de Gil. A primeira, numa conversa sobre um amigo querido que perdêramos.

Os pais não foram feitos para enterrar os filhos. Também aprendi com Gilberto Gil. Em 1990, quando ele perdeu Pedro, o primeiro filho do casamento com Sandra Gadelha. Pedro tinha 19 anos e morreu em consequência de um acidente de carro.

A morte faz parte da vida. Está na letra de um samba pouco lembrado que Gilberto Gil compôs na década de 1970 e foi gravado por Simone no álbum Cigarra.

Não tenho medo da morte, mas de morrer, sim. Diz a letra dessa canção dolorosamente verdadeira que Gil canta com a voz grave, acompanhado por uma batida no violão.

Lembrei dessas coisas quando soube da morte de Preta Gil, nesse domingo, 20 de julho de 2025, em Nova York. A morte - sem obsessões, penso nela todos os dias, como aprendi com Gil. A morte - o fato é que a gente nunca está preparado para ela.

Sou o único sobrevivente do meu núcleo de origem. Perdi minha mãe, meu único irmão e, por último, meu pai. Meu pai nunca se recuperou da perda do filho.

Perdi avôs e avós, tios, primos, amigos e amigas. A experiência mais dolorosa que tive com a morte foi com uma amiga que acompanhei de perto na luta pela vida, com um câncer de pulmão. Tão de perto que vi o instante da morte, no leito de um hospital.

A primeira lembrança que tenho de Preta é de uma pequena foto que está na capa do álbum Refazenda, que Gilberto Gil lançou em 1975. Ela, pequenina, nos braços do pai. Ao lado, está seu irmão Pedro, que nasceu quando Gil estava exilado em Londres.

Pedro é o garotinho da capa do álbum Expresso 2222, que Gilberto Gil lançou em 1972, assim que voltou a morar no Brasil, terminado o exílio londrino. Não teve tempo de se despedir. Após o acidente, ficou em estado grave e morreu poucos dias depois.

Preta foi diagnosticada com o câncer colerretal no início de 2023. Lutou por dois anos e meio contra a doença. Ou melhor: lutou pela vida.

Desde que se projetou como figura pública, Preta Gil pôde ser identificada por sua alegria, sua liberdade e as necessárias transgressões que cometia nesse mundo mau e careta.

Preta era filha do tropicalismo. Ao seu modo, e no seu tempo, Preta, como na canção do seu tio Caetano, também organizou o movimento, também orientou o carnaval.

Nascida Preta Maria Gadelha Gil Moreira em oito de agosto de 1974. Mulher preta, 50 anos, mãe de Francisco, avó de Sol de Maria. Com admirável coragem, sem abrir mão da alegria, enfrentou a gordofobia, o racismo, a misoginia.

No fim, enfrentou a doença. Foi admiravelmente transparente, não escondeu nada de ninguém. Nem da família nem dos amigos nem dos fãs.

Testemunhamos todos o seu enfrentamento corajoso dessa doença impiedosa e o seu desejo de alcançar a cura, de viver. De lutar até onde pôde.

A luta de Preta pela vida comoveu milhões de brasileiros. Tocou o coração de homens e mulheres do bem. E deixou uma lição para ser guardada em nossas memórias.

Como figura pública que era, Preta Gil, com sua voz e sua imagem, expôs bravamente o sofrimento que milhares de pessoas enfrentam todos os dias no anonimato.

Preta agora descansou e fica entre nós como uma luz. Penso nas muitas e intensas amizades que fez, penso nos irmãos e irmãs, no filho, na neta, em Sandra, em Flora.

Penso em Gilberto Gil, que, aos 83 anos, e pela segunda vez, sente a dor de enterrar um filho. Gil, esse homem sábio e sereno, esse belo e imenso brasileiro.

"Drão, os meninos são todos sãos/Os pecados são todos meus/Deus sabe a minha confissão". Há pouco mais de dois meses, o pai e a filha cantaram juntos no Allianz Parque, em São Paulo, num dos shows da turnê Tempo Rei.

A imagem fica como despedida de Preta. As lágrimas de Gil cantando uma das canções mais bonitas entre tantas que compôs. A filha ao seu lado. Sandra, a mãe, na plateia. Vendo hoje, choramos com Gil. E por Preta, Preta, Pretinha.

Foto/Reprodução

Silvio Osias

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