Walter Carvalho fala de filme sobre Raul Seixas

Tudo começa na Paraíba. O envolvimento de Walter Carvalho com Raul Seixas (1945-1989) foi durante a adolescência do diretor em uma sala de cinema do finado Santo Antônio, em Jaguaribe. Na telona, ao invés do "maluco beleza", Elvis Aaron Presley (1935-1977) cantava em uma casa noturna para um gângster em A Balada Sangrenta (EUA, 1958). “Meu primeiro contato com Raul, não sabia que estava tendo”, puxa Walter pelas reminiscências púberes.

A conexão que usa o filme do "Rei do Rock" como rebite foi descoberto depois: “No mesmo momento, Raul estava vendo o filme na Bahia”, garante. “Ele viu A Balada Sangrenta mais de 20 vezes!”
Elvis era um fator comum no Nordeste naquela época, resultante em vários conjuntos imitando o cantor estadunidense. O próprio Walter Carvalho imitava os requebrados do 'Rei' em concursos de rádios, enquanto o jovem Raulzito fundava o Elvis Rock Club com o amigo Waldir Serrão.

“Em 2009 me veio toda essa engrenagem do passado na minha cabeça”, analisa o diretor quando partiu um convite diretamente do vice-presidente sênior de distribuição para América Latina da Paramount, o também paraibano Jorge Peregrino, para fazer um longa. “Interessante que a base do filme passa pela Paraíba.”

No final do mesmo ano, Walter foi homenageado pelo conjunto de sua obra como realizador e diretor de fotografia durante a 5ª edição do Fest Aruanda, em João Pessoa. Na ocasião, antes de exibição de seu trabalho mais recente, Budapeste, ele presenteou o público com uma amostra exclusiva de várias cenas do documentário Raul Seixas - O Início, o Fim e o Meio, que ainda se encontrava em pós-produção.

Finalmente o filme sobre o cofundador da Sociedade Alternativa será exibido gratuitamente nesta quarta-feira, encerrando o Fest Aruanda, no Tropical Hotel Tambaú, às 20h. O ensejo é tão especial quanto as primeiras imagens mostradas há dois anos: o documentário foi mostrado apenas no Festival do Rio e no Festival Internacional de Cinema de São Paulo, ambos em outubro. Segundo o realizador, o festival paraibano será o último a passar a produção antes de sua estreia no circuito comercial, que acontece no dia 27 de janeiro.

HISTÓRIA SEM FIM
Nas entrevistas da vida, Walter Carvalho certa vez definiu que Raul “não se explica”. Mesmo assim, para dar ordem ao caos dos cortes da pós-produção, o realizador tinha mais de 400 horas de material, entre entrevistas e arquivos do 'baú'.

Walter explica que criou uma 'genealogia da trajetória', que consiste em um quadro onde o centro é a infância, a família e a morte do ícone do rock nacional. Com isso, ele tracejava conexões que perambulavam de um lado para o outro, convergendo em dois planos: a vida privada, que é narrada de forma cronológica, e a vida pública, fragmentada e fora de ordem. Para a coerência narrativa da metamorfose ambulante da montagem, Walter “se distanciava daquilo, ficando dois ou três dias sem pensar em Raul”.

Sobre o batismo da produção, Walter se apropriou da própria canção do personagem, 'Gita', lançada em 1974. “A ideia de ter o subtítulo é que a história não terminou ainda”, comenta. “Raul é um personagem que não terminou ainda!”
Em duas horas de filme, as diversas facetas do roqueiro são esmiuçadas, como a parceria com o mago Paulo Coelho, seus casamentos e a comunicação que suas músicas estabelecem com uma legião de fãs que continua mobilizando até os dias de hoje, quase 20 anos depois de sua morte. "Minha vontade de entender o mito coube em duas horas".

O fenômeno do culto ao cantor é um encontro que os 'devotos' e covers de Raul fazem naturalmente desde quando ele se foi, no final dos anos 1980, em São Paulo. Segundo Walter, mais de 4,5 mil pessoas se reunem na Praça da Sé para virar a madrugada cantando as músicas que eternizam o ícone. “Entre os milhares de covers, elegi o mais antigo, Pena Seixas, para representá-los no filme”.