SILVIO OSIAS
Rock de vanguarda, rock'n' roll ou pop ultracomercial. Qual a melhor Rita Lee?
Publicado em 10/05/2023 às 9:00 | Atualizado em 10/05/2023 às 9:33
O corpo de Rita Lee, que morreu na noite de segunda-feira (08) em consequência de um câncer de pulmão, será velado em São Paulo nesta quarta-feira (10). O velório, no planetário da cidade, será aberto ao público, mas só a família e os amigos terão acesso à cerimônia de cremação, no final da tarde. No último dia de 2022, quando ela completou 75 anos, escrevi um texto que reposto em seguida, sem qualquer alteração da postagem original. Republico porque, lendo agora, vejo que acrescenta alguma coisa ao texto que publiquei ontem.
Rita Lee (Foto/Instagram) nasceu em São Paulo no último dia de 1947. Neste sábado, 31 de dezembro de 2022, ela faz 75 anos. Em maio de 2021, descobriu que tinha câncer no pulmão. Fez o tratamento e, agora, segundo sua família, está curada. Maior nome feminino do rock brasileiro, ela não abandonou a música, mas já estava afastada dos palcos quando descobriu a doença. Vive recolhida - ela, o marido, Roberto de Carvalho, e seus animais de estimação, escrevendo livros e longe da vida que levava quando era uma estrela da nossa música popular.
Rita Lee ainda não tinha completado 20 anos quando se projetou nacionalmente. Integrava um trio de rock ao lado dos irmãos Arnaldo Baptista e Sérgio Dias. Os Mutantes acompanharam Gilberto Gil quando este, no festival de MPB de 1967, ficou em segundo lugar com Domingo no Parque. Caetano Veloso ficou em quarto com Alegria,Alegria. Os dois lançavam, ali, as bases do Tropicalismo, movimento que propunha a retomada da linha evolutiva da música popular brasileira. Os Mutantes estavam no meio do terremoto tropicalista.
Os Mutantes faziam rock de vanguarda. Eram tão criativos quanto muitos grupos de rock em atividade nos Estados Unidos e na Inglaterra, mas eram praticamente desconhecidos fora do Brasil, a despeito de que tenham tentado uma carreira internacional. Nos três primeiros discos, contaram com a importante colaboração de Rogério Duprat, o maestro do Tropicalismo. Nos dois últimos, transformados num quinteto, Os Mutantes já não eram mais os mesmos. Flertavam com o rock progressivo, e Rita Lee, considerada uma instrumentista limitada, foi rifada da banda.
Sozinha, Rita Lee trocou o rock de vanguarda pelo rock'n' roll básico dos discos que dividiu com o grupo Tutti Frutti. Fruto Proibido é um dos grandes discos do rock brasileiro. Ovelha Negra, uma das faixas do álbum, logo se transformou num formidável hit. Em mais dois LPs, Entradas e Bandeiras e Babilônia, Rita Lee manteve a pegada rock'n' roll de Fruto Proibido, mas logo daria início a uma nova fase da carreira, iniciada com a chegada de Roberto de Carvalho à sua banda. Roberto, que seria seu marido e parceiro musical.
Roberto de Carvalho puxou Rita Lee pela mão e levou a roqueira para um pop ultracomercial. Foi o que se viu nos álbuns que ela lançou na virada da década de 1970 para a de 1980. Um hit atrás do outro, shows vistos por grandes plateias - Rita Lee vivia o momento de maior êxito comercial da sua trajetória. Pertencia ao cast da Som Livre, a gravadora da Globo, e isso facilitava a divulgação do seu trabalho em programas de televisão e novelas. Não havia dúvidas de que, juntos, Rita e Roberto eram talentosíssimos hitmakers.
É claro que o sucesso não durou para sempre, e Rita Lee enfrentou tempos de vacas magras e de crises com Roberto de Carvalho. Passou a fazer a manutenção da carreira, como acontece com quase todo mundo no universo da música popular. Quando Os Mutantes, tardiamente, obtiveram reconhecimento internacional, Rita não quis mais saber deles, sobretudo por causa da relação tumultuada que tivera com Arnaldo Baptista, seu primeiro marido. Escreveu livros de sucesso no tempo em que a música parecia não ser mais uma prioridade em sua vida.
Aos 75 anos, permanece amada por uma expressiva legião de admiradores. Seja pelo rock de vanguarda que fez com Os Mutantes, seja pelo rock'n' roll básico do Tutti Frutti ou pela coleção de canções ultracomerciais assinadas junto com Roberto de Carvalho. Na soma de tudo isso, o que prevalece mesmo é a imagem de maior nome feminino do rock brasileiro. E, só para enriquecer o retrato da artista, acrescento: no fundo, Rita Lee é uma cantora de rock que nunca escondeu a contenção vocal que vem da lição bossanovista de João Gilberto.
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