CULTURA
Um disco de dois Moraes: parceria que vem de berço
Moraes Moreira e Davi Moraes falam ao Jornal da Paraíba sobre 'Nossa Parceria', primeiro álbum com a assinatura de pai e filho
Publicado em 01/05/2015 às 8:00 | Atualizado em 14/02/2024 às 12:23
A parceria, literalmente, vem de berço. Segundo dos três filhos do cantor Moraes Moreira, Davi nasceu no sítio mais musical do Rio de Janeiro, o ‘Cantinho do Vovô’, onde moravam os Novos Baianos. “Ele gostava de ficar ouvindo os ensaios (d’Os Novos Baianos) quando era bebê”, conta o pai, em entrevista por telefone. Quarenta anos depois - idade que Davi tem hoje - a parceria é selada com um belo CD, Nossa Parceria (Deck Disc, R$ 24,90, também disponível em streaming).
"Foi muito bom chegar, neste momento, para registrar uma parceria que a gente tem de estrada desde sempre", comenta Davi Moraes, também por telefone. "Meu pai sempre me deu oportunidade e sempre me preparou. Aos 17 anos, entrei para banda dele como músico profissional”.
De lá para cá, Davi desenvolveu uma carreira própria, acompanhando bambas como Caetano Veloso, Ivete Sangalo e Maria Rita, sua atual esposa (e com quem passou por João Pessoa em janeiro, no ‘Extremo Cultural). Solo, ele gravou dois discos antes deste, mas nunca esteve longe do pai, fosse em música, palco ou estúdio.
Alguns anos atrás, os dois se sentaram para compor juntos um punhado de canções. Os frutos dessa safra ficaram guardados até que o jovem Moraes foi selecionado em um edital para patrocinar seu novo CD. Davi não pensou duas vezes: tirou as composições da gaveta e convocou o pai para dividir com ele os créditos de uma parceria até então inédita.
Nossa Parceria, que traz pai e filho acompanhados por uma banda afiada, é coroada por um repertório de dez faixas, entre composições de Moraes, de Davi, dos dois juntos e ainda do “Cartola baiano” Batatinha (1924-1997) e de um clássico do repertório do grupo Anjos do Inferno - que tinha Lúcio Alves no vocal -, ‘Bahia, oi Bahia’ (Vicente Paiva/Augusto Mesquita).
Daquelas sessões pai e filho, o repertório abarcou três músicas: os choros ‘Seu Chico’ (Davi Moraes/Chico Barbosa) e ‘Chorinho pra Noé’ (Moraes/Davi), dois grandes encontros entre o violão do pai e o bandolim do filho, e o frevo “baiano” ‘Quando acaba o carnaval’ (Moraes/Davi).
Moraes conviveu com Batatinha e um belo dia, presenteou o filho com um DVD do sambista baiano. Quando rascunhava o repertório, Davi, fã de músicas antigas, lembrou de ‘Bossa e capoeira’, que faz jus ao título em letra e harmonia e, nesta regravação, ganhou uma declamação especial do velho amigo.
“A gente se identificou na hora com essa música, que traduz o espírito do projeto”, comenta Davi. “A gente até cogitou botar o nome do disco de ‘Bossa e capoeira’, mas achou ‘Nossa Parceria’ mais forte”.
A história de João Gilberto e os Novos Baianos é clássica. Por muitos anos, Moraes manteve longas conversas com João ao telefone. Foi numa dessas ligações, em alguma noite nos anos 90, que o pai da bossa nova lhe ensinou a cantar ‘Bahia oi Bahia’, uma música que Moraes Moreira tinha vontade de gravar desde então.
“Eu pedi para ele me ensinar uma música que falasse da Bahia”, lembra Moraes. “Aí ele cantou duas vezes e disse: -Agora canta aí pra vê se você já sabe. Cantei um pedaço, errei outro e disse: -João, você tem que cantar mais uma vez, para eu pegar a segunda parte”.
DUAS GERAÇÕES
Davi Moraes incluiu no CD duas regravações: ‘Centro da saudade’, parceria dele com Pedro Baby e Carlinhos Brown, lançada por este no disco Diminuto (2010), e ‘Coração a batucar’ (Davi/Alvinho Lancelot), feita sob encomenda para Maria Rita gravar em seu disco Elo (2011) e de título tão marcante que acabou por batizar o disco seguinte, de 2014.
Ao contrário da gravação de Brown, mais “sambão”, Davi (que participou dela, assim como Pedro) revisitou a parceria com arranjo menos acústico, mais elétrico e levemente mais acelerado, sem perder de vista a levada “Marcos Vale”, com o mesmo Pedro Baby nos violões.
Moraes, por sua vez, forneceu ‘Só quem ama leva o tombo’ e ‘Frevo capoeira’, canções inéditas e de safra recente. “Eu componho todo dia”, revela. “Eu devo ter aqui uns oito discos de músicas inéditas".
A primeira traz versos dignos do panteão do cancioneiro do ex-Novos Baianos (“Só quem ama leva tombo/Quando quiser ombro, diga”). “Eu gostei de (ter gravado) ‘Frevo capoeira’ porque ela fala do DNA do frevo, que é a capoeira, o dobrado e o maxixe”, ensina.
O disco termina com a faixa que dá nome ao álbum, um funk com sotaque de repente feito, segundo pai e filho, no improviso e gravado no primeiro take. “Eu fiz o texto de noite, em casa, e no outro dia levei para o estúdio. Pedi para o Davi fazer um riff na guitarra e os meninos da bateria, uma levada e mandei o texto. E assim ficou! Tanto que eu não sei cantar essa música. Tenho que aprendê-la”, revela Moraes.
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