CULTURA
Um disco para os tempos de hoje
Em entrevista ao Jornal da Paraíba, cantora Vanessa da Mata fala sobre o seu novo trabalho 'Segue o Som'.
Publicado em 05/04/2014 às 6:00 | Atualizado em 16/01/2024 às 17:36
Foi um encontro de velhos parceiros: o veterano Liminha, o internacional Mário Caldato Jr. e o antenado Kassin, três tarimbados produtores com quem Vanessa da Mata trabalhou ao longo da carreira estão juntos conduzindo o novo disco da cantora, Segue o Som (Sony Music, R$ 25,00). Liminha e Kassin assinam a produção, juntos, e Caldato fez a mixagem.
Vanessa começou a trabalhar o disco em 2012. Mostrou uns rascunhos para Liminha e Kassin, sem achar que tivesse feito grande coisa. A dupla a convenceu do contrário e deu sinal verde para fechar um disco com as canções. Assim, naquele mesmo ano, ela entrou em estúdio, registrando algumas faixas.
Mas aí veio Vanessa da Mata Canta Tom Jobim (2013) e os shows da respectiva turnê e o projeto foi para geladeira.
Quando o retomou, no final do ano passado, Vanessa mexeu em muita coisa: mudou letra, rearranjou algumas músicas e voltou ao estúdio para refazer praticamente tudo. “Todas as pessoas que começam a fazer um disco e não o lançam logo, ele praticamente é refeito. Conheço gente que passou mais de um ano refazendo o disco. Com o tempo, você passa a não gostar de tal música, aquele arranjo ficou um pouco datado, e tem uma música nova que você quer colocar. Acho que acontece assim”, justifica Vanessa, em entrevista por telefone.
O que se ouve no disco, então, foi gravado em janeiro deste ano, depois de Vanessa da Mata reunir um time formado por ex-parceiros de palco, como o guitarrista Catatau e o tecladista Marcelo Jeneci, e ainda, visitas como a do lendário Lincoln Olivetti, conhecido nos anos 70/80 por arranjar músicas para Gal, Caetano, Tim Maia, Jorge Ben Jor e tantos outros, mas que caiu no ostracismo depois de ter sido acusado de “pasteurizar” a MPB. De uns tempos para cá, vem sendo redescoberto por novos talentos, como Kassin, que o escalou para tocar os pianos Rhodes do disco.
Com tanta gente assim, Vanessa da Mata passeia ainda mais longe na sonoridade de sua música. Vai do reggae ('Toda humanidade nasceu de uma mulher', 'Homem invisível no mundo invisível') ao rock (‘Não sei dizer adeus’), passando por samba-jazz (a irresistível ‘Rebola nêga’), baladas (‘Ninguém é igual a ninguém (desilusão)’, electro-pop (‘Um sorriso entre nós dois’) e Coldplay (‘Por onde ando tenho você’), tudo arranjado com uma sonoridade retrô-moderna, repleta de efeitos, para adornar letras que refletem os tempos de hoje.
“A letra (de ‘Toda humanidade...’) fala basicamente do nosso tempo, do medo e timidez masculina em uma época onde a masculinidade é companheirismo e não dependência e onde a virilidade precisa achar outros caminhos, onde a mulher tem a atitude”, explicou Vanessa no material de divulgação do disco.
Com introdução que lembra tanto Gorillaz quanto as produções da lendária Stax, e até as coisas do Mr. Bungle, ‘O homem invisível no mundo invisível’ é crítica ao consumismo desenfreado, entoado em meio a um reggae de raiz “gordo”, pesado e grudento. Mas, como um todo, o repertório tem astral ensolarado. “O disco é bem positivo, por mais que tenha ‘Homem invisível’, que tem uma tensão, mas é fluida e dá vontade de dançar. Ao final, ela deixa uma questão para você pensar, mas ela também faz você se movimentar, ela é solar”, justifica para o Jornal da Paraíba.
Por telefone, ela também comenta sobre seu método de composição e fala da importância da base para o arranjo. “Eu gosto da sedução que o baixo tem na cozinha. Eu não dispenso uma cozinha orgânica. Geralmente é isso que eu tenho para começar uma música. A cozinha orgânica traz, pra mim, uma referencia estética que vai determinar o restante do arranjo”, explica, referindo-se ao jargão que os músicos utilizam para denominar a combinação entre baixo, bateria e percussão.
O repertório de 13 faixas (mais um remix de ‘Segue o som’, o primeiro single do disco) ainda acomoda duas faixas em inglês: ‘My grandmother told me (Tchu bee doo bee doo’) e ‘Sunshine on my shoulders’. A primeira é uma canção autoral vintage que poderia estar no CD das Puppini Sisters; a segunda, uma versão electro-pop moderna do hit de John Denver lançado em 1973.
“Essa música (‘My grandmother...’), eu achei que tava bem dentro desse disco, que já tinha John Denver na minha cabeça”, conta. “A ideia dela era complementar as outras canções. Ela tinha um diálogo parecido, ela tinha uma referência com o que eu tava falando da minha geração, dessa coisa entre ter uma relação profunda e uma relação mais superficial com as coisas, com a internet, com as amizades, essa coisa de pouco contato e mais fotografia, mais e-mail e menos telefone...”
A turnê começa em breve, e ela promete passar por João Pessoa. “Desde o primeiro disco eu vou a João Pessoa. João Pessoa não pode faltar”, promete a cantora, que falou do “poder” anti-gripal que o público pessoense tem sobre ela quando veio se apresentar no projeto Extremo Cultural, em janeiro deste ano.
“Aquele show foi impactante, tinha muita gente dançando! Foi um show super feliz pra mim”, admite Vanessa, que subiu ao palco com uma otite (inflamação no ouvido) e desceu curada. “Eu também tinha uma gripe horrível desde dezembro que eu não conseguia curar, mas voltei para casa bem melhor”.
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